No que se refere ao ecossistema manguezal, o Código Florestal também representa um retrocesso, embora dedique a ele muito mais palavras que o Código Florestal anterior, de 1965. Neste segundo, o manguezal aparece apenas no Art. 2º como Área de Preservação Permanente. A Resolução nº. 303, de 20 de março de 2002, do Conselho Nacional do Meio Ambiente, detalhou o manguezal como Área de Preservação Permanente em toda a sua extensão. Bastaram poucas palavras para empreender a defesa deste ecossistema tão vital à vida aquática doce, salgada e salobra, bem como à vida terrestre e alada.
O novo Código Florestal entra mais demoradamente na lama de um manguezal poluído e se suja todo. A ele, é dedicado o capítulo III-A, tendo como título "Do uso ecologicamente sustentável dos apicuns e salgados". Para quem não é especialista, o manguezal, em sua máxima expressão, compõe-se de três áreas: o bosque propriamente dito, o lavado e o apicum. A primeira é constituída pelo conjunto das plantas - exclusivas ou não - do manguezal. A segunda pelos caminhos por onde as marés avançam e recuam, tendo ou não vegetação. A terceira pela parte mais salgada do manguezal, onde as espécies vegetais exclusivas podem não ocorrer. No entanto, como sustenta Gilberto Cintrón e todo bom ecólogo, estas três regiões são fundamentais para a existência íntegra do manguezal.
O novo Código Florestal libera parte do apicum para a criação de crustáceos, sobretudo de espécies exóticas de camarão, e para salinas. Na Amazônia, os apicuns podem ser explorados economicamente em até 10% da área total do manguezal. Nos demais Estados do Brasil, permite-se o uso de 35%, excluídas as ocupações já consolidadas. O pleito dos carcinicultores, levado ao Congresso pela bancada nordestina, foi atendido.
Na verdade, o manguezal nunca foi respeitado, com ou sem lei a protegê-lo. A discussão em torno de sua preservação, sempre se limitou à vegetação, nunca à fauna. Pelo menos, a condição de Área de Preservação Permanente fornecia uma arma com munição para as lutas em sua defesa. O novo Código Florestal entrega aos ativistas não apenas uma arma sem balas, mas uma arma de brinquedo, para que protejam o manguezal.
É inócuo a Constituição da República determinar, em seu Artigo 225, §4º, que a Zona Costeira é patrimônio nacional. É inútil o novo Código estabelecer que as atividades permitidas no âmbito dos manguezais devem ser precedidas de licenciamento pelo órgão governamental de ambiente de cada Estado, cientificando-se o Ibama de tal licença. Quando flagramos o Instituto Estadual do Ambiente do Rio de Janeiro adulterando o bosque do manguezal do Rio Paraíba do Sul com obras de dragagem, toda a confiança nas autoridades governamentais se esfuma. Não podemos também contar com a Marinha, pois ela vive se exercitando para uma guerra imaginária contra os inimigos do Brasil.
De nada adianta, ainda, o novo Código prescrever a "salvaguarda da absoluta integridade dos manguezais arbustivos e dos processos ecológicos essenciais a eles associados, bem como da sua produtividade biológica e condição de berçário de recursos pesqueiros", se não se considera o apicum como parte integrante do ecossistema.
Para proteger o manguezal, bastaria um dispositivo deixando claro que o manguezal é Área de Preservação Permanente em toda a sua extensão, compreendendo esta o bosque o lavado e o apicum.