Os perigos da guinada para os biocombustíveis

A euforia com que muitos saúdam a migração da sociedade para os biocombustíveis como panacéia para a exaustão das jazidas de petróleo, gás natural e carvão mineral merece uma avaliação criteriosa. Afora a questão da exaustão dessas fontes de energia, prevista para os próximos 40 anos, está posta a questão do aquecimento global, causado pelas emissões de gás carbônico, fruto da queima de combustíveis fósseis, que imporia ao planeta e à vida na Terra alterações climáticas cujos efeitos deletérios ainda não são claramente conhecidos e divulgados. Em resumo, a pergunta que cabe é: o que acabaria primeiro, os combustíveis fósseis ou a vida na Terra, caso esse modelo energético persistisse?

Em face dessas questões preocupantes surge como solução o uso de combustíveis de origem vegetal – os chamados biocombustíveis. No século passado, o Brasil surgiu como pioneiro ao implantar o Pró-álcool como opção à alta do preço do petróleo, à época importado em larga escala, conseqüência dos conflitos no Oriente Médio

Em nossos dias, além da produção de álcool combustível para substituir a gasolina, surgem em diversos países, iniciativas para a produção de óleos vegetais a serem adicionados ao óleo diesel ou mesmo para substituí-lo integralmente no médio prazo.

Preocupa este quadro em razão de transformação de áreas agrícolas destinadas à produção de alimentos em áreas produtoras de combustíveis para movimentar veículos de passeio ou de carga. Toda a superfície agrícola da União Européia seria suficiente apenas para cobrir 30% das necessidades atuais - não as futuras, previsivelmente maiores - de biocombustíveis. Nos Estados Unidos, para satisfazer a demanda atual por combustíveis fósseis, seria preciso destinar 121% de toda a superfície agrícola daquele país.

Como resultado disso, a oferta de agrocombustíveis terá que proceder necessariamente do Sul, da periferia pobre e neocolonial do capitalismo. A matemática não mente: nem os Estados Unidos nem a União Européia têm terras disponíveis para manter, ao mesmo tempo, um aumento da produção de alimentos e a expansão da produção de agroenergéticos.

Já se percebem no Brasil movimentos de grupos econômicos norte-americanos, europeus e japoneses no sentido de adquirir terras nas regiões norte e centroeste. Esses investimentos se constituem em ameaças à nossa Amazônia, já que boa parte das atuais plantações de soja no sul do Pará e norte de Mato Grosso está implantadas em áreas criminosamente desmatadas. No cerrado, a atual plantação de oleaginosas será desviada para a produção de combustíveis, em detrimento da produção de alimentos.

A se configurarem, de fato, essas previsões, a redução da área plantada para a produção de alimentos implicará obviamente na elevação do preços destes, agravando ainda mais o quadro de desnutrição e fome na periferia do capitalismo. Teremos mais famintos em troca de mais veículos saturando ainda mais nossas superpovoadas metrópoles.

Urge reavaliar a questão enquanto há tempo. Quem sabe, um mundo que usasse a energia com mais critério, priorizando a vida em lugar da máquina e do lucro fosse a solução para este impasse?

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