A morte volta a rondar os peixes

Atendendo a pelo menos o pedido de Fernanda, de Aracaju (Olá Soffiati. Cadê os artigos da semana? Fernanda), aí vão os artigos da semana. Pena que eles se referem a questões regionais, fora a crítica de cinema do Edgar, meu pseudônimo. Semana que vem, prometo coisas mais amenas.
Abraços
Soffiati/Edgar



O artigo desta semana resultou de uma denúncia feita por pescadores de que uma usina estava poluindo um canal. A denúncia foi em parte confirmada pela FEEMA, órgão governamental de ambiente do Estado do Rio de Janeiro. Sobre o tema, envio duas reportagens abaixo do artigo. De resto, estes problemas ocorrem em todas as áreas canavieiras do Brasil, ainda mais agora, com a reativação da produção de etanol para o mercado interno e para exportação.

 

A morte volta a rondar os peixes

Quase todos os canais abertos pela Comissão de Saneamento da Baixada Fluminense e pelo Departamento Nacional de Obras e Saneamento, na Planície dos Goitacases, seguiu a linha de maior drenagem das lagoas. Detalhando, as lagoas da planície fluviomarinha se ligavam, e as águas do Rio Paraíba do Sul que caíam nelas passavam de uma a outra pelos pontos mais baixos. Foi seguindo estes pontos que os dois órgãos do governo federal abriram os canais que hoje formam a maior rede de drenagem do mundo. Os nomes de vários canais ainda recordam as lagoas que eles drenaram total ou parcialmente.

A intenção de tais obras não foi facilitar a comunicação das lagoas entre si e favorecer a atividade pesqueira, mas beneficiar o cultivo de cana e a criação de gado. Com o tempo, entretanto, os canais foram passando por um processo que denomino de renativização e se transformando em ecossistemas. Flora e fauna foram retornando e os canais deixaram de ser simplesmente aquedutos, conquanto os ruralistas e usineiros continuem a considerá-los meros condutores de água.

O tratamento dispensado aos canais é agressivo e só leva em conta os interesses da economia dominante na Baixada dos Goitacases. Quando chove muito, eles devem ser atacados por dragas vorazes para escoar o excesso de água. Quando chove pouco, eles devem servir à irrigação. No período da moagem de cana, eles servem de esgoto para os efluentes resultantes da fabricação de açúcar e de álcool. Sempre sob o pretexto de que foram rasgados para atender a ruralistas e usineiros, o caráter de ecossistema dos canais e de ambiente para a atividade pesqueira é ignorado.

Mas como impedir que a vida volte a estes canais? Como impedir que a vegetação tome conta deles e os peixes voltem a nadar em suas águas. Pelo esforço que a natureza faz em renativizá-los, os canais se transformaram em pontos de conflito latente entre usineiros e ruralistas, de um lado, e pescadores, ecólogos e ecologistas de outro.

Este conflito vem à tona em certos momentos. Recentemente, houve uma mortandade de peixes no canal de Cambaíba que os pescadores atribuíram a despejo de efluentes pela Usina São José, hoje administrada pela Coagro. Seu presidente se apressou em responsabilizar a dragagem do canal, o que não deixa de ser uma confissão de culpa. Afinal, os representantes do setor rural sustentam que a limpeza e a dragagem de canais não acarretam impactos ambientais. E, assim, todos seguem em frente com a prática predatória. A Secretaria Estadual de Agricultura, a Superintendência Estadual de Rios e Lagoas, as prefeituras de Campos, São João da Barra e Quissamã e até mesmo particulares usam dragas como armas contra o ambiente e a pesca.

A análise feita pela Fundação Estadual de Engenharia do Meio ambiente sobre a mortandade de peixes no Canal de Cambaíba concluiu que ela foi provocada por vazamentos de efluentes da Usina São José combinados com a suspensão de materiais sedimentados no fundo do canal pela dragagem. Curioso que, nos anos 80, a Feema era rigorosa em licenciar e punir as dragagens. Hoje, está tudo liberado.

De longa data, sustento o seguinte:

1- Os canais foram abertos por máquinas, causando profundos impactos ao ambiente, mas acabaram se renativizando e se transformando em ecossistemas. Portanto, devem ser tratados como tal, e não vistos apenas como condutores de água.

2- Qualquer iniciativa de dragagem, redragagem e limpeza superficial dos canais deve ser precedida de licenciamento detalhado, mesmo que dispensando estudos prévios de impacto ambiental. Estas operações devem ser acompanhadas de perto pelo órgão licenciador, que não deve ser municipal, pois a rede de canais é intermunicipal.

3- A limpeza deve ser feita manualmente e no período de entressafra, de preferência, para aproveitar o trabalhador desempregado.

4- Não sendo possível realizar as operações manualmente, deve-se barrar o trecho do canal a ser limpo, dragado ou redragado acima e abaixo, a fim de impedir que o material suspenso se espalhe por grandes distâncias, reduza o oxigênio dissolvido e provoque mortandade de peixes. Assim, de trecho em trecho, chega-se ao final com o impacto reduzido. No entanto, tais operações continuam sendo feitas de forma bárbara e imediatista, só visando os interesses econômicos dominantes.

5- Se os efeitos do aquecimento global se manifestarem cada vez com mais intensidade, os canais vão requerer um cuidado especial para a economia.

6- Por duas Resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente, aprovadas no início dos anos 80, alguém nos deve um estudo de impacto ambiental acerca da imensa rede de canais da Baixada dos Goitacases. Esse alguém ou é o governo federal ou o é governo estadual.

Pescadores acusam usina de poluir canal

ANTONIO LEUDO

SEM PEIXES - Pescadores de colônias da Baixada se dizem prejudicados com poluição de canal em Goitacazes

Pescadores de colônias da Baixada Campista e do Farol de São Thomé acusam a Coagro, em Goitacazes, de poluir o Canal Cambaíba, que, por sua vez, estaria poluindo outros canais e prejudicando a vida dos ribeirinhos, que vivem da pesca. O problema teria começado há duas semanas e uma grande quantidade de peixes estaria morrendo. A usina informou que nenhum poluente foi despejado.

DA REDAÇÃO

Pescadores da Baixada Campista e do Farol de São Thomé, estão reclamando de um problema ambiental no Canal Cambaíba, que poderia estar sendo causado pela Cooperativa Agroindustrial do Rio de Janeiro (Coagro), em Goytacazes. Eles alegam que a usina estaria despejando material poluente no canal, que estaria afetando outros canais da região e matando uma grande quantidade de peixes, principal recurso da população ribeirinha.

Segundo o presidente da Associação dos Pescadores Artesanais do Rio Paraíba do Sul e da Lagoa, Valdemir Alves, o incidente começou há cerca de duas semanas, quando um líquido escuro estaria sendo despejado no canal. "O material que eles estão jogando aqui, é levado pelo canal e deságua no Canal Andreza, no qual muitas pessoas pescam. Está morrendo uma grande quantidade de peixes no canal, e já não há mais nenhum para a gente pescar. Ficamos duas semanas aqui para flagrar o despejo, mas só conseguimos ver ontem", informou.

O presidente da Colônia Z-19 do Farol de São Thomé, Rodolfo José Ribeiro, informa que a poluição já chegou a área de atuação da sua colônia. "A água poluída já chegou ao terminal pesqueiro do Farol. Os peixes já morreram todos, não há mais nada para matar", reclamou.

Segundo o presidente da Coagro, Frederico Paes, responsável pela Usina São José, o problema está sendo verificado desde a semana passada e a usina espera agora uma posição da Feema, que fará uma contraprova do teste realizado. "Nós realizamos nosso próprio teste e não verificamos nenhum material poluente que esteja sendo lançado no canal. No entanto, aguardamos os testes da Feema, que recolheu material para análise e apresentará uma nova posição sobre o caso", informou Frederico, que ainda disse que a cor escura do canal decorre da matéria orgânica do fundo dos canais que foram recentemente limpos por máquinas após as enchentes do início do ano.

Feema confirma vazamento em canal

Maurício Xexéo

Uma variedade de fatores causou a mortandade de peixes no Canal de Andreza. Isso foi o que constatou a análise da água feita pela Fundação Estadual de Engenharia e Meio Ambiente (Feema), depois da denúncia feita por pescadores de que a Usina São José estaria lançando efluentes poluidores no canal.

De acordo com a conclusão da Feema a mortandade de peixes é o resultado de uma conjunção de fatores que incluem a contaminação do canal por água de multijato, usado na etapa de xarope e do cozimento de açúcar, por vazamento de vinhoto e a dragagem que revolveu o fundo do canal.

Segundo o chefe da Agência Regional da Feema, René Justen, a Fundação lavrou um auto de constatação devido a contaminação do canal e remeteu para a Comissão Estadual de Controle Ambiental (Ceca) para lavrar a multa. René disse que a água do multijato estava quase no padrão estabelecido pelas normas legais e que não houve um lançamento de vinhoto, mas um vazamento.

A união desses fatores, explicou o chefe da agência regional, ocasionou uma alta na Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO), ou seja, a quantidade de oxigênio livre dissolvido na água usado pelos peixes para as trocas gasosas diminuiu, causando a morte em massa dos peixes por asfixia.

O presidente da Cooperativa Agropecuária do Rio de Janeiro (Coagro), que administra a Usina São José, Frederico Paes, disse que se há algum problema está em fontes de contaminação acima do ponto onde o Canal de Cambaíba desagua no Andreza, uma vez que já havia mortandade de peixes antes que a Coagro começasse a moer. O que pode estar confundindo os pescadores, disse Frederico, é que o lodo revolvido tem cor e cheiro que podem se parecer com o vinhoto. Segundo ele, entrou em contato com a Feema repassando os dados e foram coletadas amostras de água acima da Usina São José.

O ecologista Aristides Soffiati disse que essa situação só confirma o que ele vem dizendo a respeito da dragagem e da necessidade de se fazer um estudo prévio de impacto ambiental sobre os canais da Baixada Campista, ainda que os cursos de água tenham sido construídos.

Segundo ele na visão ecológica é pouco importante se o ambiente é natural ou construído uma vez que tanto a fauna e a flora se estabelecem formando uma comunidade interligada com nichos ecológicos definidos. Assim sendo os canais da baixada têm tanta importância como os mananciais naturais que nascem no Imbé, por exemplo.

Uma das propostas para a limpeza dos canais feitas por Aristides é usar a draga por setores. Ou seja, a seção a ser limpa é bloqueada por batoques de madeira impedindo que o lodo revolvido corra com o fluxo da água, contaminado o curso do canal.

* Arthur Soffiati é professor da Universidade Federal Fluminense, Doutor em História Ambiental pela UFRJ e colunista/colaborador do Mania de Saúde. 

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