A fragmentação do cenário político está beirando ao insustentável. De repente o país se dividiu entre antes e depois de outubro de 2014. Em 1985, quando a AIDS começou a ganhar os noticiários, diziam que ela havia entrado em nossas 'fronteiras' por algum participante estrangeiro do Rock in Rio; tem quem afirme que a Zika foi inserida nos noticiários por algum torcedor, de outro país, claro, que veio assistir a copa do mundo.
Eu digo que foram inseridas nos 'noticiários', porque, para muita gente, o que não é noticiado não existe. Assim como a microcefalia e a Guillain Barré, que para muita gente são uma novidade da ciência; a inflação e a corrupção são novidades criadas pelo PT.
As balas perdidas e os assaltos, o desemprego e a favelização, as drogas e a violência, segundo uma opositora, também são criações petistas, não existiam antes.
Como em 'E la nave va', de Fellini, estamos participando de um funeral a bordo de um navio. O corpo da democracia é velado e homenageado por um coral de vozes desarmônicas.
A dicotomização traz de volta a igreja do diabo, de Machado de Assis. "Embora seus lucros fossem contínuos e grandes, sentia-se humilhado com o papel avulso que exercia durante séculos. Por que não construir ele a sua igreja? Uma igreja do diabo era a maneira eficaz de combater as outras religiões, destruí-las de uma vez”.
Para fechar, comentaram por aí que eu, Luís Fernando Veríssimo e Aldir Blanc, somos os culpados pela crise porque escrevemos, eles muito mais do que eu, artigos nos jornais em defesa do governo contra o golpe. Talvez seja a hora de construirmos uma igreja.
Ricardo Mezavila.
Escritor