Agricultoras de Bangladesh preferem variedades de cultivos resistentes à mudança climática. Foto: Naimul Haq/IPS
Washington, Estados Unidos, 10/4/2013 – O Banco Mundial anunciou que dará maior ênfase aos problemas relativos à posse da terra e à sustentabilidade social e ambiental dos investimentos agrícolas. A instituição, uma das maiores prestamistas para o desenvolvimento no mundo, também reiterou sua preocupação pela posse corporativa de terras em grande escala, que nos últimos anos afeta vastas extensões da África.
“O Grupo do Banco Mundial compartilha as preocupações com os riscos das aquisições de terra em grande escala”, disse o presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, em um comunicado divulgado no dia 8 pela sua sede, em Washington.
“Garantir o acesso à terra é crucial para milhões de pessoas pobres. As políticas modernas, eficientes e transparentes sobre a propriedade agrária são vitais para reduzir a pobreza e promover o crescimento, a produção agrícola, melhor nutrição e desenvolvimento sustentável”, afirmou Kim.
Após décadas nas quais a agricultura foi quase ignorada pelos investidores internacionais, doadores bilaterais e instituições multilaterais, como o próprio Banco Mundial, nos últimos anos cresceu o interesse por este setor. Kim observou que o Banco também aumentou seus investimentos em agricultura, mas alertou que “são necessários mais esforços para criar capacidade e salvaguardas para os direitos à terra, e para empoderar a sociedade civil para que exija que os governos prestem contas”.
Antes de sua conferência anual de quatro dias sobre terra e pobreza, esta semana em Washington, a instituição afirmou que a população mundial terá aumentado em dois bilhões de pessoas até 2050, o que exigirá ampliar em 70% a produção agrícola do planeta. Apesar de reiterar os apelos por novos investimentos públicos e privados tanto em pequena quanto em grande agricultura, o Banco alerta que “os investimentos sozinhos não serão suficientes” para conseguir o aumento de produção que se precisa.
O Banco Mundial pediu urgência na adoção de normas nacionais e internacionais mais firmes em matéria de investimentos e propriedade agrária, para ajudar os agricultores de todo o mundo a melhorarem seus rendimentos. “As terras disponíveis escasseiam, e há todo tipo de especulador e investidor inescrupulosos explorando pequenos agricultores, pastores e outros produtores que carecem de poder para defenderem seus direitos. Isto ocorre sobretudo em países com regimes agrários fracos”, afirma o Banco Mundial.
Por isso, a instituição fortalecerá os esforços para melhorar a governança agrária, proteger os direitos dos proprietários e promover políticas “que reconheçam todas as formas de posse da terra e ajudem as mulheres a conseguirem tratamento igual na matéria”. Devido à maior instabilidade dos preços mundiais dos alimentos e à demanda por biocombustíveis nos últimos cinco anos, as terras agrícolas se converteram em uma lucrativa commodity, ou produto básico negociável, para os investidores internacionais, que se centram particularmente na África.
Pesquisa do Banco Mundial, realizada em 2011, mostra que somente em 2009 investidores privados compraram ou arrendaram 60 milhões de hectares em países em desenvolvimento. Em muitos casos, organizações locais da sociedade civil alertam que estas transações ocorrem com a cumplicidade do governo e sem atender normas internacionais para consulta às partes afetadas.
“Há governos que cedem terras a investidores internacionais, gratuitamente ou a preços preferenciais, com a ideia de que dessa forma conseguirá um desenvolvimento mais rápido”, disse à IPS o especialista Nicholas Minot, do Instituto Internacional de Pesquisa sobre Políticas Alimentares, com sede em Washington. “Até certo ponto, isso tem lógica, mas há uma grande questão: se essa terra era propriedade do governo ou se estava ocupada por pequenos agricultores sem títulos de posse. Estabelecer uma posse segura da terra para os camponeses é um assunto enorme, mas crucial”, acrescentou.
A conferência desta semana sobre terra e pobreza, a décima-quarta organizada pelo Banco Mundial, é a maior já realizada, e inclui participações de governantes de vários países. “Este não é um assunto novo para o Banco, mas ganhou muito mais destaque, embora alguns países estejam mais interessados do que outros em conseguir maior transparência para melhorar a governança agrária”, afirmou à IPS o assessor sobre posse agrária da instituição, Jorge Muñoz.
O Banco Mundial desenvolveu uma nova ferramenta para que os governos obtenham uma análise rápida da situação da propriedade agrária em seus territórios e do contexto legal vigente. O Marco de Avaliação da Governabilidade sobre a Terra já é utilizado por 33 países, segundo Muñoz. Além disso, o Banco ajuda a implantar as Diretrizes Voluntárias para a Governança Responsável da Posse da Terra, da Pesca e das Florestas no Contexto da Segurança Alimentar Nacional, aprovadas em maio de 2012 sob os auspícios da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
Segundo a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid), pelo menos 22 países solicitaram assistência técnica para implantar essas pautas. Embora o projeto ainda esteja em fase-piloto, um “rascunho zero” será divulgado no próximo mês.
“As regulações voluntárias nem sempre funcionam, mas neste caso podem ser a única maneira de garantir que os pequenos agricultores não sejam vítimas de abusos e possam possuir terras que talvez tenham ocupado por várias gerações”, disse à IPS Danielle Nierenberg, cofundadora da Food Tank, um centro de estudos com sede em Washington. “Sem estas diretrizes, ficaremos na anarquia. Governos e consumidores devem ter a iniciativa para que as corporações levem isto a sério”, acrescentou.
O Banco Mundial também participa de outro processo da FAO para desenvolver uma série de Princípios para o Investimento Agrícola Responsável. Nos últimos anos, algumas organizações da sociedade civil questionaram o papel da instituição na facilitação de compras de terras em grande escala, especialmente seu braço para o setor privado, a Corporação Financeira Internacional.
Entretanto, Muñoz disse que boa parte destas críticas exageraram o papel da instituição, que não se dedicou tanto a financiar quanto a oferecer ajuda técnica para as reformas. “Há um importante problema mundial na monopolização de terras. O papel do Banco é, essencialmente, conduzir a ajuda para que os países melhorem a governança agrária e para melhorar a conduta dos investidores privados”, ressaltou. Envolverde/IPS