Somos todos envolvidos.

Vamos refletir sobre uma questão fundamental em qualquer sociedade: a nossa participação, o que significa dizer também nossa liberdade de ser. Nossa chamada Sociedade Democrática levantou uma série de princípios, onde a máxima está no direito à deliberação coletiva exercido através do voto e expresso nas pessoas de seus representantes que, de fato, têm estado ao largo do que se denomina uma sociedade de direitos, e direitos igualitários.

O que assistimos em nosso dia-a-dia é o descaso com as regras de um convívio onde a palavra não esteja tão dissociada das ações. Sabemos sim que vivemos num gigantesco abismo entre palavra-ação , de tal forma que a ironia, o deboche, o sorriso indefinido de Gioconda , dominam esse cenário tão propício a toda e qualquer perversão. E nesse amplo contexto, a produção de atos legislativos abundam, o que nos faz lembrar a máxima de Tácito: “corruptissima respublica, plurimae leges” ( quanto mais leis, mais corrupta a república ).

Durante tempos correu a idéia de que a Psicanálise e, por sua vez, os psicanalistas, viviam num estado tal de distanciamento do social que em seus consultórios pairava um mundo de interpretações e idéias que somente serviriam ao prazer daquela dupla ou, talvez mesmo, de um deles, em ter adeptos a uma prática de “nobres intelectuais”. Mas, tudo isso constitui e sempre constituiu uma visão por demais errônea e, mais ainda, uma visão cuja intenção é o ataque ao próprio conhecimento psicanalítico, um ataque dirigido à destruição de um instrumento de intervenção social, que é também a Psicanálise, dificultando, desta forma, a que parcelas da população adquiram uma condição mais participativa e reivindicadora de direitos.

Ora, lembremos da frase de Freud ao aportar nos EUA, uma sociedade conduzida pelas regras de comportamentos esperados: disse Freud , “nem imaginam que lhes trazemos a peste!” O que Freud queria dizer com isso é que a Psicanálise se fazia como um interesse de investigação psíquica onde a verdade de cada um compromete com o status social, ou seja, a Psicanálise implica numa maior interação entre as condutas pessoais e o status social.

Como não pensar que a Psicanálise sempre foi um risco para os países totalitaristas? Temos inumeráveis exemplos na história: durante a Alemanha nazista os livros de Freud foram proibidos e queimados. Freud teve de exilar-se na Inglaterra em Hampstead, norte de Londres; na Argentina totalitária houve perseguição aos psicanalistas, quando muitos vieram para o Brasil. O Brasil também teve sua história de distorção com o famoso caso Amílcar Lobo, de conivência com a tortura. As telas de cinema ilustram tais acontecimentos como o filme Farenheit 451 , de François Truffaut , o livro 1984 , de George Orwell , de onde surgiu a figura do Grande Irmão ( O Big Brother, que a todos monitoram através de telas de televisão ) e as obras de J.J. Veiga , no Brasil.


Cena do filme Farenheit 451

Assim é que totalitarismo, ditaduras, estados altamente corruptos têm na Psicanálise uma desdenhosa antagônica. A isso é que quero chamar atenção: o ataque à Psicanálise nos termos de uma suposta decadência, de uma “ineficácia”, de ser um conhecimento que compactua com o estado alienado de um povo, tudo isso, na realidade, expressa o imenso perigo quanto a sua vigorosa condição de trazer à tona o reprimido , de provocar o reconhecimento de si mesmo e, por sua vez, de ser revolucionária por efeito da maior integração na vida social.

Bem, é bem verdade que, como em todas as áreas do conhecimento, a generalidade falseia a verdade. Muitos se utilizam do termo psicanalista enquanto que de fato exercem outras práticas, algumas vezes alienantes.

Einstein introduziu, com a teoria da relatividade, um conhecimento que veio a contribuir para a melhoria da vida humana e, por outro lado, permitiu também que Hiroshima experimentasse os resultados do uso destrutivo daquele mesmo conhecimento. Assim é que entendemos que todo profissional necessita de uma visão ética que o conduza em suas práticas, pois o saber não tem qualquer implicação com o que seja bom ou o que seja mau. Isso cabe a nós, seres humanos formados em concepções morais e éticas, tendo em vista o que escolhemos como modo de vida adequado.

Desta forma, a sociedade americana tem apresentado sintomas de extrema gravidade, de ações envolvidas de muito ódio, de perseguidores e perseguidos , de cultuamento ao poder financeiro e bélico. Uma sociedade onde o poder assumiu uma profunda arrogância.

Bombas de Napalm sobre o Vietnam

Bem, não quero deixar o caso brasileiro distante destas questões. Aqui o poder se mantém dentro de um outro prisma. Uma sociedade dividida, que aprofunda o abismo entre povo e representantes do poder . Nossos executivos não respondem às necessidades da população nem do País, nossos legisladores não legislam em função das graves situações nacionais, nossos juristas olham para as leis como emanações advindas de deuses favorecedores de seus semi-deuses. Mergulhamos numa sociedade de extremos e de ações perversas . O povo vem cumprindo sua missão, a de simplesmente referendar ou legitimar o poder. E depois lhe é dito: o povo tem o governo que merece.

Isso me lembra o grande intelectual Alceu de Amoroso Lima ( que usava o cognome Tristão de Athayde ) quando escrevia no “Jornal do Brasil”, nos idos da ditadura, sobre o estado monárquico da democracia brasileira, denunciando as ações perversas do poder.

E volto a reafirmar que a Psicanálise tem um papel revelador na socidedade. Essa história de que o psicanalista está distante do social é uma balela. Afinal, ele vive numa sociedade e sua presença junto a seu analisando já constitui em si uma interferência também social ( ele se veste, se comporta de uma determinada maneira, usa certo aparato vocabular, enfim, representa, algum segmento social )

Podemos apontar o ato não jurídico, uma vez que os tribunais se referem à Lei como algo que assume valor extra-humano. Costumam dizer, que têm de corresponder à Lei, pois afinal está na Lei. Ora, pois que reformulem a Lei, que torne o conjunto das leis uma expressão verdadeira da sociedade. Entretanto, um ato fica mascarado em tais atitudes, o ato perverso, aquele que ao se utilizar do poder da lei, torna a lei um contra-ato do exercício da punidade.

Acabamos de presenciar a operação Furacão, denominada “Hurricane”. Alusão sugestiva ao termo inglês. Num primeiro ato a devassa, manchetes e matérias recheadas de fotos bastante ilustrativas de atos corruptos, atos de contravenção. Não se podia deixar de ver nas fotos a fisionomia de alguns dos presos, diga-se, de contraventores, num ar de tranqüilidade, de sorriso, com suas maletas executivas na mão, como quem se dirige a um spa, a um hotel de alta categoria.

Segundo ato – uma “canetada” judicial confere uma distinção perante o estado de dignidade de algum desses senhores. Nem todo são iguais perante a lei.

Fica a pergunta do que ocorre com uma sociedade que convive com uma legalidade tão fluida, que coloca bicheiros, contraventores ao nível de personalidades sociais, de colunáveis e, ao mesmo tempo, perverte essa ordem, tornando-os presos pela imposição da lei.

Ficou claro nesse acontecimento a condição confusa da lei. Desembargador, promotor, advogados, enfim, responsáveis pela manutenção da ordem jurídica, todos fazendo parte de um mesmo bolo juntamente com a contravenção. A Lei mostrou sua cara.

E aí se mostra a impositiva necessidade dos excessos legislativos, das construções jurídicas que vão tecendo uma rede de proteção à abertura para a claridade, através de verdades que se fazem na conveniência dos fatos.

Atos perversos que se sucedem, tornando a sociedade cada vez mais seccionada, descrente, alijada das decisões e passando a viver maniacamente nas sobras do pouco que resta. Assim é que se a sociedade não tiver a percepção do engodo, ela pode voltar-se contra si mesma e ter no seu vizinho, no companheiro, no amigo, os culpados de lutas que estão ocupando o lugar de iras que deveriam estar sendo dirigidas aos cruéis deuses impiedosos .

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