Como era de se esperar, e
certamente em conseqüência da quase concluída ligação rodoviária entre o nosso
estado do Acre e o Oceano Pacífico, via Peru, favorecendo e propiciando a
entrada dos interesses asiáticos (China, Japão e Índia) na Amazônia brasileira,
com reflexos econômicos e ambientais de difícil previsão, o governo
norte-americano, via Usaid, acaba de divulgar um amplo e intematizado
programa de governança para a Região.
E já contando com apoio e
participação direta de nada menos que 30 (trinta) instituições
não-governamentais (ONGs), entre brasileiras, bolivianas, peruanas,
norte-americanas, e mesmo de ação internacional. E sem qualquer sombra de
dúvida, pode-se dizer que a partir de agora teremos para a Região Amazônica,
como um todo, uma nova forma de governança externa institucionalizada, como se
pretende mostrar neste informe.
Sob o título de `Iniciativa para a
Conservação da Bacia Amazônica`, e com data de janeiro de 2007, o documento, em
seu resumo executivo, informa sobre a intenção de `construir capacidade e
compromisso para a gestão efetiva da diversidade biológica e dos serviços
ambientais da Bacia, que se apresentam nacional e globalmente importantes` .
Para essa construção, diz contar, ainda,
com a participação de várias
Universidades e Institutos de Pesquisa de múltiplas ações, entre brasileiros,
bolivianos e peruanos.
Também, dotações orçamentárias e um amplo e muito
bem montado programa para execução de atividades, com prazos e recursos
financeiros definidos, e pelo quais fica evidente que algumas atividades já se
encontram em execução.
Nesse sentido, chama a atenção outro informe,
dentre tantos fornecidos em meio a quadros, tabelas e mapas, a existência de um
Secretariado Geral, composto de representantes de 5 (cinco) ONGs e empresas de
consultoria, lideradas pelo `International Resources Group (IRG)`. Tudo acoplado
ao apoio já fornecido pela Organização do Tratado de Cooperação Amazônica
(OTCA), constituído por 8 (oito) países membros, e firmado, entre as partes, em
julho de 1978, e sediado atualmente em Brasília, capital federal. Organização,
esta, ainda bastante ausente dos problemas e das ações que a Região está a
exigir.
Importante, também, o destaque, fornecido pela Usaid no sentido
de que `para fazer frente aos interesses e demandas dos mercados globalizantes
para hidrocarbonetos, soja, carne de boi, e outros produtos agrícolas, que estão
incentivando a construção de estradas e oleodutos, imigração, apropriação de
terras, de recursos do subsolo (minérios) e conflitos nas áreas indígenas`, esse
organismo norte-americano, de ação internacional, se viu obrigado a valer-se de
um conjunto de 10 (dez) diferentes estratégias para o desafiante contexto
amazônico. Sobressaindo- se, dentre elas, a exigência de capacitação de
lideranças locais; formação e apoio a Consórcios para conservação dos recursos
naturais, a partir de ONGs, povos indígenas, populações tradicionais, agências
de governo e instituições de pesquisa; reflexos da ligação rodoviária com o
Oceano Pacífico; e fundos permanentes para financiamento das atividades.
Em tópico referente aos `Meios de Vida Sustentáveis na Amazônia
Ocidental`, porção que engloba os estados do Amazonas, Acre e Rondônia, mais
especificamente, é mostrada a intenção da tal `Governança` pelo repasse aos
pequenos produtores e empreendedores brasileiros, de sistemas de produção
sustentáveis. Capazes de fornecer fontes de segurança futura, com vistas à
abertura de novas oportunidades para melhoria da saúde, educação e à qualidade
de vida em geral.
Ao final do documento, na repartição dos anexos, é
fornecida uma relação dos Organismos-Nã o-Governamentais (ONG), Instituições de
Pesquisa, Universidades, e mesmo Recursos Humanos, individualmente, já engajados
nas respectivas áreas de atuação, tais como conservação da natureza,
desmatamentos, questões indígenas, governança ambiental e outras. Tudo às
claras, sem qualquer constrangimento, em relação ao que já vem sendo feito e a
se fazer. A grande indagação, no entanto,
que deve ser feita e encaminhada
aos Serviços de Inteligência e de Segurança brasileiros, é saber se tal forma de
atuação, da parte da Usaid, é permitida constitucionalmente e se vem sendo
monitorada como está a exigir.
De outra parte, há que se chamar a
atenção, no mesmo sentido, para as pretensões asiáticas, notadamente do governo
e do empresariado chinês e, ainda do próprio governo no nosso estado do Acre,
com base em informes da imprensa local e da própria Agência Senado (julho de
2005), sobre intenções de formalização de acordos comerciais, no curto prazo, em
várias áreas e etores produtivos, com ênfase à madeiras, minérios e fármacos. E,
mais recentemente, sobre aquisição de terras, de empresas e de empreendimentos,
de uma maneira geral, por parte dos interesses e das demandas chinesas, já
contando com a conclusão da Rodovia Acre-Pacífico, via Peru.
Ou será que
não, que um conjunto de providências, da parte dos nossos governantes, ainda não
se tornaram necessárias? Que devemos continuar nos posicionando como meros
expectadores de um grande e possível conflito de interesses e disputas, entre
países, por limitadas fontes de matérias-primas, porções territoriais, com
evidente perda de soberania e início de grandes devastações florestais, com
sacrifício da biodiversidade e seríssimo comprometimento ambiental, sem paralelo
na história da humanidade.
Evidentemente, não há como aceitar que a
Usaid, que já se encontra executando na Amazônia, o tal `Programa de
Governança`, esteja tão somente interessada em objetivos da conservação dos
recursos naturais e da preservação ambiental como um todo. Ou será que é apenas
isso, que os EUA, em meio ao processo de globalização dominante, deixou de
interessar-se por recursos e matérias-primas estratégicas, em sentido contrário
aos grandes e exigíveis interesses dos países hegemônicos?
Por tudo,
ficam os informes e a expectativa por ações governamentais pertinentes, da nossa
parte, dada a relevância do presente questionamento para a manutenção da nossa
soberania sobre a Região Amazônica e integridade do próprio Estado brasileiro.
Flávio Garcia é engenheiro agrônomo. Servidor Público (CNPq) aposentado
e por duas vezes consultor das Nações Unidas para temas amazônicos
Fonte: AEPET
- Flávio Garcia