Caindo de pára-quedas

Uma antiga marchinha de carnaval dizia: "Maria Candelária é alta funcionária, pulou de pára-quedas, caiu na letra o, o, o, o, o". A letra se referia ao funcionário público que não trabalhava. Não direi que o Ministro das Ações de Longo Prazo, Roberto Mangabeira Unger, não trabalha. Segundo ele, não deveria existir noite para que pudesse trabalhar mais. No entanto, pula bem de pára-quedas. Pulou com um e caiu na equipe de Lula. Recentemente, pulou com outro e caiu na Amazônia, acompanhado de 38 assessores a fim de apresentar seus projetos para aquele grande bioma.

Sua atitude foi a de quem estava descobrindo a região norte. O deputado federal Fernando Gabeira comentou, com propriedade, que Mangabeira Unger levou para a Amazônia projetos que pareciam ter nascido numa conversa de botequim. Uma delas é a transposição de águas de rios amazônicos para o nordeste. Segundo ele, é um absurdo que uma região tão seca exista ao lado de uma tão úmida sem que uma não possa ajudar a outra. Depois, ele esclareceu que sua declaração foi mal entendida, mas não convenceu.

De fato, o ministro tem razão. A natureza está errada. Muita água em certos pontos do planeta e escassez em outros. É um absurdo a existência do deserto do Saara com o rio Nilo numa de suas extremidades. É um absurdo o deserto de Kalahari no meio dos rios Orange, Okavango e Limpopo. É um absurdo o deserto da Arábia ao lado dos rios Tigre e Eufrates. É um absurdo o deserto de Gobi no meio dos rios Huang-Ho, Amur e Tarin, além do lago Baical. Não basta apenas a equivocada transposição do São Francisco para atender às dificuldades dos grandes agronegociantes da Caatinga. Precisamos também dos rios amazônicos.

Para o ministro, as florestas perdidas na Amazônia não devem ser reconstituídas. As terras que ficaram descobertas com a remoção das matas devem ser ocupadas por pequenos produtores rurais. Agora, então, com o superdesmatamento anunciado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), muita terra estará disponível para os planos do ministro.

No seu entendimento, os índios da Amazônia estão perdendo oportunidades econômicas por só falarem a língua nativa. Além dela e do português, é indispensável que dominem também o inglês, o francês, o espanhol, o alemão, o italiano e – por que não? – o chinês. Afinal, a China assoma como a nova potência mundial.

Quando articulista da Folha de São Paulo, não faz muito tempo, Mangabeira Unger escreveu um artigo revelando que só descobriu a existência da natureza tardiamente. Enfurnado na Universidade de Harvard desde o início dos anos de 1970, a ponto de adquirir sotaque inglês dos Estados Unidos, o ministro demonstra agora, com seu "Projeto Amazônia", um profundo desconhecimento da realidade da região norte e completa desconexão com o contexto brasileiro.

A par de descobrir a existência da natureza, ele, que só conhecia o mundo artificial, apresenta-se como reformador da natureza, como artificializador do natural. A solução para a aridez da Caatinga está nela própria. É preciso reconhecer, antes de tudo, a realidade ambiental nativa. Partimos da premissa de que a Caatinga é semi-árida, traço que se acentua cada vez mais por uma ocupação antiecológica da região. Os desmatamentos seculares vêm aumentando sua aridez progressivamente. A solução mais correta é um "Projeto Caatinga", que promova o reflorestamento, que construa sistemas de reservação de água, que faça os rios fluírem novamente, que distribua terras à agricultura familiar, que aproveite e aperfeiçoe as soluções técnicas e tecnológicas inventadas pelo nordestino pobre.

O mesmo pode-se dizer da Amazônia, acompanhando as propostas de ecodesenvolvimento formuladas por Ignacy Sachs. Não basta só reduzir as taxas de desmatamento. É preciso zerá-lo. A redução das taxas diminui a derrubada, mas não salva a floresta. Se mantivermos uma taxa mínima de desmatamento por muito tempo, a floresta acaba. Zerada a supressão, premente é a restauração e a revitalização da floresta. Qualquer tipo de agropecuária praticada nas terras expostas aumentará a emissão de gases do efeito estufa. Não esperamos que a Amazônia readquira a fisionomia que apresentava em 1500. Todavia, cumpre frear a voracidade da economia de mercado, que avança rapidamente, como reconheceu o próprio ministro desenvolvimentista da agricultura Reinhold Stephanes.

O zoneamento ecológico-econômico é, de fato, urgente. É possível promover o ecodesenvolvimento da Amazônia respeitando suas singularidades ambientais. Para os índios, mais importante é defender suas culturas e suas línguas do que lhes ensinar o inglês norte-americano, que Mangabeira Unger fala tão bem.

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