Darcy Ribeiro (que viveu tempos entre índios) tinha uma definição
perfeita para o aparecimento do Estado como instituição de poder. De
poder, não de regulamentação ou instrumento para proporcionar o bem
estar em todos os sentidos.
Dizia que o mais inteligente chamou o mais esperto, isso quando a
população do planeta não ultrapassava a cem mil pessoas, por aí e
combinaram que um seria o rei (o mais esperto) e outro, o mais
inteligente, o sacerdote. Instituiriam os impostos, definiriam a
propriedade, os tribunais e, por via das duvidas, para garantir o
respeito à lei e a ordem chamariam aquele mais tapado e mais forte para
cumprir as ordens de "sentar borduna" em quem desafiasse o poder
conferido por Deus, via sacerdote, ao rei, o mais esperto. Os lucros
seriam rachados entre os dois e uma beirada razoável para o homem da
borduna, pelo menos capaz de mantê-lo fiel.
O general Custer, idolatrado pelos norte-americanos em filmes de western sobre a conquista do território dos EUA, sua "libertação", contava aos milhares os escalpos de índios que matou com sua sétima cavalaria, abrindo o país a latifundiários.
Num dado momento da História, dando um salto, o homem da borduna ganhou força suficiente para se meter entre o mais esperto e o mais inteligente e muitas vezes arrancou a coroa e o poder divino de um e outro e se arvorou em chefe de tudo e todos na presunção da superioridade.
Foi mais ou menos aí que inventaram o tal do "patriotismo". Para não ficar citando só Samuel Johnson (o patriotismo é o último refúgio dos canalhas"), Millôr Fernandes afirma que "o Brasil espera que cada bestalhão cumpra o seu dever". E sobre pátria – "demoliram a pátria e estão vendendo os escombros".
Robert Altman, o notável diretor de cinema, num filme magistral, MASH, mostra o caráter da sociedade norte-americana, o tal Estado e suas conseqüências. Altman mostra a guerra da Coréia exibindo a barbárie em tempos de Vietnã. A barbárie misturada ao desprezo pela vida.
É claro que nem a caserna resistiu e num determinado momento alguns pensaram sobre o significado da borduna e pretenderam ou conseguiram fazer com que se voltasse contra o rei/sacerdote, a tal ordem e a tal lei.
Nguyen von Giap, Mao Tsé Tung, Zukov, entre nós Luís Carlos Prestes, como aqueles com sacerdótica vocação para transformar a borduna em cachimbo da paz, Cândido Rondon.
Ou pegar as armas muitas vezes ensarilhadas para fazer valer a indignação diante da barbárie dos que não enxergavam nada além da própria borduna e da presunção de árbitros da lei, da ordem e do tal patriotismo.
Lamarca, Joaquim Cerveira, Cardin, Gregório Bezerra e outros tantos. Ou se transformaram em generais como Zapata. Nada daquele negócio dos tempos que Jô Soares era vivo e chamava de "carreirinha".
A quem o general Augusto Heleno, comandante militar norte-americano na Amazônia serve com seu discurso de patriota? A brasileiros nativos, os índios, cerca de 18 mil, ou a poucos grileiros de terra?
Por que o general não questiona o desmembramento efetivo do território nacional promovido pela VALE, antiga VALE DO RIO DOCE?
O ministro da Defesa Nelson Jobim anunciou um aumento para militares e na mesma entrevista falou que o episódio da Reserva Raposa do Sol estava encerrado.
Está não. Não há um golpe evidente, mas há indisciplina e cooptação de setores das forças armadas brasileiras no contexto da guerra travada noutro plano em relação a 1964 (não existe mais a guerra fria).
A borduna se torna uma bitola patriótica no avanço efetivo do império norte-americano sobre o Brasil e demais países sul americanos. O controle da Amazônia brasileira é feita pelos "inimigos" em parceria feliz com os militares brasileiros, ou nas manobras chamadas UNITAS.
Aquela que a rede norte-americana GLOBO exibe e mostra o porta aviões George Washington, "um dos maiores do mundo", enquanto distrai a população com a morte de Isabela e noutra ponta faz um acordo com o pai e a madrasta da menina para uma entrevista exclusiva para o FANTÁSTICO, alavancando, como gostam de dizer, uma audiência em pelo menos mais dez pontos.
O alvo somos nós a médio prazo e Chávez, Evo Morales e Rafael Corrêa a curto prazo. Vão perder a base de Manta no Equador? Já deram uma grana para Alan Garcia e vão montar outra no Peru.
Mário Uribe, primo do traficante Álvaro Uribe está "asilado" na embaixada da Costa Rica, pois nem o primo conseguiu esconder seus crimes e suas ligações com o tráfico, enquanto vai golpeando e assassinando os que lhe são contrários.
A pátria hoje, no sentido lato da palavra, tem a dimensão dos governos legítimos. Produto das vontades dos povos respectivos e que se voltam para a integração dos países latino-americanos.
Os berros do general Heleno são o gritos do patriotismo canhestro e bisonho dos que servem a interesses internacionais e beijam a bandeira do Brasil.
Na Argentina, quando Perón era presidente, se dizia que o general vendia "La Pátria" e apregoava "La Democracia". Eram os dois maiores jornais do país à época.
O general Heleno veio ao Rio defender grileiros, invasores de terras indígenas e demarcá-las como terra indígenas não as transforma noutro país.
Mas a VALE, contra a qual o general não disse uma palavra, essa sim. Comprou parte do território nacional. É dona e faz o que bem entende e nunca nenhum general ou nenhuma viúva da ditadura militar falou qualquer coisa sobre isso. Ou se indignou.
É por essas e outras que Guevara foi e é um grande general. A capacidade de se indignar sem se calar por conta de aumento ou umas bordunas extras para brincar.