Atenção, meninas
1- Com todo o estardalhaço do movimento feminista, vocês não conseguiram alcançar o sucesso de uma modesta fêmea de dragão-de-Komodo. Na sua humildade e discrição, ela conseguiu abolir a figura do homem para tudo. Sigam o exemplo dela e nos tornem obsoletos em suas vidas. Mas sejam gentis com este animal inferior denominado homem.
Folha de São Paulo, São Paulo, 24/01/2007
Fêmea de dragão-de-komodo tem cinco filhotes sem ter sido fecundada
Da Efe, em Londres
Uma fêmea de dragão-de-komodo, o maior lagarto do mundo, teve cinco filhotes sem ter sido fecundada por um macho, acontecimento que deu uma grande dose de esperança à reprodução em cativeiro de espécies em risco de extinção.
Dave Thompson/AP |
Dragão-de-komodo, a maior espécie de lagarto de todo o mundo, surpreende biólogos |
Flora , a fêmea de dragão-de-komodo que vive no zoológico de Chester, no norte da Inglaterra, colocou em maio 11 ovos sem nunca ter cruzado com um macho de sua espécie.
Cinco dos ovos se transformaram em dragõezinhos com medidas entre 40 cm e 45 cm de comprimento e um peso que oscila entre 100 g e 125 g. Trata-se do segundo caso documentado de reprodução assexuada em dragão-de-komodo. O primeiro ocorreu em abril no zôo de Londres, quando Sungai colocou ovos dois anos e meio após seu último contato com um macho.
"Flora ignora a excitação que seu parto causou, enquanto nós estamos encantados em anunciar que já é mãe e pai ao mesmo tempo", afirmou o encarregado dos vertebrados e invertebrados do zôo de Chester, Kevin Buley.
Embora haja outros dois filhotes que ainda não saíram da casca de ovo, os primeiros cinco dragões – de pele preta e amarela – nasceram na terça-feira da semana passada, após oito meses de gestação, e se alimentam de grilos e gafanhotos.
"Quando o primeiro dos dragões colocou a cabeça para fora, não sabíamos se preparávamos para Flora, de oito anos, uma xícara de chá ou dávamos charutos para ela", brincou Buley. Nas próximas semanas, os cinco filhotes do zôo britânico serão levados a um novo recinto para que os visitantes possam vê-los.
2- A segunda matéria versa sobre a inteligência do macaco-prego. Isto vale para meninas e meninos. Nós vivemos tão fascinados com nosso umbigo que não reparamos os outros animais. Enquanto isto, eles fazem coisas de sarapantar. Até pouco tempo, só nós fabricávamos ferramentas. Depois, descobriram que os macacos japoneses também eram capazes de produzir uma protocultura. Os gorilas vieram depois. Até sítios arqueológicos deles foram encontrados na África. Sobre o chimpanzé, não há dúvida de que seja uma espécie filósofa dos primatas não-humanos. Mas ninguém prestou atenção no saliente do macaco-prego, conhecido pelos tupis com o nome de itapuã, ou seja, pedra dura. Sabem por que? Porque ele sofre de priapismo: seu pênis está freqüentemente ereto e ele não vive se masturbando. Eis por que seu nome científico é Cebus libininosus.
Abraços por hoje.
Arthur Soffiati.
Folha de São Paulo, São Paulo, 22/01/2007
Estudos mostram "tradições" culturais do macaco-prego
CLAUDIO ANGELO
Editor de Ciência da Folha de S.Paulo
A italiana Elisabetta Visalberghi, 54, se lembra bem da primeira vez em que viu um macaco-prego usando ferramentas para quebrar frutos secos. Foi há 27 anos, no zoológico de Roma. "Eu sabia que eles eram especiais quando os vi pela primeira vez", conta.
Visalberghi passou as duas décadas seguintes tentando convencer seus pares de que o uso de ferramentas pelos macaquinhos sul-americanos era intencional, não mera coincidência nem um desvio de personalidade resultante das condições de cativeiro.
Tiago Falótico |
Macaco-prego (Cebus libidinosus) se prepara para golpear coquinho com pedra em Gilbués |
A hipótese soava absurda, pois esse tipo de comportamento parecia ser exclusividade de seres humanos e seus parentes mais próximos, como os chimpanzés. Nos 30 milhões de anos de evolução que separam as linhagens do macaco-prego (Cebus libidinosus) e dos grandes macacos africanos (incluindo nossa espécie), nenhum outro macaco jamais foi visto usando ferramentas.
A vingança veio a cavalo. Em um estudo que será publicado na próxima edição do periódico científico "American Journal of Physical Anthropology", a pesquisadora italiana e colegas do Brasil e dos EUA demonstram que não só o uso de ferramentas é comum entre macacos-pregos selvagens como esses animais têm "tradições culturais" distintas.
E mais: os bichos são capazes de transportar as pedras que usam como "martelo" por vários metros até as rochas e troncos usados como "bigorna". O desgaste pelo uso acaba produzindo traços típicos nas pedras, criando locais na mata próprios para a atividade de quebrar coquinhos.
As observações foram feitas em um bando de macacos que habita uma fazenda em Gilbués, zona de transição entre cerrado e caatinga, no Piauí, apenas três anos depois de o uso de ferramentas entre macacos selvagens ter sido observado pela primeira vez.
"Isso contrasta com o que foi relatado para vários grupos de macacos-pregos selvagens na América do Sul", diz a italiana.
Durante anos, observações de macacos na mata atlântica e na Amazônia simplesmente falharam em detectar um padrão de uso de ferramentas. E não foi por falta de coquinhos, abundantes na floresta.
"Até alguns anos atrás as pessoas ainda se perguntavam se o macaco-prego realmente fazia isso. É porque não foram perguntar a ninguém no interior do Brasil", brinca o etólogo (especialista em comportamento animal) Eduardo Ottoni, da USP, co-autor do estudo.
Ottoni e seus alunos já observaram macacos usando ferramentas em outros lugares do Piauí. Em Goiás, encontraram o que eles chamam de "sítios de quebra", os locais onde os bichos se juntam para se banquetearem com coquinhos, jatobás e outros frutos de casca dura.
Kit complexo
Em um outro estudo, cujos resultados ainda não têm previsão de publicação, Massimo Mannu, aluno de Ottoni, observou que um bando de macacos-pregos da Serra da Capivara, também no Piauí, têm um "kit de ferramentas" diversificado.
Além de martelos e bigornas, os animais foram vistos usando varetas – para desentocar lagartos – e pedras para escavar tubérculos. Uso combinado de ferramentas é raro até mesmo em chimpanzés, considerados os "gênios" do reino animal.
Ottoni está começando a preparar um estudo dos sítios para estabelecer a primeira "etnografia" dos miquinhos. Uma coisa parece certa: há algo no ambiente das savanas que estimula os animais a modificá-lo intencionalmente, usando instrumentos para ter acesso a alimentos indisponíveis a outros bichos. Mas, se escassez de comida não é a resposta, o que é?
O pesquisador paulista e sua colega italiana apostam na terrestrialidade. Na caatinga e no cerrado, os macacos passam mais tempo no chão do que na floresta. "No chão há coquinhos e pedras", resume Ottoni.
Repeteco evolutivo
A hipótese é interessante porque há um outro animal que (acredita-se) evoluiu na savana e também passou a usar ferramentas: o Homo sapiens.
"Esta história lembra a dos australopitecinos [ancestrais humanos]", diz Ottoni. "Quando eles começam a usar ferramentas, liberam as mãos, andam eretos e aumentam o consumo de carne, vital para o desenvolvimento do cérebro."
É claro, ninguém entenda com isso que os macacos-pregos estão na rota evolutiva para originar uma espécie inteligente. Mas, segundo Ottoni, talvez eles possam servir de modelo vivo. "Há tantas analogias nessa história que o paleoantropólogo, em vez de olhar para um fenômeno único, que aconteceu há 6 milhões de anos, pode olhar para outras coisas."