A FUTEBOLIZAÇÃO DA POLÍTICA

O professor Mauricio Abdalla, numa preleção sobre política e eleição, realizada durante as eleições de 2014, sugeriu uma comparação entre política e futebol como forma de nos alertar sobre as armadilhas das pesquisas eleitorais e sua influência na escolha dos candidatos. Dizia ele que o eleitor pensa em eleição como um campeonato de futebol: o importante é vencer!

Vencer com doação de empresas que, mais tarde, cobraram a conta em concessões de serviços e obras públicas. Vencer fazendo alianças com partidos que estão longe da linha programática do seu partido. Vencer fazendo caixa dois e comprando votos... Não importa. O importante é vencer, porque “quando meu partido estiver no poder, vai fazer diferente”. Quem já não ouviu esse argumento?

Maurício mirou e acertou em cheio na comparação, pois, hoje, há o fenômeno da futebolização da política.

Os dois grupos de partidos que hoje se antagonizam no campo político têm seguidores que debatem política como se discute futebol. Para os torcedores do PSDB e do PT, qualquer crítica a seu partido somente pode estar associada à defesa do outro, reduzindo a política ao maniqueísmo próprio das disputas desportivas.

Para se ter a dimensão disso, basta lembrar de como se desenvolveu o segundo turno da eleição presidencial de 2014 e olhar para o que ocorre agora, quando, numa espécie de repescagem misturada com tapetão, os torcedores do partido perdedor se esforçam para garantir mais uma chance de ganhar o campeonato. Por outro lado, os torcedores do partido vencedor não aceitam qualquer crítica à traição pelo atual governo dos principais eixos da campanha vitoriosa, traição essa que está consubstanciada pela redução de direitos trabalhistas e previdenciários e pela sinalização mais que evidente de uma política econômica que implicará em mais retrocessos para os trabalhadores, sobretudo, naquelas “conquistas sociais” que marcaram suas duas gestões sucessivas.

Os “camisa doze” tucanos não conseguem entender que os casos de corrupção identificados durante o governo do PT não vão – nunca – absolver os rumorosos casos de corrupção denunciados durante os dois mandatos do PSDB, que envolveram, somente para citar alguns: a privatizações da Telebrás e da CVRD, o PROER, a Emenda da Reeleição, o superfaturamento do stand da Feira de Hannover. O que diferencia esses e os outros casos daqueles ocorridos durante a administração petista é que os seus casos não foram investigados e jazeram no gabinete do “engavetador” Geraldo Brindeiro durante toda a sua gestão.

Por sua vez, a “massa” petista não aceita críticas sobre o envolvimento do partido nos processos de corrupção atualmente apurados – mensalão e Petrobrás –, nem a crítica dos partidos de esquerda sobre o descompasso entre as promessas de campanha e a condução da política econômica que, por exemplo, condicionou o acesso à pensão por morte para famílias de trabalhadores falecidos com menos de 2 anos de inscrição na previdência social e condicionou o uso do seguro desemprego, para trabalhador de primeiro emprego, a 18 meses de carência. Em ambos os casos, os críticos são logo taxados de “adesão ao projeto de direita” ou de “conspirarem contra o Brasil”, num “golpismo disfarçado” e de “colaboração com a CIA”.

A ideia de que se faz política como se torce por time de futebol, no entanto, leva vantagens a dois grupos seletos. O primeiro, composto pela burocracia partidária que precisa dos cargos públicos para sustentação de seus séquitos e sua perpetuação nos aparelhos do poder. O segundo, composto pelos grandes empresários que, valendo-se da analogia, financiam partidos como se patrocina clubes de futebol, pagando o “bicho” dos “craques” e exigindo retorno de marketing, ou seja, em lobby.
Enquanto a metáfora da partida de futebol funcionar, os partidos (times) adversários sempre ganham, como no futebol, onde a divisão de renda da partida garante ao menos 40% ao perdedor. A polarização, então, interessa a ambos os grupos partidários, sendo certo que, muito embora haja uma eventual alteração da posição de mando, os coligados continuam sendo os mesmos.

Enquanto colocarmos a solução parcial dos casos de corrupção como meta na política, não passaremos da metade do campo, jogando no recuo esse jogo feio; e, nessa retranca, nunca enxergaremos a meta real, nem identificaremos que a corrupção, de ambos os partidos e seus partidos asseclas, tem uma só fonte de ingresso e retirada, que é o sistema capitalista, na sua, cada vez maior, disputa pela expropriação coletiva, através dos cofres públicos.

Nessa perspectiva futebolística, para o eleitor que não é torcedor de nenhum dos dois partidos, resta apenas uma coisa a fazer, sair da geral e invadir o campo.

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Andre Luiz Moreira é advogado militante.

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