Felicidade e alegria

Creio que, por mais de uma vez, relatei parte do ou todo o mal que me acomete. Sofro de fibromialgia desde os 17 anos de idade. Hoje, conto com 63 anos de vida, e esta síndrome só foi diagnosticada recentemente, nos anos de 1990. Sempre que procurei os médicos, antes disso, saí dos seus consultórios sem respostas convincentes.

Duas das manifestações da fibromialgia que mais me afetam são a ansiedade e a depressão. Antes do diagnóstico, os médicos tratavam a ansiedade como um elemento isolado que deveria ser medicado com um ansiolítico. Quanto à depressão, ela se acentuou quando terminei a defesa de minha tese, em 2001. Julguei que me sentiria aliviado, mas acabei mergulhando numa profunda depressão por cerca de três meses. Ela agora me acompanha de forma mais branda, mas sob controle de remédio.

Hoje, abatem-me a depressão, a tristeza e o pessimismo. Sei que estes três estados de espírito decorrem de alguma disfunção do meu cérebro, mas fatores externos contribuem muito para acentuá-los. No meu caso, a decepção com o mundo em que vivo me abate profundamente. Desde 1977, travo uma ingente luta contra as injustiças sociais e a destruição da natureza. Como sabem todos que se metem neste campo de batalha, a luta é profundamente desigual. Em mim, agravou a melancolia, a depressão e o pessimismo, com um fator a mais: um grande sentimento de culpa por considerar que posso fazer mais do que faço.

Quando toco neste assunto com as poucas pessoas amigas que tenho, a reação é quase sempre de consolo. “Que é isso? Você é tão novo ainda. Bola pra frente”; “não fica assim, não. Olhe o mundo por um ângulo otimista”; “Deus tem uma missão pra você. Não sofra assim”; “Ore a Deus pedindo ajuda. Com Deus, você superará isso”, dizem-me com frequência. Nenhuma destas palavras funciona comigo.

Os religiosos ligados a alguma igreja ou doutrina constituída, veem, no meu estado, uma oportunidade de me demover do meu agnosticismo e de me converter. Agradeço a todas e todos pela gentileza, mas é tudo inútil. Fica muito difícil para quem foi tão longe, como eu, retornar agora. Outra saída deve ser buscada.

Tenho me dedicado a ouvir pessoas que se movimentam na minha área ou perto dela. Caetano Veloso, Edgar Morin e Clément Rosset são ateus e alegres. Não sei se Umberto Eco é ateu, mas certamente não está ligado a nenhuma igreja, apesar de sua sólida formação cristã católica. No mínimo, é agnóstico. Mas também é alegre. Em Clément Rosset, um otimista, emergiu uma depressão em idade madura. Como é ateu e não aceita a psicanálise, proclama que continua otimista e trata a depressão com medicamento.

Caetano Veloso é alegre de nascença, como afirmam seus parentes. Mas ele não participa tanto dos problemas do mundo como Edgar Morin. Este, além de um suave ateísmo, é pessimista com relação aos rumos da nossa grande civilização. No entanto, não perdeu a alegria nos seus quase 90 anos de idade. Segundo ele, todo ser vivo deve ter o egocentrismo necessário para se proteger. Umberto Eco considera a felicidade permanente uma imbecilidade. Ele diz que todos nós vivemos momentos de felicidade, quase sempre associados ao prazer de todo tipo, não apenas os carnais, mas, notadamente, os intelectuais e os espirituais.

Como professor, vivo entre jovens. No mundo da internet, predomina uma felicidade que me parece artificial. Basta ler os perfis de jovens no Orkut. Todos creem superficialmente em Deus e se sentem absolutamente felizes até que aconteça uma crise sentimental. Então, vem o desmoronamento até que um outro amor apareça.

Religiões, igrejas, médicos, analistas, perfis de Orkut não me consolam. Assumo minha tristeza, depressão e pessimismo, mas decidi livrar-me do sentimento de culpa. Se não faço mais para melhorar este mundo é porque me falecem forças. Não fingirei uma alegria e uma felicidade que não tenho. Quero viver momentos de felicidade e sobreviver à crueldade do mundo.

Lamento, amigas e amigos, mas Edgar Morin e Umberto Eco me ajudam mais a viver que todos os livros sagrados, as igrejas e os remédios.
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