A informação é do Clóvis Rossi (ver íntegra aqui):
"O relatório da comissão da ONU que investigou a violência na Síria (...) é duríssimo: diz que as forças de segurança sírias cometeram 'graves violações dos direitos humanos', o que inclui execuções sumárias, prisões arbitrárias, desaparições forçadas, torturas, violência sexual, violação dos direitos das crianças -enfim o catálogo completo a que recorrem as ditaduras mais selvagens.
Para o Brasil, não dá mais para repetir a torpe declaração emitida após visita de uma delegação do Ibas (Índia, Brasil e África do Sul) a Damasco, na qual condenaram 'a violência de todas as partes'. Equivalia a igualar vítimas e algozes.
Agora, há um relatório com a chancela de Paulo Sérgio Pinheiro, o brasileiro que preside a comissão..."
O qual, acrescento eu, é um personagem acima de qualquer suspeita de favorecer manobras imperialistas.
Foi, p. ex., indicado pela Comissão de Mortos e Desaparecidos do Ministério da Justiça para representar a sociedade civil no grupo de trabalho que preparou o anteprojeto de lei da Comissão Nacional da Verdade. Constitui exemplo inatacável de dignidade e idealismo, sempre colocando seu brilho intelectual a serviço das causas justas. Uma unanimidade, enfim.
Então, a habituais desqualificações a que recorre uma parcela da esquerda tão selvagem quanto os ditadores que apoia, neste caso, não colarão.
O que me deixa estupefato é a defesa em bloco que tais desatinados fazem dos tiranos das Arábias.
Um Gaddafi da vida, embora não tenha chegado ao poder graças a revolução nenhuma, mas sim por meio de uma quartelada, teve lá seus rompantes antiimperalistas antes de acertar os ponteiros com os senhores do mundo (revelando grande afinidade com o que o Império tinha de pior, o fascistóide, mafioso e debochado Sílvio Berlusconi).
É algo de que ninguém jamais acusaria o açougueiro de Damasco, Bashar al-Assad, despótico, conservador e reacionário até a medula.
A vergonhosa tibieza do Governo brasileiro face a uma das piores tiranias do século 21 se deve tão somente a interesses econômicos. Uma variante do critério de que "ele pode ser um grandíssimo fdp, mas é nosso fdp".
A esquerda não caudatária do petismo, entretanto, está desobrigada de coonestar o oportunismo governamental.
Mesmo assim, com um primarismo abissal, os esquerdistas selvagens encaram a mais do que necessária derrubada de al-Assad como uma tramóia dos países da Otan para apoderarem-se de riquezas sírias.
Ainda que assim fosse, que cabimento tem tomarmos partido em disputa na qual ninguém é antagonista do capitalismo? Se são só vilãos brigando por um butim, o que importa para nós qual vilão prevalecerá?
Mas, a própria razão de ser da esquerda é defender o povo contra os que o tiranizam e massacram. São milhares as vítimas do açougueiro de Damasco e até a Liga Árabe vê premência em deter-se a matança.
O hipotético repúdio à Otan implica o bem real repúdio ao povo sírio e uma vergonhosa cumplicidade com a carnificina que lhe é imposta.
Está mais do que na hora de voltarmos a ter um ideário positivo, priorizando o que se afirma e não o que se nega. Direcionar-se apenas por negações, como uma bússola invertida da imprensa burguesa, nem sempre leva à posição correta e às vezes desemboca em absurdos.
Caso atual: é um completo absurdo a promiscuidade dos herdeiros de Karl Marx com um herdeiro de Vlad Dracul.
Do blogue Náufrago da Utopia
- Celso Lungaretti
- Editorial