O brejo está na moda

Depois que a prefeitura de Campos elevou uma das margens da Lagoa Maria do Pilar com aterro para a construção de casas populares, tudo licenciado oralmente pelo Instituto Estadual do Ambiente (INEA), houve um interesse salutar pelo ecossistema “brejo”. Lagoas e rios são protegidos pela Área de Preservação Permanente (APP), figura regulamentada pela Deliberação 303, de 2002, expedida pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). Lagoas que foram envolvidas pela malha urbana contam com uma APP de 30 metros não edificáveis. Nas lagoas envolvidas pelo meio rural, a APP passa a ter 100 metros. Aldo Rabelo, deputado federal do PC do B, está propondo, agora, que as medidas das APPs fiquem a critério de cada estado, suprimindo, assim, a norma federal para beneficiar a atrasada classe ruralista brasileira.

A banda má do INEA sustenta que brejo não tem APP, enquanto a banda boa tenciona criar legislação estadual para proteger os brejos. Mas, afinal, o que é um brejo? Este ecossistema aquático continental não tem merecido a devida atenção pelos cientistas. Dificilmente, encontramos alguma análise em livros especializados sobre este ambiente considerado repelente no senso comum. Ele também não figura na legislação de ambiente. Comecemos por dicionários comuns.

Pelo antigo “Diccionario da Lingua Portugueza", de Antonio de Moraes Silva (Lisboa: Typographia Lacerdina, 1813), entende-se brejo como "Terra úmida, lodosa, alagadiça, que serve para arrozais (talvez do castelhano brecho)”. No Dicionário de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, brejo é sinônimo de pântano, terreno sáfaro, agreste, onde só medram urzes. É também lugar úmido, frio e ventoso. Particularmente no Brasil, é terreno onde os rios se conservam mais ou menos permanentes, em geral fértil, em virtude dos transbordamentos anuais. Pode ser entendido também como lugar baixo onde há nascentes.

Para Cêurio de Oliveira, em seu “Dicionário Cartográfico” (Rio de Janeiro: IBGE, 1993), trata-se de “Local onde um rio transborda durante as chuvas, criando uma área propícia à agricultura." Antônio Teixeira Guerra, no “Dicionário Geológico Geomorfológico” (Rio de Janeiro: IBGE, 1993), conceitua brejo como "terreno plano, encharcado, que aparece nas regiões de cabeceira ou em zonas de transbordamento de rios."

Pela definição contida no "Vocabulário Básico de Meio Ambiente" (Rio de Janeiro: Serviço de Comunicação Social da Petrobras, 1990), brejo é "Terreno molhado ou saturado de água, algumas vezes alagável de tempos em tempos, coberto de vegetação natural própria na qual predominam arbustos integrados com gramíneas rasteiras e algumas espécies arbóreas."

No "Glossário de Ecologia" (São Paulo: ACIESP, 1997), brejo é definido como “Área de solo permanente ou periodicamente saturado d'água, onde se desenvolvem campos e/ou macrófitas aquáticas." O brejo pode ser estacional, ou seja, "Campo cujo solo fica saturado ou coberto por água durante parte do ano (geralmente de 1 a 9 meses) e seco durante a estação seca ou, pelo menos, na última parte desta."

Lemos, no “Dicionário Prático de Ecologia”, de Ernani Fornari Neto (Brasília: Alhambra, 1992), que brejo é "Ambiente onde ocorre abundância de água pelo mau arejamento do solo, havendo vegetação específica, como aguapés, lírios do brejo, taboa etc."

Por este pequeno bosquejo, é possível relacionar alguns elementos comuns a todas as definições. Em todas ou quase todas, aparecem as palavras terra (terreno), água (doce), transbordamento, alagável, lodo, vegetação espontânea, regime periódico. Ensaiemos uma definição no sentido de buscar um ponto de partida mais consistente. Brejo é um terreno mais baixo que as áreas circundantes onde o lençol freático aflora ou onde as águas das chuvas se acumulam ou onde ainda a água oriunda de transbordamento de córregos, rios e canais contíguos fica retida permanente ou periodicamente formando lama e favorecendo o crescimento de plantas aquáticas que tendem a ocultar o espelho d'água.

A geógrafa Dayana Rodrigues Coutinho Vilaça, em seu estudo sobre a Lagoa Maria do Pilar, está passando em revista os conceitos de lagoa e de brejo numa dimensão temporal. Acompanho seu entendimento: uma lagoa pode se transformar naturalmente num brejo com o assoreamento, fator que permite a proliferação de vegetação aquática a ocultar parcial ou totalmente seu espelho d'água. Mas, no caso da Lagoa Maria do Pilar, foram as intervenções antrópicas as responsáveis pelo embrejamento do ecossistema.
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