Como já escrevi várias vezes, prestei serviço militar em 1967. Em 1968, participei da Passeata dos Cem Mil sem muita consciência do que fazia. Passei este ano trabalhando, estudando, acompanhando os acontecimentos no Brasil e ouvindo os Beattles. Eu estava longe de alcançar algum entendimento do que ocorria e da repercussão dos movimentos de 1968. Só mesmo uma década depois comecei a perceber os efeitos deles sobre mim.
Foi militando no movimento ecologista que comecei a me interessar mais pelo icônico ano de 1968. Depois de várias leituras sobre os movimentos de 1968, notei que eles deram origem a três linhas maiores. Eu estava perto da mais conservadora. No Brasil, em resistência ao governo autoritário militar, o movimento arregimentou os marxistas e os socialistas de diversos matizes e de distintas idades. Ele se expressou de forma também autoritária e intolerante. Após o Ato Institucional nº 5, a esquerda, que se manifestava abertamente nas ruas, partiu para a clandestinidade, nas guerrilhas urbana e rural. Quem poderia imaginar que revolucionários de esquerda, como Dilma Roussef e José Genoino, participaram da luta armada e caíram no conservadorismo de hoje? Particularmente no Brasil, 1968 expressou-se por uma vertente antiga e conservadora.
A segunda vertente expressou-se com bastante vigor nos Estados Unidos. Foi o movimento da contracultura, que, lá, já tinha raízes desde os anos de 1950, com a geração beat. Ela adquiria, agora, notável força com os hippies e com o rock. O festival de Woodstock parece ter sido a sua culminância e a Califórnia seu centro de irradiação. A contracultura tinha uma intenção por demais imediata: virar as costas para a economia de mercado e para a guerra. O lema "paz e amor" continha um ingrediente político, mas faltava-lhe algo mais: um projeto político. Assim, como bem retrata o desenhista Angeli com os personagens Wood e Stock, o movimento foi primeiramente consumido pela sociedade da qual queria fugir. Depois foi triturado por ela. Hoje, tornou-se velho.
A terceira linha explodiu estrondosamente na França, no mês de maio. Num primeiro momento, os revolucionários sabiam o que não queriam, mas não tinham muita clareza do que queriam. De todas vertentes, foi a mais estudada. Aos poucos, ficou claro que, desse caldeirão, nasceria uma ampla e generosa proposta política. Não mais se tratava de apenas criticar o capitalismo, mas sim também o socialismo então existente, como face da outra moeda da civilização industrial. Dela nasceu o ecologismo, efetuando uma crítica radical ao capitalismo e ao socialismo, por um lado, e propondo uma nova civilização, compatível com os limites do planeta, por outro.
No final da década de 1960, uma plêiade de autores ecologistas começou a lançar seus livros. Enquanto os marxistas e os hippies estavam voltados apenas para o ser humano, o ecologismo chamava a atenção para a biodiversidade. Autores como René Dumont (A Utopia ou a Morte), Rudolf Bahro (A Alternativa), Jean-Pierre Dupuy (Introdução à Crítica da Ecologia Política), Michel Bosquet (Ecologia e Política), Laura Conti (O que a Ecologia?), Dominique Simmonet (O Ecoologismo), Edgar Morin (O enigma do Homem) e outros mais não apenas marcaram profundamente minha vida, como, acima de tudo, levaram-me ao campo político e filosófico, em busca de uma nova epistemologia, de uma nova ética, de uma nova práxis, de uma nova concepção de mundo.
O capitalismo e o socialismo também tentaram cooptar o ecologismo. O resultado está sendo um retrocesso representado pelo desenvolvimento sustentável e pela teoria da justiça ambiental. Não que taticamente estas duas correntes devam ser rejeitadas. É que suas estratégias não atacam o problema de forma radical. O agravamento da crise ambiental global, sobretudo com o aquecimento climático, está clamando pelo retorno de uma interpretação e de uma ação radicais. E o ecologismo tem grande oportunidade de mostrar sua razão e sua força.