Como é possível e basta confrontar o governo anterior ao de Lula, o de FHC, aprovar de forma majoritária e maciça o atual presidente e manifestar naquelas pesquisas intenção de voto num candidato que é em si e por si produto de FHC?
São as mesmas pesquisas que revelam que Fernando Henrique Cardoso tem um dos mais altos índices de rejeição entre todos os políticos brasileiros e ninguém tem dúvidas hoje que seu governo foi o mais corrupto da história, conseqüência do modelo vindo de fora e imposto por ele ao Brasil.
Serra representa esse modelo. Foi rejeitado em 2002 sendo candidato o próprio Serra e em 2006, sendo candidato o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckimin.
Um dos argumentos usados para repelir a idéia do terceiro mandato para Lula é o da necessidade de alternância de poder – partidos, idéias, programas – como essência do processo democrático.
Ou seja, você começa a construir uma casa e a pintá-la de uma determinada cor, oitenta por cento aprovam a cor escolhida e à hora de renovar ou não o contrato do pintor, optam pelo que vai mudar a cor.
A questão principal não está no terceiro mandato ou não. FHC é o último a poder falar sobre esse assunto. Amoral, intrínseca e extrinsecamente, o ex-presidente defendeu a segunda reeleição de Alberto Fujimori – Peru – de olho na eventualidade dele próprio ter o seu terceiro mandato. Foi o único a fazê-lo, pois nem o governo dos EUA, aliado incondicional de Fujimori, aprovou as manobras fraudulentas – no caso de lá – para gerar o terceiro mandato (acabou logo, Fujimori foi posto para fora do País e hoje está preso cumprindo pena por corrupção, entre outras coisas).
O que leva o brasileiro a optar, nas pesquisas por enquanto, por um candidato de oposição a um governo aprovado de forma indesmentível, é a absoluta falta de formação política, de consciência política e a ausência de compromissos partidários que se transformem em realidade visível e perceptível pelo cidadão comum, pilares do caráter asséptico do modelo neoliberal, em que esse cidadão é mero objeto num processo maior, de um modelo único de globalização, uma espécie de “Show de Truman” (filme do diretor Peter Weir e que mostra em tempo integral um cidadão nascido diante de câmeras de tevê e que vive a vida transformada em programa de televisão sem ter a menor idéia disso).
O Homer Simpson do mau caráter que apresenta o JORNAL NACIONAL, William Bonner.
À época do referendo em que pudemos escolher entre república presidencialista, república parlamentarista e monarquia parlamentarista, o PT, partido de Lula, parlamentarista em seu programa, optou por apoiar o presidencialismo apostando na eleição de Lula e jogando suas fichas no seu principal líder. Foi e continua sendo um erro sem tamanho. Casuísmo puro.
A “legislação” partidária no Brasil junta sobras do período da ditadura militar e decisões do Poder Judiciário, no vácuo de um Legislativo desmoralizado e que se caracteriza por legislar em causa própria. Lula, quando líder da oposição dizia que o Congresso tinha “trezentos pilantras”. Tem mais, bem mais hoje.
A “democracia” brasileira nasceu do chamado processo de “distensão lenta e gradual” promovido a partir do governo do general Ernesto Geisel – ditadura militar – e se caracteriza por limites consentidos pelos militares e que se mantêm até hoje. Caso dos baús da ditadura militar, encharcados do sangue das torturas, dos assassinatos de presos políticos e da própria corrupção do modelo de absoluta fidelidade aos EUA. Foi no primeiro governo militar, o do general Castello Branco, que um dos seus ministros, outro general, Juraci Magalhães, afirmou taxativamente que “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”. Espécie de ordem do dia para os governos seguintes com uma ou outra exceção no governo Geisel. Uma ou outra no máximo, o ministro da Fazenda foi Mário Henrique Simonsen, banqueiro e como tal da absoluta confiança de Wall Street.
Não tivemos uma Assembléia Nacional Constituinte, mas um Congresso Nacional Constituinte, atropelado por um governo corrupto e venal, o de José Sarney, que já nasceu errado, pois Sarney era o vazio escolhido para ser o vice de Tancredo Neves, facilitando alianças. Por ser amorfo, desprovido de cérebro e disposto a engolir todos os sapos, rãs e batráquios que porventura aparecessem pelo caminho, mas revelou-se esperto o bastante para construir um império que perdura até hoje. Maranhão, Amapá e amplos tentáculos sobre o resto do País, inclusive no governo Lula.
A constituição vigente, que um político íntegro como Ulisses Guimarães chamou de “constituição cidadã” esbarrou na frase de efeito do presidente do Congresso Nacional Constituinte – o doutor Ulisses – e terminou nas emendas e distorções dos governos que se seguiram a Sarney. Collor, Itamar e FHC. O projeto que Brizola dizia que “isso vem de longe”. Veio do chamado Consenso de Washington, de um mundo globalizado na necessidade de sustentar o american way life. É importante notar essa diferença. Não no american way life, mas no sustentar o american way life.
Importante hoje não é o que um candidato vai fazer caso seja eleito. Importante é que os marqueteiros possam dizer, o produto que possam vender – o candidato – seja ele um corrupto e venal como FHC, ou como José Serra, um tresloucado como Aécio Neves – mas que não é burro, evidente –. Cumpre bem o seu papel Cauby Peixoto, com todo respeito ao cantor.
A idéia de terceiro mandato em si é um equívoco. O governo Lula busca o que Ivan Pinheiro chama de “capitalismo a brasileira” e isso não existe. É como democracia, lembrando a célebre resposta de Sobral Pinto ao coronel carcereiro – “não existe democracia a brasileira coronel. Democracia não é como peru que pode ser a moda, a brasileira, a francesa, ou é democracia, ou não é” –.
O modelo político gerado na Constituição Cidadã, nas emendas constitucionais que a deformaram inteiramente, na falta de regulamentação – tudo deliberado no mundo de faz de conta que vai mudar que as elites criam a cada eleição para manter o Zé Mané e a Mariazinha aqui embaixo calados – só se mostra podre num momento em que Lula inventou uma espécie de neoliberalismo populista e implementou programas sociais de profundo alcance – evidente –. Mas mantém intocadas as estruturas feudais no campo, o poder do empresariado e dos bancos e o latifúndio pleno e absoluto como agora na MP que autoriza a legalização de terras tomadas ao governo, logo, ao cidadão comum.
O governo Lula não promoveu uma reforma agrária. Nem promove. Se equilibra e caminha pelas brechas do neoliberalismo populista e escorado na política externa – essa sim, um avanço – do ministro Celso Amorim. A própria tranqüilidade relativa diante da crise internacional é conseqüência das regras aplicadas segundo os ditames do mundo neoliberal no setor financeiro.
A aposta de Obama em Lula, todo esse rapapé em torno do presidente brasileiro tem uma explicação lógica e os EUA não se oporiam a um terceiro mandato se percebessem uma espécie de onda popular para isso, pela simples razão que Lula é o meio termo entre o chavismo, por exemplo, e o alto preço pago para manter um narcotraficante governando um país base, a Colômbia – falo de Álvaro Uribe –. Mas preferem Serra que, como FHC, é funcionário da Fundação Ford. Como outras, a Rockfeller, associações sionistas, são os condôminos que representam Wall Street. Vale dizer, o modelo político e econômico atual.
Mais ou menos escreveu não leu o pau comeu. Com a diferença que Obama carrega um tubo imenso de vaselina e Bush levava um saco de areia.
A política de Lula, “o capitalismo a brasileira”, por outro lado gerou no momento de grande crise internacional, crise do próprio capitalismo, a perspectiva de se poder exibir ao mundo uma alternativa que não muda coisa alguma, apenas faz concessões aqui e ali e busca cortar os fatores que elevam custos, que é a principal preocupação dessa gente. E elevar custo para eles significa dar prejuízo. É o caso das guerras do Iraque e do Afeganistão e Obama percebe que começa a ser o alto preço para manter intacta uma organização terrorista do porte de Israel.
O Brasil continua a ser o país chave na América Latina. As eleições de presidente comprometidos com governos populares (Venezuela, Equador, Paraguai, Bolívia, Nicarágua e El Salvador e a presença de Cuba livre e soberana), as dificuldades para anexar a América Latina através da ALCA – Associação de Livre Comércio das Américas – e transformar toda essa parte do mundo num grande México (depósito de lixo dos EUA e do Canadá), tudo isso pode levar Obama a falar para fora em democracia, o que os norte-americanos mais fazem e para dentro mudar o sinal de vermelho para verde em relação ao terceiro mandato de Lula.
Isso se perceber uma onda popular ou riscos de derrota eleitoral do funcionário José Serra.
Para os brasileiros a questão é simples. As instituições estão falidas. O modelo político e econômico, como conseqüência dessa derrocada não se presta a uma perspectiva de um Brasil livre e soberano, pois estamos sendo comidos pelas beiradas – caso do pré sal –.
Quer queiramos ou não, esse “capitalismo a brasileira”, além de anômalo, não é forte o suficiente para deixar de ser capitalismo, logo, se esgota num dado momento da História e o preço a ser pago é alto – pelos donos não, pelos trabalhadores e cidadão comum –.
Terceiro mandato tem outra configuração. Não é necessariamente Lula. É a retomada do processo político para as mãos e decisões populares e isso implica em uma nova constituição, assim, numa Assembléia Nacional Constituinte, vale dizer, novas estruturas para o Estado. Retomada de setores estratégicos privatizados por FHC. Reforma agrária e integração latino-americana.
Do contrário será só mais um mandato sem nenhum avanço concreto ou efetivo, ainda que possa ser algo menos ruim que qualquer Serra ou Aécio da vida. Seria como um mal que se vai matar em dez anos, matar mais lentamente, pois começa e se esgota em Lula.
Ou há um compromisso nessa direção, ou não tem sentido.
De repente Lula vira “o cara” para Obama num jogo para valer mesmo e não num exercício de jogar confete. E a última coisa que pode acontecer a Obama, submetido a intensas pressões pela extrema-direita nazi/sionista em seu país, é perder de vez o Brasil.
Terceiro mandato tem que ter caráter revolucionário. De mudanças e não de reformas. Antes que as placas de nossas ruas virem “street Getúlio Vargas”. Ou “street Paulista”. E a PETROBRAS termine PETROBRAX.