A verdadeira razão da queda de Wolfowitz

Nestes dias, desde os sangrentos campos de batalhas no Iraque até as pomposas salas da administração do Banco Mundial, o "Novo século americano" do imperialismo está em profunda perturbação.

O antigo vice-chefe do Pentágono e agora [1] presidente do Banco Mundial, Paul Wolfowitz, príncipe dos neocons e arquitecto da invasão do Iraque, está enterrado num escândalo. O homem que começou o seu mandato dois anos atrás como chefe da maior instituição financeira do mundo fazendo apelos para o combate à "corrupção global" é agora acusado de vender favores a uma amiga no banco.

Não vamos desperdiçar tinta acerca desta questão de décima ordem. Deixaremos isto para os arautos da direita nos mass media que, a cavalgar o escândalo, transformaram o comentário político objectivo num amontoado de asneiras que torna o caso de Wolfowitz um excitante conto de sexo, mentiras e subornos.

A história real é de como a administração Bush tentou moldar o Banco Mundial como ferramenta da sua agenda guerreira, e os limites da sua capacidade para forçar o resto do mundo a inclinar-se à sua vontade.

Quando Wolfowitz foi nomeado por George W. Bush dois anos atrás presidente do Banco Mundial, a revista européia The Economist, muito conservadora, editorializou que "A sua nomeação diz ao mundo que o Sr. Bush quer capturar o Banco Mundial e transformá-lo numa arma da política externa americana". Deveria ser acrescentado, entretanto, que The Economist não teria problemas se o Banco Mundial fosse uma arma da política imperialista européia.

A ajuda como arma política

Wolfowitz, logo a seguir a Bush, tem sido uma das figuras mais visíveis e mais odiadas em todo o mundo pelo seu papel no Iraque, pelas mentiras que justificaram a invasão, pelas políticas da tortura da ocupação, pela arrogância e pela brutalidade como conduziu a guerra.

E agora, à testa do Banco Mundial, Wolfowitz impôs também ali uma descarada agenda pró-EUA. Uma matéria na revista New Yorker de 9 de Abril, de John Cassidy, intitulada "The Next Crusade", cita numerosos exemplos para confirmar esta visão.

Exemplo: em Julho de 2005, a república do Uzbequistão, na Ásia Central, ordenou aos EUA que removessem suas tropas e aviões de uma base uzbeque que tinham estado a utilizar como apoio à guerra contra o Afeganistão. Dois meses mais tarde, Wolfowitz cortou um pacote de ajudou ao país destinado sobretudo ao abastecimento de água em regiões rural e projectos de saúde. O corte dos tostões foi sugerido pelo Tajdiquistão vizinho, um regime brutalmente repressivo mas pró-EUA que obtém milhões em empréstimos do Banco Mundial.

Wolfowitz utilizou selectivamente a acusação de "corrupção" para negar empréstimos a países que tentavam exercer alguma independência em relação à influência americana, como o Congo-Brazzaville e o Chad, pobres países africanos com abundância de recursos naturais. No ano passado o Banco Mundial negou ajudas ao desenvolvimento a ambos os países.

Com o Iraque, contudo, Wolfowitz foi mais activo ao colocar o Banco Mundial ao serviço do Pentágono.

Primeiro Wolfowitz fez uma série de nomeações de alto nível no banco com amigos políticos de governos de extrema-direita que foram alguns dos mais fortes apoiadores da política americana no Iraque, tais como El Salvador, Espanha e Jordânia. "Ele utilizou o seu mandato para premiar aqueles governos e indivíduos que eram particularmente prestativos para com os EUA na guerra do Iraque", afirma Steven Clemmens da New América Foundation.

O Banco Mundial e o Big Oil

A seguir, Wolfowitz montou um escritório permanente do Banco Mundial em Bagdad. Conforme o Bank Information Center, uma organização não governamental liberal que monitora as políticas da banca: "A instituição está a aconselhar o Fundo Monetário Internacional (FMI) no desenvolvimento da estratégia do sector petrolífero. Mais amplamente, o Banco está a aconselhar o Iraque a atrair investimento directo estrangeiro através [da aprovação] rápida de leis amistosas para com o investidor e também a aconselhar a reforma [privatização] de empresas de propriedade estatal. Além disso, o Banco está a participar em reuniões com o FMI, o ministro das Finanças do Iraque, e o International Tax and Investment Center (ITIC) acerca do sector petrolífero iraquiano. O ITIC é um grupo de lobby que integrado pela BP; Chevron, ENI, ExxonMobil, Shell e Total".

"A aparente determinação de Wolfowitz em utilizar o Banco Mundial para novas e questionáveis objectivos militares americanos no Médio Oriente é uma … violação dos artigos da sua constituição, e um imprudente desperdício dos recursos dos doadores", afirmou Bea Edwards, director do programa internacional do Government Accountability Project, um grupo não lucrativo de acompanhamento do interesse público que denuncia situações anômalas.

"De facto, o Banco está proibido de operar num conflito como este", acrescentou Edwards. "Mesmo nos mais simples termos financeiros, não há sistema bancário a funcionar ali, o governo não controla o seu território".

O Banco Mundial e o FMI estão dependentes do Parlamento iraquiano para estabelecer um Conselho Federal do Petróleo e do Gás, recrutado entre executivos do Big Oil. "A nova lei concederia ao Conselho virtualmente todo o poder para desenvolver políticas e planos quanto a campos de petróleo não desenvolvidos, além de rever e mudar todos os contratos de exploração e produção", relatou Juan Gonzalez no Daily News de 21 de Fevereiro. A Iraqi National Oil Co. Ficaria indefesa em relação a estas companhias estrangeiras.

"Uma vez que a maior parte dos 73 campos de petróleo com reservas provadas ainda têm de ser desenvolvidos, o novo conselho instantaneamente tornar-se-ia um poderoso centro mundial de energia", escreveu Gonzalez. Contratos com companhias internacionais provavelmente serão semelhantes aos controversos acordos de partilha de produção, os quais transferem a fatia de leão dos lucros petrolíferos para investidores externos.

O Banco Mundial foi formado em 1945 com a intenção específica de projectar o poder estadonidense na era do pós-guerra. O presidente do banco é sempre dos EUA, a sede do banco é em Washington e os EUA tem um direito de veto permanente. Ele está debaixo de fogo em muitos países do mundo devido às severas medidas de austeridade que impõe aos países em desenvolvimento, inclusive exigências de privatização de indústrias e de saqueio de recursos nacionais e indústrias nativas em proveito do capital estrangeiro.

Mas no passado o Banco Mundial também foi um esforço coligado entre o capital dos EUA, europeu e japonês, com fundos significativos do banco proporcionados por fontes não americanas.

Contudo, hoje a administração Bush e os mestres no big business já não estão interessados em coligações. Eles exigem o controle total. Em parte alguma isto é tão bem revelado quanto no infame documento escrito em co-autoria pelo próprio Wolfowitz sete anos atrás intitulado "Rebuilding American's Defenses". Este manifesto do chamado "Projecto para o novo século americano" (Project for the New American Century) foi chamado o "Mein Kampf" do movimento neocon. Ele projecta um mundo de dominação global americana, apelando a maciços aumentos nos gastos militares a fim de cobrir o planeta com bases do Pentágono, a um estado de prontidão militar quase permanente e a uma mudança de regime sempre que os interesses políticos e econômicos do capitalismo americano sejam ameaçados.

Mas esta utopia reaccionária está a entrar em colapso no terreno do Iraque, onde a resistência popular à agressão americana continua a crescer. E se bem que preferíssemos ver Wolfowitz acusado de crimes de guerra ao invés de umas contravenções ordinárias por tráfico de influência, o facto é que os seus infortúnios no Banco Mundial são uma indicação adicional de que a administração Bush está na defensiva e é incapaz de impor a sua vontade sobre um mundo relutante.
[1] Este artigo foi escrito antes de ser anunciada a demissão de Wolfowitz, no próximo dia 30 de Junho. No entanto, a sua análise continua válida.

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