Pierre Cambronne (1770- 1842)
“La garde meurt et ne se rend pas" ("A guarda morre e não se rende”)
A “palavra de Cambronne” (meurt) é o modelo de palavra histórica usada de forma falsa, tornada mais verdadeira que a natureza graças à imaginação de um gênio literário [Pierre Cambronne (1770 – 1842)].
Pierre Cambronne – Nantes, 26 de dezembro de 1770 – 29 de janeiro de 1842
Recordemos os fatos. Pierre Cambronne, major general da Guarda Imperial acompanhou Napoleão I em seu exílio na Ilha de Elba e submeteu-se a seu comando durante os Cem Dias. No campo de batalha de Waterloo, em 18 de junho de 1815, seu batalhão resistiu honrosamente aos Ingleses. Ele próprio foi ferido por uma bala e foi deixado como morto no campo.
Seis dias depois, o Journal Général de la France (Jornal Geral da França) relatou que os Ingleses enviaram um emissário a Cambronne convidando-o a se render. O general respondeu essa mensagem com as seguintes palavras: “a guarda morre (meurt, em Francês) e não se rende”. E o jornalista concluiu então: “a guarda imperial e o general não mais existem”.
Mas eis que Cambronne, curado de seu ferimento e liberado pelos Ingleses, tendo até mesmo se casado com uma inglesa, descobriu a palavra que lhe cederam. Ele asseverou jamais tê-la pronunciado. E, três anos mais tarde, o Jounal de Débats (Jornal de Debates) explicou que a palavra tinha sido inventada por um jornalista algo ditirâmbico (alguém que é chegado ao extremo lirismo ou delírio). Isto não impediu que a “palavra de Cambronne” tenha feito seu caminho nas memórias até deformá-las... Em 2 de fevereiro de 1843, o marechal Soult, para justificar seu passado, declarou perante os deputados: “Eu estava em Waterloo, eu estava ao lado de Cambronne quando ele disse: a guarda morre (meurt) e não se rende!” ...
Cerca de vinte anos depois, um novo sobressalto. Em seu exílio em Guernesey, Victor Hugo estava terminando de escrever seu longo romance Os Miseráveis no qual faz um relato da batalha de Waterloo. Evocando o heroísmo da Guarda Imperial, veio-lhe à mente a palavra atribuída a Cambronne que, entretanto, lhe parecia algo longo e de acordo com seu hábito ele a reduziu a um breve palavrão: “Esses combatentes ... poderiam entender na sombra do crepúsculo quando as peças foram carregadas, os pavios iluminados, como os olhos de um tigre à noite, fizeram um círculo em torno de suas cabeças, todos os fogos das baterias inglesas se aproximaram do canhão e então, movidos, segurando o momento supremo suspenso acima destes homens, um general inglês, Colville segundo alguns, Maitland segundo os outros, gritou para eles: bravos Franceses, rendei-vos! Ao que Cambronne respondeu: Merda!” (Os Miseráveis, segunda parte, livro primeiro, capítulo XIV).
Durante a caminhada, encorajado por sua audácia (foi a primeira vez que a palavra figurou na literatura francesa), Victor Hugo dedicou um magnífico capítulo à glória de Cambronne ... O bravo general não se importou. Depois de se unir ao rei Luís XVIII, seguiu uma honrosa carreira militar como governador de Lille, com o título de visconde antes de se aposentar em Nantes, onde morreu 20 anos depois, em 1842.
Traduzido do Francês por A. Pertence