Quando um operário venceu nas urnas o direito de presidir o país, a sensação da maioria era de que havíamos chegado ao ápice da democracia. Para os mais radicais era a vitória do “bem” contra o “mal”. Independente de qualquer visão, o fato é que depois de tantos anos, alguém do povo, representando os trabalhadores, alcançava o poder, aparentando o início de uma nova era. Hoje, a mesma geração dos “caras pintadas”, que tanto lutou por essa conquista, chora decepcionada e volta às ruas, também com rosto colorido, para pedir um basta à corrupção, porém, dessa vez, contra aqueles que há pouco mais de uma década se apresentavam como a esperança de um futuro melhor.
Após 20 anos de ditadura, o clamor popular em todo o Brasil era pela democracia. Assim, o Movimento das Diretas Já e, mais adiante, o impeachment do presidente Collor, historicamente consolidou o Estado Democrático de Direito. A partir daí, foram mais 17 anos e quatro presidentes, mas nenhum com a “cara do povo”. Ainda faltava algo.
Eleito pelo colégio eleitoral, Tancredo faleceu antes de assumir. Sarney, em hipótese alguma representava o povo. O “caçador de marajás” até teve identificação com a população, porém basicamente pelo aspecto físico e a virilidade de quem se dizia com “aquilo roxo”. No entanto, a corrupção o destruiu, ficando marcado como o primeiro presidente no Brasil a sofrer impeachment. A presidência caiu no colo de Itamar, figura inexpressiva junto ao povo.
Na onda do Plano Real, Fernando Henrique chegou forte, representando capacidade técnica. Foi reeleito, mas ao longo dos oito anos de governo sempre foi considerado um representante das elites. Só em 2002, quando Lula venceu, a grande massa popular se viu no poder. Um sindicalista, sem estudo e nordestino atingia o maior cargo do país, prometendo igualdade e melhor distribuição de renda.
Com ele, a classe C avançou, mas, ainda que seu discurso tenha sido “é melhor ensinar a pescar do que dar o peixe”, o viés assistencialista, através dos “Bolsas”, de tudo quanto é tipo, predominou. Talvez, por isso, tenha elegido uma sucessora nada carismática, pelo contrário, vista como autoritária e difícil.
Dilma foi reeleita, mas, notoriamente “perdeu a mão” do comando. Como ela mesma disse “a corrupção é uma senhora idosa” nesse país e, por causa dela, toda uma trajetória pela democracia foi comprometida. Todos que acreditaram, hoje, amargam a decepção de se sentir traído por um grupo que se contradisse e priorizou o projeto de Poder em detrimento do bem coletivo.
*Advogado criminalista