Morreu "Itinho Cabeludo" um dos pilares do cotidiano. Quando falo em cotidiano me refiro a essência viva de nossa história, que é feita longe dos gerenciamentos de bancos, empresas e jantares festivos, falo da essência das ruas, das coisas que tocam a profundeza do vital que teimam em passar um borrão nestes últimos 30 anos de profundidades marítimas e mídias compradas.
Pois bem ,soube da morte deste lindo e feliz amigo que fazia de nossas ruas o prolongamento do seu paraíso interior ."Itinho Cabeludo " trazia para nós, independente do seu tormento interior, um belo universo de alegrias e falas amigas. Itinho deixava, creio eu, na soleira de sua humilde casa na Rrua da "Boa Vista", toda a trama de tristeza com a perda trágica de seu filho "Fanta" e sua vida de homem pobre das nossas existências macaenses,
Vinha para a rua, com sua camisa do Botafogo e com seu sorriso ainda cheirando a pinga, fazia de cada um de nós o seu próprio palco, na representação que ele sabia ser ator, num mundo de mentiras e falsas atitudes vãs. "Itinho Cabeludo" deixou, ou havia deixado de beber nos últimos meses e, lutava para deixar o cigarro.
"Itinho" foi umum grande jogador de Futebol. A "mardita" da birita, que tantos valores levam para o brejo da vida o apanhou numa destas horas de melancolia que rodeiam muitos de nós. Milcélio está ai para relatar e, Arthur da sinuca, para confirmar. Nem mesmo quem ele abordava na rua, com sua doce e pura aporrinhação, nega este fato histórico. E, ontem mesmo quando recebi um telefonema de "Alan Birosca" de Porto Seguro, falamos de sua vida.
Quis homenagea a-lo no jornal que Armando esta soltando em Macaé. Armando não entendeu bem a linguagem que fiz. Comparando o brilho que se apagava com a morte dele, ao brilho que Gorghi via nos homens de rua do folclore de seu tempo, e a vida que vivenciou nos seus olhares, quando vivo na Alemanha de sua infância.
Temos que entender determinados setores da vida que ainda acham que o belo tem a forma estereotipada nas novelas e nos penteamentos de cabelos com toques de noites em bares intelectuais.
Este belo intelectualizado e meio moderno foi o que levou o Armando a não entender o brilho irradiante deste negro puramente macaense que, com cheiro de pinga de noite anteriormente sofrida e bebida, tinha tanta sabedoria e esbanjava cultura popular. Entendo o velho Armando. Passou muito tempo nos refrigerados da TELERJ e perdeu o cheiro das ruas. Está se Tá recuperando devagar...
"Itinho" morreu, e com ele morre muita coisa desta cidade onde se reluta em fazer a verdadeira história em festas engravatadas e com cheiro de perfume importados, churrascarias e teatros polpudos.
A verdadeira vida macaense não está nestas solenidades solenidades. A nossa essência vem das poeiras da ruas, do suor dos pescadores, do malho que estica ferro na bigorna da ferrovia e o petroleiro que enfrenta o mar...
A nossa essência está mesmo no cheiro de pinga vinde de nossos canaviais e não importado de outras cidades como querem fazer crer os donos do poder transitório atual. Muitas de nossas histórias estão cimentadas no apito dos trens, no buzo de Imbetiba e, no cheiro de bosta dos bois que desfilavam nas ruas principais indo para Aroeira. Tentar negar isso é tentar por para baixo do tapete nossas belezas e tirar a podridão catingosa de histórias inexistentes.
Por isso é que quando morre um Itinho, morre um pouco de nós mesmos.
Conversando nas andanças da Praia dos Cavaleiros com Parodi e José Alves de Souza, o nosso "Batistinha " do SENAI ,que jogou l0 anos no Americano e teve ao seu lado na nossa seleção, "Zé Que Não Dança ", "Bibinho", Hélinho Cabral. George, "Geraldo Cara Suja", "Garfante", Elmo e outros. "Batistinha " me dizia dos dribles e jogadas de fundo que nasciam nas pernas meio tortas de " Itinho" e que fazia vibrar os velhos corações macaenses nas décadas do Futebol de Ouro.
Lembro que, quando de meu primeiro livro e o citei nas andanças pela " Rua da Boa Vista", ele me catucou e balbuciou com sua voz de macaense nato: "você esqueceu, no seu livro, de falar em dona Letícia Carvalho , que é sogra do "Birosca." Jogamos bola juntos e nunca saiu de minha cabeça os acordes de seu piano quando passava em frente a sua casa vindo das peladas da Praça da Luz. "Itinho" ainda falou de seu Pierre, de seu Barreto, de dona Pastora , dona Elisa Dinyz, Brandina, de dona Albertina e de dona Honorina. Sempre que podia, trazia notícias de minha filha Lais a quem sempre olhou com carinho e afetuosidade. Era uma história viva de nossa cultura popular...
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... Lá detrás daquele morro, tem um Pé de Manacá.