DITADURA FOI UM GRANDE "NEGÓCIO" – O SUBMUNDO DA TORTURA

O que os militares brasileiros aliados à extrema-direita chamavam de desordem e tentativa de golpe contra as instituições democráticas, isso em 1964, foi apenas um grande "negócio" decidido em Washington. Bancos, empresas e latifúndio se associaram aos homens da borduna e tomaram conta do Estado e das tais "instituições", iniciando um período de saques, corrupção, entrega e barbárie.

As figuras centrais do golpe não foram brasileiros. Os grande sujeitos ocultos, mas nem tanto foram o embaixador norte-americano Lincoln Gordon e o "adido militar" no Brasil, o general Vernon Walthers, ex-diretor da CIA. O sinal ficou laranja quando perceberam que uma parcela das Forças Armadas estava engajada no projeto político de João Goulart e esse projeto desembocava nas eleições presidenciais de 1965.  

De concreto mesmo, em termos de decisão, só a guampada do general Olímpio Mourão Filho, a partir das decisões dos generais Muricy e Sizeno Sarmento, expoentes da linha dura. O temor que o grupo ligado a Castelo Branco pudesse demorar um pouco mais ou tentar algum acordo com Goulart e assim assegurar a permanência do presidente no governo.

Quando Mourão, que se auto intitulou "vaca fardada" saiu de Juiz de Fora, MG, para o Rio, sabia que estava plantando uma grande desordem nos meios golpistas por conta da "surpresa". 

Na decisão do general, tomada com a participação de Muricy e Sizeno Sarmento, estava um saco de gatos sem tamanho. Mourão era amigo pessoal de Juscelino, foi promovido a general por JK e eram ambos de Diamantina. Quando chegou ao Rio o general logo foi ligando para o ex-presidente. Muricy e Sizeno Sarmento eram lacerdistas. Castelo e seu grupo não eram nada, puro equilibrismo, mas atento ao comando de Vernon Walthers, amigo pessoal do primeiro ditador.

E de quebra o governador de Minas Gerais, Magalhães Pinto, que havia pintado os muros do Brasil inteiro com MP-65, contrapondo-se, dentro de seu partido, a ex-UDN, a pré-candidatura de Carlos Lacerda.

Toda essa confusão era apenas uma jogada para tomar conta do poder e assumir o controle dos negócios, pois, por trás, além dos norte-americanos (governo e empresas), estavam as grandes empresas brasileiras e todos os banqueiros e latifundiários, contrariados com as decisões de Goulart sobre remessa de lucros para o exterior e reforma agrária.

O que se seguiu depois foi um acordo entre os golpistas. Entrou Castelo que entregou a condução dos "negócios" a Roberto Campos e em seguida Costa e Silva, que chamou Delfim Neto. E assim foi, os esquemas se desenrolaram com a entrada em cena de Mário Henrique Simonsen no governo Geisel e nada além disso. O resto formado por títeres desse modelo.

Os homens da borduna foram apenas instrumentos do grande capital internacional, numa operação que acabou se estendendo a todos os países sul americanos não submissos a Washington ou com o risco de virem a ser contrário. Como acabou acontecendo no Chile com a eleição de Salvador Allende.

A "integração" dessa súcia foi fácil. Deram o nome de Operação Condor. Algo como um departamento mafioso para que fossem eliminados líderes oposicionistas que pudessem vir a causar problemas aos interesses da turma. 

Os primeiros momentos da ditadura, malgrado os pontos em comum (cassações, prisões de adversários) revelaram profundas discordâncias entre a direita militar. O chamado grupo castelista (que na verdade era liderado por Ernesto Geisel) e linha dura.

Surgem aí, na linha dura, os porões da ditadura, ou submundo de atrocidades, barbáries e "negócios". Todo o processo de repressão policialesca foi montado com participação de agentes norte-americanos, militares brasileiros, polícias militares, polícias civis e a recém criada Polícia Federal, com largo financiamento de empresas como a Mercedes, a Supergasbrás e outras tantas.

No curso do processo, nos governos Castelo, Costa e Silva, o período da junta militar e o governo Médice, esse esquema ganhou vida própria, desvinculou-se do poder central e se transformou em poder dentro do poder. Era o esquema onde um sargento muitas vezes valia mais que um capitão. Ficou na muda com Geisel e ressurgiu no episódio do Rio Centro com Figueiredo.

Manteve vínculos com o governo central ou através dos ministros militares, ou dos ministros da justiça e especificamente, por representantes diretos dentro do esquema de poder da chamada linha dura, caso de Jarbas Passarinho, major reformado coronel, ex-ministro da Educação e do Trabalho. Passarinho foi parte do processo de criação desse submundo no trabalho de desmontar estruturas dos movimentos estudantil e sindical e implantar no País o modelo norte-americano de educação via o convênio MEC-USAID (Ministério da Educação e Cultura e agência de desenvolvimento dos EUA).

O antigo SNI (Serviço Nacional de Informações), pensado, formulado e criado pelo general Golbery do Couto e Silva (ligado a Geisel e a grandes empresas multinacionais como a Dow Quimical) era parte desse núcleo/negócio e mesmo quando seu caráter repressivo começou a ser desmontado, no governo Geisel, manteve intocadas as peças da barbárie. Houve apenas um recuo tático, acentuado depois do frustrado atentado do Rio Centro. Militares de extrema-direita tentaram colocar uma bomba durante um show para culpar as forças de esquerda e dar um novo golpe tal e qual em 1965, quando um golpe dentro do golpe levou Costa e Silva à presidência da República.

A quase totalidade dos militares que comandavam os aparelhos repressivos, erigidos em DOI/CODI para melhor centralizar as operações e os comandos das PMs estaduais e policiais civis, eram ligados aos serviços de inteligência de cada força armada e nesse campo o CENIMAR (Centro de Informações da Marinha) ganhou destaque pela forma brutal e cruel com que atuava.

Já no início fica clara a participação de empresas, bancos e latifúndios nesse processo de repressão. São usados clubes de serviços (Lions e Rotary) como fatores de intercâmbio entre a chamada sociedade civil e os militares. São disseminados os cursos da Escola Superior de Guerra, um processo de formação ideológica de extrema-direita e subordinado ao modelo norte-americano (mas vestido de roupagem nacionalista, como é típico de "patriotas").

Uma das primeiras tarefas dos torturadores além da repressão aos movimentos estudantil e sindical, era o de neutralizar a ação da Igreja Católica no Brasil. O Concílio Vaticano II sob o papado de João XXIII e depois com Paulo VI havia criado condições para a Teologia da Libertação e o exercício da opção preferencial pelos pobres. Uma estreita ligação entre padres e líderes de expressão na Igreja com os movimentos populares é o alvo preferencial do "negócio" da tortura.

É por aí também, a guisa de registro, que começam a aparecer as igrejas neopentecostais. Vindas dos EUA aterrissaram primeiro no Chile e aqui foram cooptando figuras como Edir, o Macedo e outros, hoje uma das grandes forças da direita no Brasil. Chegam a ser um projeto próprio e fascista de poder.

É notável o trabalho do padre Joseph Comblin no livro "a doutrina da segurança nacional", editado pela Civilização Brasileira, descrevendo todo o processo ideológico que moldou a ditadura militar no País e particularmente os setores da repressão.

O nível de autonomia de comandante de um aparelho de repressão era de tal ordem que só quando dos assassinatos de Wladimir Herzog e do operário Manuel Fiel Filho algum tipo de freio foi colocado nesses grupos, forçando-os a um período de estratégica retirada e a volta com outras características já no chamado sistema democrático.

A maior parte dos oficiais das três forças envolvidos com tortura terminou em empresas privadas ou estatais com a passagem para a reserva. O grande número de empresas de segurança privada no Brasil surgiu com militares da repressão. E a princípio eram como que reserva ou canal de informações do "negócio" da tortura.

O aparelho repressivo no Brasil constituiu-se num submundo do regime militar, sempre escorado em palavras de ordem como "patriotismo", "nacionalismo" e outros dizeres fascistas, mas um submundo útil e fundamental durante os primeiros momentos. 

Oficiais que exerciam os cargos de secretários de segurança pública nos governos dos estados (eram previamente aprovados pelo poder central), ou comandantes das polícias militares, passavam à reserva ingressando na iniciativa privada. Num determinado momento da história da ditadura chegaram a formar uma forte bancada de deputados federais, estaduais, prefeitos, vereadores, tudo numa teia que ia da repressão aos "negócios". Muitas fortunas se fizeram nesse tipo de trabalho sujo, o que, aliás não é de se espantar. É da natureza desse tipo de gente padrão Ustra Brilhante, Torres de Mello, Almendra, Bolsonaro. Lício, etc. Um dado curioso, um dos principais torturadores no momento inicial da ditadura era o capitão Guimarães.

Guimarães prendeu e foi carcereiro de banqueiros de jogo de bicho no Rio. Não "agüentou" a pressão e virou banqueiro, hoje, um dos maiores contraventores do Brasil. Com negócios em todo o País e o título de "capitão".

O grupo, explicitamente, tem um representante no Congresso, o torturador Jair Bolsonaro. 

Essa teia repressão, empresas, bancos e latifúndios mantém-se intocada pela omissão do governo Lula em trazer a público os documentos oficiais da ditadura. O presidente optou pela convivência ora à distância, ora nem tanto (quando a AGU – Advocacia Geral da União sai em defesa de assassinos como Brilhante Ustra) com esses grupos.

A tortura no Brasil proporcionou grandes "negócios" aos torturadores. Abriu portas para operações de pura corrupção e o silêncio sobre os documentos oficiais impedem ainda hoje que se conheça o verdadeiro perfil desses bandidos. Torturadores, estupradores, assassinos e corruptos.

Chantagem, por exemplo. Muitas vezes o próprio governo por um ou outro ministro se via presa desse tipo de gente, nas informações levantadas pelos serviços de inteligência. Severo Gomes, ministro da Indústria e Comércio no governo Geisel era espionado 24 horas por dia a mando de Mário Henrique Simonsen.

Delfim Neto se valeu desses serviços para afastar adversários tanto nos governos a que pertenceu e dos quais participou, como entre empresários que se opunham às suas diretrizes políticas e econômicas. Ou aos seus "negócios". 

O senador Romeu Tuma, diretor do DOPS de São Paulo e mais tarde diretor do Departamento de Polícia Federal. Era parceiro de Sérgio Fleury Paranhos, um dos mais sanguinários agentes da repressão. Segundo consta na biografia de Tuma ele não torturava. Naturalmente ia caçar passarinhos quando Fleury abria o açougue.

Tuma é senador, Delfim foi deputado por vários mandatos, hoje é um dos principais consultores de empresas e guru de Lula em algumas questões econômicas.

A tortura no Brasil não foi só um momento de barbárie, foi parte do modelo ditatorial corrupto e entreguista. O nacionalismo dessa gente se mede pelos "negócios", está aí o general Augusto Heleno, fiel intérprete no momento atual dos interesses das grandes empresas nacionais e internacionais. E com os mesmos chiliques de patriotismo dos idos de 64. 

Se os norte-americanos soubessem que teria sido mais simples fundar o PSDB, tucanos, comprar Fernando Henrique e ficar esperando por José Serra com a conivência/omissão de Lula, teriam economizado uma nota e resolvido a "coisa" num espaço de tempo menor.
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