Já a saúde?
No governo de Aécio Neves o neto de Tancredo nomeou um economista secretário. Ficou lá nos dois mandatos e produziu a mais completa privatização dos setores de saúde pública, muitos dos quais com os nomes de laranjas no contrato social, tanto quanto elevou-o, ao secretário, à Câmara dos Deputados. Era estadual.
Ao certo o dinheiro da saúde foi usado à larga em duas campanhas do dito secretário. Quando virou deputado estadual e agora federal. Só havia conseguido um mandato de vereador e nada além disso. Exceto se contarmos cara de pau e oportunismo como exercício de atividade pública.
Isso é quase regra geral.
A reação aos médicos formados em Cuba decorre de vários aspectos que envolvem a saúde no Brasil, todos sintetizados numa única palavra, "negócios".
Desde o advento, digamos assim meio que pomposamente, de "soluções" como terceirização e privatização, que a saúde pública foi para o espaço. E esse espaço hoje é dos grandes grupos econômicos direta ou indiretamente envolvidos no setor.
Imagine se o kit desenvolvido pelos médicos cubanos para diagnosticar AIDS em pouco mais de vinte minutos o tivesse sido por alguma das multinacionais da área farmacêutica? Estaria a serviço e disponível a todos os povos do mundo? Ou a tal patente restringiria aos que pagassem os royalties?
Saúde pública não é um setor que possa ser operado por grupos privados. É um dever do Estado. E ser um dever do Estado não significa excluir grupos privados, mas que sejam privados. Não à custa de fartos subsídios. Do cidadão cá embaixo que leva três meses para uma consulta, seis para um ou dois exames e uma eternidade para uma cirurgia se for o caso.
Ou do médico brasileiro submetido a um regime desumano de trabalho em troca de salários a rigor miseráveis.
Por trás do veto aos médicos formados em Cuba existe, por exemplo, o temor do médico com formação voltada para a saúde pública e consciência social. Não será nunca garoto propaganda desse ou daquele laboratório.
Existe o medo dos donos de faculdades privadas (que despejam médicos sem qualquer critério de formação, que não o pagamento em dia das mensalidades) de uma evasão de seus alunos, levando em conta a competência do médico formado em Cuba e a "competência" de quem pagou a mensalidade em dia.
Quando se fala em saúde se pensa em médico. É bem mais que isso. É vontade política que implica em medicina preventiva, familiar, em pesquisas, formação, todo um processo que ultrapassa o médico, mas começa bem antes dele.
O modelo desenhado quando Waldir Pires era ministro da Previdência Social e chamamos SUS trazia consigo esse embrião.
Parou nos interesses dos grandes grupos econômicos. Criou-se uma versão neoliberal e, portanto, perversa de saúde.
A que o Estado tem que cortar custos e transferir responsabilidades. A vida passa a ser detalhe.
Mas, que transfira responsabilidades através de conselhos populares com papel de propor, deliberar e fiscalizar.
União e governos estaduais de um modo geral repassam verbas às prefeituras e essas cuidam de organizar a saúde pública. Governos estaduais costumam executar programas - no papel - de integração, de pesquisas, que terminam sendo pulo do gato das terceirizações e privatizações.
Uma forma de fazer como o governo de Minas. Uma empresa para amigos do governador transportar doentes de cidades de entorno à cidade pólo e pronto. Condução gratuita. Não importa se três ou dez vezes por semana, ou se o cidadão foi atendido ou não.
Importa que à hora combinada lá estava ele.
E a relação médico/cidadão considerada ideal se mostra perfeita na estatística, mas concentrada em meia dúzia de cidades de porte médio e grandes hospitais da rede privada, quase todos lotados e com carência de leitos, ou hospitais públicos idem ibidem, com máquinas que não funcionam.
Aí o médico formado em Cuba vira um pesadelo para os negócios.
É simples entender, não é o médico formado em Cuba, são as políticas públicas de saúde do governo cubano e esse é o temor dos homens de "negócios" que controlam o setor.
Não fosse isso, seria qualquer iniciativa de política de saúde através de participação popular efetiva.
Entre as mercadorias hoje oferecidas pelo mundo da produção está o ser humano em perfeitas condições físicas e mentais, desde que possa pagar.
É só isso, é esse o entrave que encobre a reação aos médicos formados em Cuba.
A perspectiva de formas alternativas de medicina a essa praticada entre nós. Numa ponta os barões da saúde, noutra os pacientes e no meio os médicos de fora do esquema tentando evitar o caos, os brasileiros explorados no "use colgate que resolve todos os problemas".
Essa forma capitalista de enxergar o ser humano na questão saúde, é a mesma com que cuidam dos detalhes finais da montagem de um novo modelo de automóvel. Importante é a aparência e o desempenho, qualquer coisa anunciam um recall e pronto.
Mas tem que pagar. Tem sempre uma taxa.