Quando o ditador Ernesto Geisel chamou de “lento e gradual” o processo
de pseudo redemocratização do Brasil, na prática estava estabelecendo
as condições para essa suposta democracia, controlada por medicamentos
repressores que ainda permanecem vivos no entulho autoritário que
sobrevive da legislação da ditadura e no silêncio, a cortina de fumaça,
sobre os anos de horror e terror promovidos pelo golpe de 1964.
O argumento usado com freqüência que a anistia tem mão dupla, por si
só, implica no reconhecimento implícito dos crimes cometidos nos
quartéis e nos DOI/CODI espalhados pelo País. Foi a maneira encontrada
de evitar que toda a história da tortura e da barbárie viesse a público.
É como se o general ditador tivesse construído uma ferrovia e a batizasse de democracia, mas com os trilhos começando e terminando nos interesses que balizaram o golpe de 1964.
O governo Geisel terminou antes do fim da União Soviética e portanto da guerra fria. O governo Figueiredo terá sido o maior equívoco de todos os cometidos pela ditadura, pois transformou-se numa espécie de festival da corrupção dos grupos que desde os primeiros momentos do golpe monitoravam e controlavam os militares que tinham e tiveram tão somente o papel de polícia das elites econômicas verdadeiras mentoras do golpe e em associação direta com a realidade mundial. Elites são apátridas e as nossas acima de tudo subservientes e ávidas por caírem de quatro.
Os governos que se seguiram à ditadura, sem contar Tancredo que morreu antes de sua posse, não discreparam um só instante do roteiro traçado pelo general Geisel, nem mesmo o de Itamar Franco, uma espécie de espaço de tempo entre o neoliberalismo iniciado sob a égide de Collor de Mello e a sua efetiva implantação a partir de FHC. Nunca é demais lembrar que a privatização da Companhia Siderúrgica Nacional, marco da história do País, aconteceu no governo dele Itamar.
O que se vê hoje é um degradante espetáculo de disputa pelo botim de um Brasil colonizado e perplexo diante de um governo que eleito com o compromisso de mudanças profundas na estrutura política e econômica do País se transforma no algoz da soberania nacional e da integridade do nosso território ao ceder ao projeto neoliberal a despeito de eventuais avanços sociais, mas todos sem sair dos trilhos da estrada do general Geisel um milímetro sequer.
E pior, encurralado por uma oposição com a qual procura acordo, como agora, a vergonhosa aliança do PT com o PSDB em Belo Horizonte e o veto de faz de conta da direção nacional do partido.
O mês de abril mostra a importância da luta popular para as conquistas reais e efetivas da classe trabalhadora e camponeses na busca de transformações que afirmem o Brasil dentro de um contexto real de nação livre e soberana. E não mero entreposto onde os cavalos da Wells Fargo são trocados e os condutores alimentados.
Há aspectos positivos no governo, a política externa do ministro Celso Amorim. Mas tem que matar um leão por dia para sobreviver a voracidade entreguista da área econômica e acima de tudo na agricultura.
As conseqüências são imprevisíveis nos detalhes, mas previsíveis no geral. Estamos nos transformando num celeiro de transgênicos e áreas para bio combustíveis esquecidos de milhões de brasileiros a serem alimentados e da importância da reforma agrária como forma de assegurar um Brasil efetivamente livre.
O chamado “abril vermelho” é uma ponta da luta de classes que permanece viva e contraria Lenine que não enxergava nos camponeses a capacidade de enfrentar o poder das elites econômicas e políticas.
Questão só de “tempo e lugar” como diria Billy Blanco.
O modelo institucional está falido. Executivo, Legislativo e Judiciário trafegam em mão única, malgrado eventuais divergências que são apenas pela posse da chave do cofre.
O PAC é um projeto de transferência dos recursos públicos para a iniciativa privada e mais que isso, o Estado abrindo mão de suas prerrogativas, direitos e obrigações para grupos criminosos como a ARACRUZ, a VALE, para citar os dois mais em evidência.
O Estado do Espírito Santo que já foi o paraíso do crime organizado é hoje uma espécie de ilha cercado por todos os lados pelo crime legalizado. A corrupção não é um acidente de percurso, mas regra geral e implícita ao modelo.
O desafio do movimento popular neste momento está cumprido pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, vinte anos após a morte de Chico Mendes e com um crescente desmatamento da Amazônia na nefasta política de bio combustíveis. Não é de se espantar que o preço dos alimentos estejam disparando. Em breve os alimentos terão o mesmo valor do ouro ou qualquer metal precioso.
Países da América do Sul reencontram seus caminhos com novas constituições e processos de nacionalização da infra-estrutura. Venezuela, Bolívia, Equador e as perspectivas são favoráveis no Paraguai (o risco é a fraude como aconteceu no México).