Os dos brasis que emergiram das eleições presidenciais existem há muito tempo. A vitória de Dilma apenas os trouxe a tona. Bisonhas e tacanhas as elites brasileiras não são capazes de conhecer Paris pelo Louvre, mas pelas boates e restaurantes, os hotéis de luxo e hoje os selfies feitos nos monumentos históricos, sem a menor percepção do que sejam.
E trazem consigo um lúmpem da classe média, acostumada a arroz com feijão, embora arrote maionese e se delicie em estar num congestionamento de 50 quilômetros. Botam o carro na cama e o companheiro ou companheira na garagem.
O título de bolivarianismo aplicado ao governo da presidente é a velha tática de pregar um rótulo, não discutir coisa alguma e sair às ruas pedindo intervenção militar. O que leva essa gente às ruas não é só o conjunto de políticas sociais do governo. A idéia de regulação da mídia e consequentemente sua democratização, incentiva os barões do setor a criarem esse falso pânico e a conduzir o rebanho vestido com grifes paraguaias e armados de óculos falsificados de grandes marcas. Uma ou outra original para as entrevistas. Isso porque a maior parte não tem noção do que seja bússola, só conhece shopping.
Dilma não vai conseguir uni-los. A reação será durante seus quatro anos de governo e tem um Congresso conservador e ávido de vantagens e negociatas em sua grande maioria. Vai ter que enfrenta-los e isso vai exigir jogo de cintura, num País onde as forças armadas dependem que seus fuzis funcionem do estado terrorista de Israel ou que seus aviões voem, de grupos estrangeiros detentores da tecnologia básica. Pior, devem aos brasileiros explicações sobre as barbáries de 1964 e punições de assassinos, estupradores, terroristas disfarçados. Têm se escondido atrás da lei da anistia e continuam, em grande maioria, a acreditar que fizeram uma revolução.
Por outro lado o Brasil clama por mudanças estruturais indispensáveis a que possa tornar-se de fato potência e seja mais justo ainda com os brasileiros excluídos do processo econômico que, a despeito dos avanços, são muitos ainda.
Como vai resolver esses desafios não sei. Mas sei que mobilização popular e organização serão necessárias para enfrentar a onda conservadora, que encontrou abrigo na própria Casa Branca, onde um grupo de assessores do presidente Obama iniciou uma petição de impedimento da presidente. O próprio Obama pôs termo a essa garra intervencionista, o que não significa que aceite mudanças radicais no Brasil, principalmente, o crescimento dos BRICS, uma nova ordem politica e econômica que já é realidade.
A presidente vai ter que ficar atenta aos olhos do “grande irmão” sobre o pré-sal, avançar na reforma agrária, promover a reforma política, tudo sem que o modelo mude, pois em essência o governo Dilma joga dentro de regras embora tenha arrebentado a camisa de força em boa parte. Precisa tirá-la e jogá-la fora.
A política externa é uma contradição. Chama o embaixador do Brasil em Israel em protesto contra massacre em Gaza, mas firma contratos de um bilhão com empresas terroristas e que hoje controlam a indústria bélica brasileira. Aprofundar as relações com a América Latina é outro desafio. As elites enxergam nisso a criação de uma nova Cuba. Faz parte da vesgueira absoluta de que ainda não aceitou a lei áurea como se tem dito em vários comentários nas redes sociais.
Descolar de Lula não será possível como deseja. É o ex-presidente quem tem a capacidade de mobilização popular e prestígio internacional para deter golpes e tentativas de desestabilização que levem o País ao caos.
A inflação sob controle, o crescimento econômico voltando a florescer, enfim, desafios que fazem prever que os próximos quatro anos serão tensos e difíceis. As políticas sociais são indispensáveis para que os aeroportos possam ficar cheios de trabalhadores a despeito do ódio e do desprezo dos que vão a Miami e voltam fascinados porque norte-americano não fura fila. De fato não fura, prefere matar milhões no mundo inteiro, manter campos de concentração em Guantánamo e no Egito, explodir em ataques a escolas e empresas e se encher de pipoca e sanduiches do McDonald’s, limpando a boca com as costas das mãos a lá John Wayne. Não chegaram ainda aos tempos dos guardanapos.
Uma agenda comum de esquerdas é decisiva e a iniciativa tem que partir de Dilma. Sua vitória não foi exclusiva do PT, um partido que vai necessitar reencontrar sua história.
A próxima quadra é decisiva para o Brasil. Ou seremos uma potência, ou voltamos a ser república de bananas.
- Laerte Braga
- Opinião