Nesta semana as redes sociais reproduziram um evento onde o compositor Geraldo Vandré era o homenageado. Para quem não sabe, Geraldo é o autor de uma canção que, em 1968, se tornou hino da luta contra o regime militar: ‘Pra não dizer que falei de flores’. Por cinquenta anos pouco se ouviu sobre o cantor, o que gerou algumas conspirações sobre o quê a ditadura militar teria feito para calar sua voz.
O que se sabe é que naquela época ele se exilou no Uruguai, depois viveu em outros países, na América do Sul. A canção ‘(Caminhando) Pra não dizer que não falei de flores’ ficou censurada durante onze anos. Quando foi gravada, em 1979, saiu em compacto simples e tocava nas lojas de discos incessantemente, foi um sucesso.
Coincidiu com o início da Abertura, da volta dos exilados da ditadura ao Brasil, da Anistia. O refrão ‘vem vamos embora que esperar não é saber, quem sabe faz a hora não espera acontecer’, era ouvido nos aeroportos a cada pouso de um avião trazendo os exilados.
No evento em que reaparece para o público, criou-se uma expectativa de que ‘aquele’ cantor que defendia suas músicas de protestos nos festivais da canção, teria um comportamento que reafirmasse a ideologia que defendera naqueles tempos obscuros. Mas o que se viu foi um senhor subserviente às forças armadas, fazendo apologia aos tiranos fardados que torturaram e mataram estudantes, jornalistas e que mantinham a cultura sob censura.
Uma jovem presente ao evento estendeu uma faixa de apoio à vereadora Marielle Franco, executada há algumas semanas por discordar da intervenção militar no Rio e por denunciar práticas abusivas da polícia militar nas favelas. Pois bem, inacreditavelmente o próprio Vandré recolheu a faixa e expulsou a jovem do recinto com desaforos ditos ao ‘pé do ouvido’ da ativista.
Na verdade Geraldo Vandré nunca foi ‘isso tudo’, mas foi perseguido e a esquerda brasileira deve sim, reverencia à sua obra. A necessidade por novas formas de luta, levou a juventude a incorporar as frases da canção como instrumento de luta, criando um ‘mito' em torno de seu nome.
O que vivemos hoje, principalmente os moradores das periferias, cabe na definição da frase: ‘Há soldados armados, amados ou não, quase todos perdidos de armas na mão’. Geraldo Vandré é um espectro que apareceu de dentro de um livro, um personagem que a história não crucificou, mas que tampouco transformou em algo consumível na geração que luta contra esse golpe que aí está.