Muitos norte-americanos compreendem o cerne do alerta que o presidente Dwight Eisenhower lançou, em 1961, sobre a influência do “complexo militar-industrial”, como o dinheiro e o grande número de empregos acabariam por subordinar os congressistas aos interesses dos fabricantes de armas em suas respectivas bases eleitorais. Mas há outros meios, menos óbvios, mas igualmente insidiosos, pelos quais o militarismo deformou a República.
Depois da 2ª Guerra Mundial, até instituições que se supunha que pudessem de algum modo controlar o poder dos gastos militares acabaram também corrompidas – da imprensa-empresa nos EUA a intelectuais, acadêmicos e analistas da Agência Central de Inteligência, CIA. O dinheiro do militarismo avançou até já bem além dos fabricantes de armas.
Em décadas recentes, a propaganda pró-militares cada dia mais frequentemente derrota – como tem derrotado – o jornalismo; think-tanks mantidos por grandes indústrias fabricantes de armas já há muito abandonaram qualquer pesquisa confiável; e funcionários pró-militarismo, dentro do aparelho do Estado, já sobrepujam, em quantidade, os analistas da CIA dos quais se esperava que fornecessem informação objetiva ao presidente e principais conselheiros.
Esse perigoso fenômeno é tema do livro National Insecurity: The Cost of American Militarism [Insegurança Nacional: o custo do militarismo norte-americano, 2013], do ex-analista da CIA Melvin A. Goodman. É livro escrito do ponto de vista de quem vivenciou momentos chaves da guinada espasmódica, do que era uma república civil, para um império militarista. Goodman oferece panorama amplo e disseca a crise.
Para Goodman, houve várias encruzilhadas nas quais os EUA poderiam ter tomado rumo menos acintosamente militarista. Mas, cada vez mais, a pressão cumulativa das centenas de bilhões de dólares dos gastos militares empurrava os políticos na direção de mais e mais militarismo.
Em vários desses pontos de decisão, alguns políticos, a começar por Eisenhower, tentaram resistir àquelas pressões, mas todos sempre sucumbiram à propaganda que criava e difundia alguma sempre nova ameaça estrangeira, ou acusava de fraqueza pouco viril um ou outro político com (algum) poder de decisão. Os políticos respondiam com apoio a alguma nova guerra, ou com mais dinheiro para os militares.
Essa fantasia do “homem-durão” prevaleceu também na imprensa-empresa norte-americana, onde os jornalistas assalariados temiam ser rotulados de “antiamericanos” ou de “frouxos” ante um ou outro adversário estrangeiro. Os principais think tanks de Washington, inclusive os considerados de esquerda ou centro, já se alinharam ao homem-durão-ismo para não ser marginalizados como “liberais”.
Essa deriva na direção do militarismo fortaleceu-se depois que as lembranças da 2ª Guerra Mundial começaram a evanescer. Como Goodman observa, Eisenhower orgulhava-se de ter posto fim à Guerra da Coréia e de ter evitado outras guerras durante seu mandato; mas deixou que prosperassem as operações clandestinas conduzidas pela nova CIA. Usou essas ferramentas perigosas para depor governos, como o de Mohammed Mossadegh no Irã em 1953 e de Jacobo Arbenz na Guatemala em 1954.
Mesmo assim, como Goodman escreveu, Eisenhower dizia da própria presidência que “os EUA não perderam um único soldado em campo durante meu governo. Mantivemos a paz”.
Encolhendo (sob a pressão do Pentágono)
Presidentes que o sucederam não conseguiram igualar o que Eisenhower alardeava sobre manter a paz ou poupar vidas de soldados, mas alguns pressionaram na direção de que se firmassem acordos de controles de armas com a URSS, frequentemente contrariando os desejos dos altos escalões do Pentágono. E quatro presidentes eleitos em sequência depois de Eisenhower – John F. Kennedy, Lyndon Johnson, Richard Nixon e Gerald Ford – também tiveram de enfrentar as consequências de entrar levianamente na, e sair dolorosamente da, Guerra do Vietnã.
Então, depois de rápido respiro pós-guerra nos anos 1970s, recomeçaram as pressões para investir mais e mais nos militares norte-americanos. Jimmy Carter pôs-se a trabalhar, em parte como modo de reagir às críticas contra sua “fraqueza”. Mesmo assim, foi vencido nas eleições de 1980 pelo muito mais beligerante Ronald Reagan.
Com Reagan na presidência, o descrédito do uso de armas, típico do período pós-Vietnã – a chamada “Síndrome do Vietnã” – que se espalhava pela imprensa e, até, em partes do Congresso dos EUA – foi deslocado. Reagan fez o militarismo voltar a ser belo e divertido, seja pelo apoio que deu aos “combatentes da liberdade”, seja pelas operações mais leves e rápidas que patrocinou, como a invasão de Granada.
O livro de Goodman é interessante, sobretudo, pela leitura que faz dessa ascensão do militarismo sob Reagan (de meados e fim dos anos 1970s, até os anos 1980s), momento em começaram a ceder os últimos controles que ainda havia sobre o militarismo; e período ao qual Goodman assistiu, em assento na primeira fila, como analista sênior da CIA, responsável por examinar a ameaça soviética.
Goodman acompanha os primeiros estágios da politização/partidarização das análises da CIA, até Nixon nomear James Schlesinger para dirigir a Agência, no início de 1973, quando o escândalo Watergate apenas começava a se aprofundar. Nixon se tornara cada dia menos simpático à CIA por causa das críticas que a Agência fazia à Guerra do Vietnã.
Nas palavras de Goodman:
“Schlesinger nada escreveu, mas reuniu os especialistas em soviéticos que trabalhavam na Agência e avisou: “Essa agência vai parar de ferrar Richard Nixon”. Eu estava na sala, porque era analista de questões soviéticas. O objetivo de Schlesinger era pôr a CIA em rédea curta; porque a Agência produzira análises que andavam na direção contrária à política de Nixon para o Vietnã” [National Insecurity, p. 245].
A perversão dos serviços de inteligência
Depois da renúncia de Nixon, relacionada ao escândalo de Watergate – e com as eleições de 1976 à vista – o presidente Ford viu-se sob crescente pressão da Direita Republicana, muito especialmente da candidatura insurgente do governador da Califórnia, Ronald Reagan. Ford então procurou modos de aplacar o desejo da Direita, que ansiava por posição mais dura contra os soviéticos.
A oportunidade surgiu quando um grupo da direita e intelectuais conservadores unidos ad hoc e solicitaram acesso à informação bruta que a CIA recolhia sobre capacidades militares dos soviéticos, com o projeto de redigirem, eles mesmos, suas próprias análises.
William Colby, então diretor da CIA, opôs-se à ideia, entendendo que aquele movimento operaria como novas pressões sobre os analistas da CIA encarregados de reportar ao presidente e outros altos funcionários e dos quais se esperava avaliações objetivas das ameaças globais. Mas o próprio Ford estava sobre forte pressão política. E o ex-presidente dos Republicanos, George H.W. Bush, foi nomeado para substituir Colby como diretor da CIA. Goodman relembra:
“Colby não permitiria que um grupo bem evidentemente polêmico, liderado por um professor de Harvard, Richard Pipes, chamado “Time B”, sequestrasse a produção de análises, previsões e orientações de inteligência. Bush não pensaria duas vezes para fazer exatamente isso. Ford demitiu Colby, e Pipes – com a ajuda do Chefe de Gabinete na Casa Branca Dick Cheney e do Secretário de Defesa Donald Rumsfeld – nomeou uma equipe de professores e acadêmicos de direita e funcionários de governos Republicanos anteriores para redigir as análises sobre as capacidades militares dos soviéticos. (...) O “Time B” alertou sobre o desenvolvimento de várias armas soviéticas que jamais foram desenvolvidas. Entre elas, directed energy weapons, sistemas móveis de mísseis antibalísticos ABM e novas capacidades no campo dos satélites. A equipe de Pipes concluiu [falsificando informação] que a União Soviética rejeitara a paridade nuclear, estaria trabalhando para combater e vencer uma guerra nuclear e estaria aumentando os gastos militares”. (p. 247).
Embora as conclusões do “Time B” fossem gravemente distorcidas, tiveram um bem previsível impacto sobre os analistas da CIA, que rapidamente perceberam que suas carreiras estariam ameaçadas se insistissem em constatar que a economia soviética aproximava-se de crise econômica profunda e que, correspondentemente, o poder militar de Moscou também decaía.
Como Goodman escreve:
Depois de entender claramente o processo que se via nas paredes e corredores da Agência, os analistas do “Time A” da CIA passaram a exagerar tudo que tivessem de escrever sobre os gastos militares e a tecnologia militar dos soviéticos (p. 248).
As consequências desses exageros e distorções seriam profundas e duradouras. Depois de deixar o posto de diretor da CIA em 1977, Bush abraçou ideias super infladas-distorcidas do que seria o poderio bélico soviético e todas as previsões alarmistas construídas para serem usadas contra os esforços do presidente Jimmy Carter para conter o orçamento militar e impor algum tipo de controle sobre armas.
A invenção de Reagan
Depois que Reagan esmagou Carter na eleição de 1980, aqueles relatórios e previsões infladas-distorcidas passaram a servir como base para grande ampliação nos projetos de produção de armas nos EUA. Uma nova geração de carreiristas também já concluíra que a carreira só avançaria se se pusessem a repetir e endossar qualquer ideia que lhes chegasse do Time B.
Por exemplo, Goodman observa que um então ambicioso jovem vice-diretor da CIA, Robert Gates,
“usou aquelas análises completamente inflado-distorcidas numa série de discursos que pronunciou para se autopromover no governo Reagan” (...) (p. 247).
“Nos anos 1980s (...), o diretor [William] Casey, da CIA, e o vice-diretor Gates (...) fizeram sua própria campanha pública para exagerar as capacidades soviéticas e justificar que os EUA fizesse investimentos gigantescos de dinheiro no programa “Guerra nas Estrelas” do presidente Reagan (...)” (p. 253).
“A CIA precisou de quase uma década para corrigir os registros e devolver a patamar real e confiável as estimativas e previsões. Mas o dano estava feito. O governo Reagan usou todos aqueles dados inflado-distorcidos sobre o poderio militar soviético para enterrar um trilhão e meio de dólares nos gastos ‘de defesa’ nos anos 1980s. Foram gastos altíssimos, para fazer face a uma ameaça soviética enormemente exagerada, e a uma URSS já em declínio” (p. 248).
Quando o bloco soviético começou a partir-se, no final dos anos 1980s, Gates e outros figurões na CIA continuavam a ignorar esse desenvolvimento histórico, porque continuavam programados para ignorar qualquer informação de inteligência que sugerisse alguma fragilidade em Moscou. Sim, mas... Quando já não era possível continuar a ignorar a realidade, esses e outros direitistas ativos simplesmente “acomodaram” a narrativa: passaram a dizer que a grande força militar que Reagan construíra e suas outras estratégias agressivas haviam derrotado os soviéticos que, afinal, haviam sido postos de joelhos.
E assim se inventou o Legado de Reagan. Em vez de aceitar os fatos, que os soviéticos estavam numa longa trajetória de declínio – que se poderia explicar em parte pelo sistema econômico e pelos avanços tecnológicos dos EUA para o programa espacial nos anos 1960s – e que a equipe de Reagan mentira sempre sobre a realidade soviética para justificar seus novos gastos militares, a Direita agarrou-se a um roteiro inventado. Reagan teria ordenado ao presidente Mikhail Gorbachev: “derrube esse muro”. E assim, presto, acabou-se a Guerra Fria!
Até hoje, reza a “sabedoria” convencional nos círculos do poder em Washington, que “Reagan venceu a Guerra Fria”. Mas, como Goodman escreve:
“Reagan é frequentemente coroado com os louros de ter derrotado a União Soviética e posto fim à Guerra Fria. A verdade é outra: o governo Reagan, apoiado na desinformação que lhe era fornecida por Casey e Gates, inflou a ameaça soviética; na sequência, reivindicou os créditos por ter superado a ‘ameaça’” [p. 285].
Começa a confusão afegã
A politização/partidarização da inteligência na era Reagan teve outras consequências negativas. Por exemplo, por causa do alarme inflado no governo Reagan contra a União Soviética, os EUA e a Arábia Saudita direcionaram bilhões de dólares em ajuda militar para fundamentalistas islamistas que combatiam contra o governo apoiado pelos soviéticos no Afeganistão.
Para que os suprimentos chegassem ao Afeganistão, o governo Reagan teve também de articular-se com a ditadura islamista no Paquistão; parte disso foi feito com ordens para que a CIA desviasse os olhos e “não visse” que os paquistaneses estavam construindo sua bomba atômica; e para que a Agência mantivesse bem longe dos olhos e ouvidos dos membros do Congresso qualquer informação que tivesse sobre isso. Escreveu Goodman:
“Em 1986 o vice-diretor da CIA, Gates, lançou um ultimato: não haveria qualquer referência sobre atividades nucleares no Paquistão, no Diário da Inteligência Nacional [orig. National Intelligence Daily], produto da CIA que era enviado às comissões de inteligência do Senado e da Câmara de Representantes” (p. 255).
Um dos efeitos da operação Reagan no Afeganistão foi o Paquistão ter-se convertido em estado armado com bombas atômicas (fato que, para muitos, configura a mais grave ameaça para todo o mundo contemporâneo); e o Afeganistão ter caído sob controle dos Talibã (os quais deram abrigo a Osama bin Laden e à al-Qaeda).
Mas o culto a Reagan que veio depois da Guerra Fria foi força determinante na condução dos eventos das duas últimas décadas, no governo Republicano e também no governo Democrata. Por exemplo, Goodman critica fortemente, em seu National Insecurity, a falta de visão estratégica do presidente Bill Clinton, que poderia ter afastado os EUA da paranoia da Guerra Fria e conduzido o país para posição muito menos militarista em todo o mundo. Escreveu Goodman:
“O presidente Clinton simplesmente não deu atenção suficiente à política externa, sempre mais interessado em, antes de agir, ler os resultados das pesquisas de opinião (...) Efeito disso, o presidente Clinton não deixou qualquer legado nem no campo da política externa, nem no campo de algum projeto de segurança nacional” (p. 141).
Em vez de projetar um caminho que conduzisse o país rumo a futuro de mais paz, Clinton curvou-se aos militares mais linha-dura.
“Clinton foi o primeiro presidente que não conseguiu fazer frente ao Pentágono e impor um grande tratado de controle de armas, quando se recusou a enfrentar a oposição que o Pentágono fez ao Comprehensive Test Ban Treaty (CTBT)”, escreveu Goodman (p. 128).
O retorno dos neoconservadores
Depois dos oito anos de Clinton, voltaram os neoconservadores, com George W. Bush; e – depois do 11/9 – foi uma nova grande “avançada” nos gastos militares para guerrear a “Guerra Global ao Terror” de Bush e dar fim a antigos adversários, como Saddam Hussein do Iraque.
Os neoconservadores, que já tinham afiado os dentes políticos ao exagerar a ameaça soviética nos anos 1970s e 1980s, voltaram aos velhos truques e golpes, outra vez inflando ameaças, dessa vez a ameaça que viria do Iraque, em 2002-2003. Outra vez foram ajudados e apoiados por funcionários carreiristas da CIA, dentre os quais o ultra maleável diretor George Tenet, que não ofereceu qualquer resistência a mais politização/partidarização da agência.
Diz Goodman:
“Quando George Tenet, diretor da CIA, fez aquele comentário infame [em dezembro de 2002], de que apresentar inteligência para justificar a guerra contra o Iraque seria “super fácil” [orig. slam dunk, aprox. “fácil como enterrar a bola na cesta de basquete”], não falava sobre apoiar a decisão do governo Bush de invadir militarmente o Iraque; referia-se, isso sim, ao que o presidente lhe ordenara, que apresentasse inteligência que convencesse o povo dos EUA e a comunidade internacional de que a guerra era necessária. De fato, a decisão de invadir o Iraque já estava tomada, sem qualquer consulta aos serviços de inteligência. Bush só precisava da contribuição dos serviços de inteligência para dar alguma ‘racionalidade’ ao caso, já decidido, da guerra ao Iraque” (p. 151).
Até funcionários da CIA muito mais íntegros – como o analista sênior, Paul. R. Pillar – cederam às ordens da Casa Branca. Goodman escreveu que:
“Pillar afinal disse, num documentário para o programa Frontline da rede PBS, que fora diretamente responsável por militarizar a inteligência para o governo Bush. No documentário, que foi ao ar em junho de 2006, Pillar disse que o documento de inteligência [orig. “White Paper”] para justificar a invasão ao Iraque fora ‘diretamente solicitado, encomendado e publicado com objetivos bem claros (...) de reforçar o argumento a favor da guerra, para a opinião pública norte-americana” (p. 173).
E Goodman acrescentou:
“O fundo do poço da militarização da inteligência aconteceu quando o governo Buch pôs-se a selecionar a inteligência que desejava, ainda que não passasse de falsa inteligência sobre a indústria do urânio no Niger ou sobre laços que haveria entre Saddam e bin Laden” (p. 179).
O fracasso de Obama
Nem as violações, por Bush, da lei internacional, nem a corrupção política que brota do militarismo excessivo parecem ser problemas para o presidente Barack Obama, que assumiu em 2009.
Obama fracassou, ao “não dar qualquer importância às questões imorais que herdou do governo Bush”, escreve Goodman. E acrescenta:
“...a nenhuma vontade que Obama manifesta de atacar a questão da tortura e outros abusos é, talvez se possa dizer, o maior fracasso de seu primeiro governo, porque assim ignorou os crimes cometidos em passado recente e violações à lei nacional e à lei internacional. Assim deixa a porta aberta para que o próximo presidente recorra, novamente, às mesmas práticas” (p. 231).
Obama manteve, inclusive o alto comando militar de Bush, inclusive o Secretário de Defesa, Robert Gates, que ressuscitara da aposentadoria em 2006; e praticamente todos em Washington esqueceram seu passado muito comprometedor.
Para Goodman
“O Departamento de Defesa nas mãos de Bob Gates tornou-se ferramenta de ainda mais autopromoção, para que Gates acumulasse mais poder e influência. Quando Obama, sem sinal de alguma disposição para promover mudança significativa, tomou a decisão sem precedentes de manter o Secretário de Defesa do governo anterior, foi fácil entender que o país, tão cedo, não superará essa década de governança irresponsável” (p. 191).
Gates várias vezes cortou as asas do inexperiente Obama, como quando Gates recusou-se a atender o presidente, que lhe pedia opções para sair da guerra do Afeganistão, e só trouxe propostas para escalar o conflito e adotar uma estratégia de contrainsurgência de longo prazo. A insubordinação de Gates continuou até durante sua viagem de despedida, em 2011.
Como Goodman observou:
“Gates assumiu as posições da linha dura contra qualquer plena retirada do Iraque; contra a retirada do Afeganistão; contra qualquer redução significativa no orçamento da defesa; e contra qualquer reforma no processo pelo qual o Pentágono compra armamento. Em sua última semana, viajou a Bagdá e Kabul, onde contradisse o que o presidente Obama dissera e suas posições sobre o Iraque e o Afeganistão” (p. 201).
Tudo isso implica que, mais de duas décadas depois de a União Soviética ter sido extinta – e uma década depois de George W. Bush invadir o Iraque, sem que os EUA tivessem sofrido qualquer provocação – o complexo industrial-militar continua vivo e ativo, ainda operando, em grande parte, como Eisenhower alertou:
“Essa conjunção de um imenso establishment militar e uma imensa indústria de armas é novidade, na experiência dos EUA. A influência total – econômica, política, até espiritual – sente-se em todas as cidades, em todos os prédios dos governos estaduais, em todos os gabinetes do governo federal (...) Nos conselhos de governo, temos de nos precaver contra a influência que o complexo industrial-militar venha a ter, sem qualquer embasamento, deliberadamente buscada ou não. O potencial de ascensão desastrosa desse poder mal posto existe e persistirá”.
O livro de Goodman, National Insecurity, oferece resumo valioso de como esse “poder mal posto” realmente persiste. Além do que recomenda, para que se consiga afinal controlar o dinheiro que alimenta o complexo industrial-militar, Goodman também sugere que os EUA comecem, afinal, a se autoidentificar realistamente como parte da comunidade de nações, não como alguma espécie de policial planetário que se autocomanda.
“Os EUA têm de abandonar qualquer noção de “excepcionalismo”, que já levou o país a descolar contingentes militares para várias partes do mundo, como se assim promovessem valores norte-americanos” – escreveu Goodman (p.367).
Essa recomendação – além de outras observações ao longo do livro – ganham peso especial, porque vêm de um analista sênior da CIA, homem que viu acontecer, de primeira mão, o processo pelo qual o complexo militar-industrial corrompeu a república.
_______________________
Robert Parry |
4/3/2013, Robert Parry, Consortium News
“What Has US Militarism Wrought?”
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
http://redecastorphoto.blogspot.com.br