Stédile constatava apenas que José Arruda Serra representava, como representa, a perspectiva de um cenário devastador para qualquer perspectiva de construção de um Brasil minimamente soberano.
A campanha eleitoral em todos os seus matizes mostra isso.
Há, faltando treze dias para a eleição, uma disputa feroz a partir da extrema-direita brasileira para tentar num primeiro momento levar as eleições para um segundo turno e ali tirar José Arruda Serra do estado comatoso que se encontra nas pesquisas de intenções de votos.
Se num determinado momento essas forças perceberem, já há entre eles quem defenda isso, que a candidata verde, Marina da Silva, pode vir a ser essa opção, deixam o barco de Arruda Serra e investem toda essa ferocidade na ex-ministra do Meio-ambiente do governo Lula.
A afirmação de João Pedro Stédile não se restringe ao Brasil. O coordenador do MST tem a visão de todo o processo vivido hoje pela América Latina e o que se joga nessa parte do mundo, sobretudo num momento em que governos soberanos como o de Chávez, Evo Morales, Correa, Ortega e outros criam condições objetivas para um avanço no processo de integração latino-americana, vale dizer, sem os EUA.
Sem a retomada de discussões de projeto como o da ALCA - ALIANÇA DE LIVRE COMÉRCIO DAS AMÉRICAS - uma espécie de recolonização de países latino-americanos em pleno século XXI.
E é por isso que o mesmo Stédile afirma que a luta popular no Brasil deixou de ser a luta pela reforma agrária, para alcançar status de luta de classes plena e absoluta, vale dizer num primeiro momento, pela sobrevivência do País como nação soberana. Independente.
O governo Lula trouxe avanços que ficaram longe dos desejados pelo movimento popular e do próprio presidente, a julgar por seus últimos discursos.
Mas avanços e conquistas significativos para o processo de construção da democracia popular, de um profundo processo de mudanças políticas na estrutura jurídico institucional do Brasil, caminho para rotas diversas nos campos político e econômico.
No dia seguinte ao três de outubro, data da eleição presidencial (serão eleitos também dois terços dos senadores, a totalidade da Câmara dos Deputados, vinte e sete governadores de estados da Federação e vinte e sete novas assembléias estaduais), a importância de Lula no processo que vai se seguir ao seu governo não diminui, pelo contrário.
A maneira irracional como se comporta a extrema-direita no Brasil (latifúndio e elites paulistas principalmente), é só olhar a forma como a mídia privada trata a candidatura Dilma Roussef, traz a certeza que todas as tentativas possíveis para retirar a governabilidade de Dilma serão feitas à medida que o caminho de avanços e conquistas se ampliar.
O papel de Lula vai ser o de evitar as armadilhas que vão sendo deixadas no caminho de Dilma, a essa altura do campeonato com 53% de intenções de votos nas pesquisas, contra 23% de José Arruda Serra e 9% da verde que vai se tornando cada vez mais marrom, Marina da Silva.
As "denúncias" da mídia privada, braço do capitalismo no Brasil e em toda a América Latina, não têm abalado a candidatura governista e é pouco provável que o façam, a não ser que tenham uma carta fantástica para a última hora. Recurso que usam desde a primeira eleição direta no Brasil após a ditadura militar, a de Collor de Mello.
O que se prevê para os anos Dilma são embates decisivos para o futuro do País.
O desafio de colocar em debate a comunicação e ampliar canais de participação popular. O nó visível na ação subterrânea de forças que não perderam ainda a mania de golpes contra qualquer "veleidade" da classe trabalhadora.
O Brasil é um País ainda quase medieval no campo. O latifúndio aliado aos grandes empresários e banqueiros vive na certeza que a senzala é uma realidade. Trabalho escravo não é ocasional, é convicção desses setores.
A necessidade de preservar a PETROBRAS e retomar o que foi entregue pelo governo FHC, de ir restringindo a ação predadora dos grupos econômicos beneficiados pelo processo de privatização do governo tucano, forma um imenso fantasma pronto a deitar-se sobre o governo Dilma, apostando na fragilidade política da candidata, não é Lula, razão pela qual, o papel do atual presidente passa a ser o de avalista/pagador de tudo quanto se tem dito e buscado.
É claro que sob certo aspecto Dilma é de competência invulgar. Mas lhe falta o talento político de Lula e existe o risco dessa história de ser técnica. Técnicos costumam não ter lado, mas apenas a visão de máquinas. O passado de Dilma é que lhe confere a credibilidade necessária para os desafios que têm que ser enfrentados.
Em todos os embates, quaisquer que sejam, há sempre um momento decisivo. No caso do Brasil e na visão do mundo de hoje, particularmente da América Latina, esse momento se aproxima. E historicamente os trabalhadores têm sido derrotados.
As condições objetivas de hoje são diversas das do passado, das derrotas passadas. Mas isso não significa que o nocaute esteja assegurado. É necessário continuar a trabalhar para vencer por pontos, até que se possa adotar vias alternativas para a política e a economia.
E esse é um desafio posto para os movimentos populares, tanto quanto para o movimento sindical, boa parte hoje acomodado dentro de uma realidade assistencial que nada tem a ver com o caráter dessa luta.
O dia seguinte ao três de outubro vai ser o do início de uma outra luta feroz. A extrema-direita no Brasil, na América Latina ou em qualquer parte do mundo, não costuma largar o osso por livre e espontânea vontade, ou por uma vontade racional, democrática.
A hipótese de José Arruda Serra ou Marina da Silva é aterradora para o futuro do País.
Os desafios de Dilma vão ser maiores que o que se imagina como simples jogo de governo, obras, ações e programas sociais.
A começar pelo debate da comunicação. E nesta disputa uma nova realidade se apresenta como forte e capaz de enfrentar os grupos econômicos que vendem o tal sabão que tira todas as manchas.
O papel da chamada blogsfera está sendo decisivo para mostrar aos brasileiros que a luta transcende ao ato de votar, estende-se a cada dia de governo, como disse a própria Dilma no primeiro debate presidencial.
"Que venha para as ruas lutar por suas convicções, dar força ao governo para que convicções se transformem em realidade". Referiu-se aos movimentos sociais.
Stédile não deu um passo atrás e nem se rendeu a uma evidência. Enxergou para além dos limites de muitos umbigos isolados em casulos que não parecem dispostos a se abrir.
Entendeu o recado que deram em Honduras.