No ofício, Ophir ressalta que o Brasil aderiu voluntariamente à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, sendo que a jurisdição dessa Corte para decidir sobre violações aos direitos humanos é indiscutível e suas determinações são de cumprimento obrigatório, sem possibilidade de revalidação interna de seu valor, conforme o artigo 68 do Pacto de São José da Costa Rica.
"O eventual descumprimento de quaisquer das determinações da sentença da Corte representará um retrocesso sem precedentes na evolução dos direitos humanos no Brasil e nas Américas".
O presidente da OAB ainda ressalta no ofício que a decisão do Supremo Tribunal Federal na APDF nº 153 (de que os crimes ocorridos na ditadura não seriam de tortura e estariam, pois, prescritos) não é empecilho para o cumprimento da decisão da Corte. "Cada um desses Tribunais possui competências próprias, e suas decisões devem ser aplicadas nos respectivos limites. O respeito à jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos é uma obrigação também do Poder Judiciário brasileiro", finalizou Ophir. O ofício foi enviado pela OAB à presidente da República por recomendação do jurista Fábio Konder Comparato, medalha Rui Barbosa da OAB.
A seguir a íntegra do ofício enviado pelo presidente da OAB:
Excelentíssima Senhora
Presidenta da República Dilma Rousseff
República Federativa do Brasil
Assunto: Pelo cumprimento integral da Sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Gomes Lund.
Excelentíssima Senhora Presidenta da República.
Diante da sentença proferida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Gomes Lund, no dia 24 de novembro de 2010, na qual o Estado brasileiro foi condenado a promover medidas de promoção da verdade e da justiça em relação às graves violações aos direitos humanos cometidas por agentes públicos durante a ditadura militar no Brasil, vêm manifestar a V. Exa. que:
O País exerceu sua soberania ao aderir voluntariamente à Convenção Americana sobre Direitos Humanos e ao reconhecer como obrigatória a jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Esses atos - políticos e jurídicos - foram praticados com estrita observância da Constituição Federal e, acima de tudo, são a concretização do artigo 4º, inciso II do artigo 5º, §§ 2º e 3º, e do artigo 7º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
A jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos para decidir sobre violações aos direitos humanos ocorridas no Brasil é indiscutível. Suas determinações são de cumprimento obrigatório por todos os agentes públicos do País, sem a possibilidade de rediscussão ou revalidação interna de seu valor, conforme estabelece o artigo 68 do Pacto de São José da Costa Rica.
O Estado brasileiro tem, pois, o dever de cumprir, prontamente, todas as determinações da Corte Interamericana de Direitos Humanos. O eventual descumprimento de quaisquer das determinações da sentença da Corte representará um retrocesso sem precedentes na evolução dos direitos humanos no Brasil e nas Américas. Se o Estado brasileiro não cumprir a sentença condenatória nesse caso estará sinalizando que desrespeita a autoridade da Corte e do sistema regional e internacional de proteção aos direitos humanos.
A decisão do Supremo Tribunal Federal na APDF nº 153 não é empecilho para o cumprimento da decisão da Corte. Cada um desses Tribunais possui competências próprias, e suas decisões devem ser aplicadas nos respectivos limites. O respeito à jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos é uma obrigação também do Poder Judiciário brasileiro.
Certas do compromisso de Vossa Excelência com o estado democrático de direito, as Entidades signatárias inaugurando um estado de vigília, aguardam O INTEGRAL E IMEDIATO CUMPRIMENTO DA SENTENÇA DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, com a punição dos perpetradores de torturas, homicídios, desaparecimentos forçados e demais crimes contra a humanidade, a identificação e entrega dos restos mortais dos desaparecidos aos familiares, a instituição da Comissão Nacional da Verdade e demais medidas fixadas na decisão.
Atenciosamente,
Ophir Cavalcante Junior, Presidente
Jornal Folha de São Paulo
Publicado em: 24/02/2011