Pense nas manhãs da maioria das pessoas de classe média em todo o mundo ocidental. Alguns da casa gostam daqueles pães fresquinhos que a padaria a duas quadras de sua casa fornece. É claro que há outras padarias nas redondezas, mas há uma mais próxima e não existe qualquer segredo em fabricar o pão francês do nosso café da manhã.
Nas cercanias, todas ou quase todas as pessoas que optam pelo pão francês de cada dia dirigem-se à padaria mais próxima. É a mais próxima. Gasta-se menos tempo indo até ela. E o pão francês dela tem o mesmo padrão dos produzidos nas outras padarias da área.
Assim, essas circunstâncias decretam o monopólio natural de uma padaria sobre uma região da cidade. Outras padarias do mesmo bairro exercem seu monopólio sobre outras áreas do bairro e assim por diante.
O mesmo se dá com os mercadinhos de bairro, lojas de ferragens, drogarias e outros tipos de comércio. Ninguém tira seu carro da garagem para ir a supermercados mais distantes ou lojas de grandes redes de drogarias para a compra de poucos itens, especialmente em bairros mais afastados. O gasto com combustível e o tempo perdido nesse movimento não justificam a operação.
Resta claro, também nestes casos, que esses comerciantes de bairro exercem seu monopólio sobre cada vez mais áreas das cidades, à medida que estas se expandem. Assim, há situações em que definitivamente não existe qualquer concorrência no capitalismo.
No Brasil, que tenta retroceder ao modelo neoliberal, tão mal sucedido em tantas partes do mundo, fala-se hoje da privatização das refinarias da Petrobrás para, segundo os autores da proposta, aumentar a concorrência.
Ora, as refinarias da Petrobrás operam processando o petróleo cru, extraído majoritariamente de campos no Brasil, e desse processo resultam os derivados necessários às mais diversas atividades industriais, comerciais e privadas.
Após o processamento e produção de derivados, a Petrobrás entrega esses derivados diretamente aos grandes consumidores industriais ou às bases das distribuidoras situadas junto às refinarias ou em áreas de grande consumo. Dali, as distribuidoras entregam os combustíveis líquidos e outros derivados (lubrificantes e gases) aos pontos de venda no varejo, em geral por via rodoviária. O frete é, portanto, uma parcela do custo dos derivados. Quanto maior a distância, maior será o custo de frete e dos derivados.
Portanto, não há o menor sentido em privatizar refinarias para aumentar a concorrência. No raio de ação de uma refinaria apenas esta refinaria terá condições de entregar derivados aos grandes consumidores industriais ou às distribuidoras de varejo em vista do custo do frete rodoviário para realizar essas operações.
Por exemplo, uma refinaria instalada em Campinas, oeste de São Paulo, jamais terá condições econômicas para entregar derivados a uma base de distribuição na Zona da Mata de Minas Gerais, a 350 km de distância porque, bem mais próxima está uma refinaria na Baixada Fluminense, a somente 100 km da referida zona. Assim também ocorre com refinarias no Paraná e Rio Grande do Sul que planejem entregar derivados em Foz do Iguaçu.
Não há condições de haver concorrência no padrão neoliberal capitalista entre as refinarias da Petrobrás hoje existentes. As refinarias no Brasil têm o monopólio natural de seu negócio sobre uma área do país assim como as padarias de bairros, guardadas as devidas proporções.
Trata-se, é claro, de um balão de ensaio do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), uma autarquia federal, vinculada ao Ministério da Justiça, e cuja missão é defender a sociedade dos cartéis além de zelar pela livre concorrência no mercado, sendo a entidade responsável, no âmbito do Poder Executivo, não só por investigar e decidir, em última instância, sobre a matéria concorrencial, como também fomentar e disseminar a cultura da livre concorrência.
Infelizmente, parece que o CADE resolveu aderir ao jeito do novo governo de ver e está se perdendo. A Petrobrás não faz e nunca fez parte de cartéis. A Petrobrás é uma empresa controlada pelo Estado e cabe a este vigiar os atos de sua direção, aliás indicada pelo próprio governo. Desmembrar ou desmontar a empresa nunca foi nem será agora a solução.