O seguro de dano é modalidade do contrato de seguro em que a seguradora garante o segurado contra eventuais prejuízos em seu patrimônio, em sua saúde ou em sua integridade física, razão pela qual a doutrina aponta que sua função é nitidamente indenizatória, servindo, em síntese, para a reposição das perdas que sofreu em virtude da ocorrência do evento danoso. Assim, nos termos do art. 779 do Código Civil, “o risco do seguro compreenderá todos os prejuízos resultantes ou consequentes, como sejam os estragos ocasionados para evitar o sinistro, minorar o dano, ou salvar a coisa”. Sobre o assunto, registre-se, pois, que o segurador garante todos os riscos de danos que sejam inerentes às atividades desenvolvidas pelo segurado. Nesse sentido, decidiu o STJ:
Seguro. Carga. Descarga. Restrição abusiva. Cláusula contratual. Nulidade. É nula a cláusula que exclui da indenização os riscos dos danos decorrentes de operações de carga e descarga no transporte do veículo cargueiro, porquanto inerentes à própria atividade deste. Precedente citado: REsp 247.203-GO, DJ 12/2/2001 (REsp 613.397-MG, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 25;09.2006, Informativo 298/2006).
De acordo com o art. 778 do Código, “nos seguros de dano, a garantia prometida não pode ultrapassar o valor do interesse segurado no momento da conclusão do contrato, sob pena do disposto no art. 766, e sem prejuízo da ação penal que no caso couber”.
Da mesma forma, não pode o segurado contratar pelo valor integral mais de um seguro de dano referente ao mesmo interesse, prática essa denominada de sobresseguro. Pode-se contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, mas desde que cada seguradora assuma apenas parcela do risco. Nesse sentido, aliás, dispõe o art. 782: “o segurado que, na vigência do contrato, pretende obter novo seguro sobre o mesmo interesse, e contra o mesmo risco junto a outro segurador, deve previamente comunicar sua intenção por escrito primeiro, indicando a soma por que pretende segurar-se, a fim de se comprovar a obediência ao disposto no art. 778”.
No mesmo sentido das regras acima destacadas, prevê o Código Civil, em seu art. 781, que “a indenização não pode ultrapassar o valor do interesse segurado no momento do sinistro, e, em hipótese alguma, o limite máximo da garantia fixado na apólice, salvo em caso de mora do segurador”. Em contrapartida, dispõe o art. 783 que “salvo disposição em contrário, o seguro de um interesse por menos do que valha acarreta a redução proporcional da indenização, no caso de sinistro parcial”.
Como o seguro garante o segurado contra ocorrência de evento danoso futuro e incerto, obviamente a seguradora não pode se responsabilizar por vício intrínseco da coisa, quando este não foi informado a ela pelo segurado. É o que estabelece claramente o art. 784 do Código Civil: “não se inclui na garantia o sinistro provocado por vício intrínseco da coisa segurada, não declarado pelo segurado”. E o parágrafo único desse dispositivo complementa, estipulando que “entende-se por vício intrínseco o defeito próprio da coisa, que se não encontra normalmente em outras da mesma espécie”.
O art. 785 do Código regula a hipótese de transferência do contrato de seguro a terceiros, estabelecendo que, “salvo disposição em contrário, admite-se a transferência do contrato a terceiro com a alienação ou cessão do interesse segurado”. O § 1º prevê que “se o instrumento contratual é nominativo, a transferência só produz efeitos em relação ao segurador mediante aviso escrito assinado pelo cedente e pelo cessionário”. Já o § 2º, prevê que “a apólice ou o bilhete à ordem só se transfere por endosso em preto, datado e assinado pelo endossante e pelo endossatário”.
Regra importantíssima está presente no art. 786 do Código, que regula a possibilidade de a seguradora voltar-se contra o causador do dano, após pagar a indenização ao segurado. Eis o teor da norma em comento: “paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos limites no valor respectivo, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano”. Se o causador do dano, entretanto, for parente próximo do segurado, não haverá essa sub-rogação, salvo se o dano foi causado de forma dolosa. É o que prevê o § 1º do art. 786: “salvo dolo, a sub-rogação não tem lugar se o dano foi causado pelo cônjuge do segurado, seus descendentes ou ascendentes, consanguíneos ou afins”. Complementando, o § 2º ainda determina que “é ineficaz qualquer ato do segurado que diminua ou extinga, em prejuízo do segurador, os direitos a que se refere este artigo”.
O art. 787, por seu turno, regula o seguro de responsabilidade civil, por meio do qual a seguradora garante o pagamento de indenizações que o segurado deva a terceiros. Assim dispõe a regra em questão: “no seguro de responsabilidade civil, o segurador garante o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro”. Nesse caso, “tão logo saiba o segurado das consequências de ato seu, suscetível de lhe acarretar a responsabilidade incluída na garantia, comunicará o fato ao segurador e uma vez intentada a ação contra o segurado, dará este ciência da lide ao segurador” (§§ 1º e 3º). Por outro lado, “é defeso ao seguro reconhecer sua responsabilidade ou confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado, ou indenizá-lo diretamente, sem anuência expressa do segurador” (§ 2º). Complementando, o § 4º estipula que “subsistirá a responsabilidade do segurado perante o terceiro, se o segurador for insolvente”.
Por fim, o art. 788 do Código disciplina o seguros que são contratados obrigatoriamente, por força de determinação legal específica. De acordo com esse dispositivo, “nos seguros de responsabilidade legalmente obrigatórios, a indenização por sinistro será paga pelo segurador diretamente ao terceiro prejudicado”. E o seu parágrafo único prevê que, “demandando em ação direta pela vítima do dano, o segurador não poderá opor exceção de contrato não cumprido pelo segurado, sem promover a citação deste para integrar o contraditório”. Perceba-se que no caso de seguro obrigatório, portanto, a responsabilidade por força da apólice securitária e não por ter agido com culpa no acidente), o que não pode ocorrer nos casos de seguro voluntários (ou seja, quando o contrato de seguro é feito em benefício do segurado), conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 256.424-SE), Rel. originário Min. Fernandes Gonçalves, Rel. p/ Acórdão Min. Aldir Passarinho Junior, j. 29.11.2005, Informativo 269/2005).
O exemplo talvez mais conhecido de seguro obrigatório seja o seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores (DPVAT), cujo prêmio é pago pelos proprietários dos veículos junto com o IPVA. Para garantia dos pagamentos dos danos, criou-se um consórcio entre diversas seguradoras, podendo a indenização correspondente ser cobrada de qualquer uma delas, conforme orientação do STJ:
Veículo automotor. DPVAT. Legitimidade passiva. A Turma desproveu o recurso, entendendo que, no trato de ação de indenização referente ao seguro obrigatório de veículo, qualquer seguradora do sistema tem legitimidade passiva. E, ainda, quanto ao valor da cobertura do DPVAT, seria de quarenta salários mínimos, inexistindo incompatibilidade com a Lei nº 6.194/1974 e demais normas que impedem o uso do salário mínimo como parâmetro de correção monetária. Precedentes citados: REsp 602.165-RJ, DJ 13/9/2004; REsp 579.891-SP, DJ 8/11/2004, e REsp 153.209-RS, DJ 2/2/2004 (AgRg no Ag 742.443-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 04.04.2006).
Ainda sobre o seguro DPVAT, atente-se para o disposto na Súmula 257 do STJ: “a falta de pagamento do prêmio do seguro obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT) não é motivo para a recusa do pagamento da indenização”.
Indenização. Ação direta. Seguradora. O Min. Relator, invocando precedentes deste Superior Tribunal, entendeu que a ação indenizatória por danos morais e materiais advindos de atropelamento e morte causados por segurado pode ser ajuizada diretamente contra a seguradora, que tem responsabilidade por força da apólice securitária e não por ter agido com culpa no acidente, sendo, portanto, parte legítima para figurar no polo passivo da referida ação. O Min. Aldir Passarinho Junior, divergindo do Min. Relator, entendeu que, no caso, em que não se discute seguro DPVAT. O que se tem é uma ação movida para pedir uma cobertura securitária, feita em benefício de outro, porque o seguro contratado é uma terceirização do risco, em que a seguradora-ré não tem sequer condição de se defender porque não sabe o que aconteceu, não estava presente no momento do acidente. Outrossim, se o segurado não está presente na lide, não é possível ação direta contra a seguradora quando o contrato de seguro é feito em benefício do segurado. A seguradora não pode ser parte legítima no caso, apenas o é quando figura na lide juntamente com o próprio segurado ou quando denunciada à lide. Com esse entendimento, a Turma, por maioria, não conheceu o recurso (REsp 256.424-SE, Rel. originário Min. Fernando Gonçalves, Rel. p/ Acórdão Min. Aldir Passarinho Junior, j. 29.11.2005, Informativo 269/2005).
Seguro de pessoa
A grande diferença entre o seguro de dano e o seguro de pessoa, como visto, é que naquele a prestação devida pela seguradora, em caso de sinistro, tem natureza nitidamente indenizatória, o que não ocorre nessa modalidade do contrato. Por isso, no seguro de pessoa não é vedado o sobresseguro, do mesmo modo que não há limite para o valor devido pela seguradora, em caso de ocorrência do sinistro.
Nesse sentido, dispõe o art. 789 do Código Civil que “nos seguros de pessoas, o capital segurado é livremente estipulado pelo proponente, que pode contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, com o mesmo ou diversos seguradores”. E mais: “é nula, no seguro de pessoa, qualquer transação para pagamento reduzido do capital segurado” (art. 795).
Registre-se que o Superior Tribunal de Justiça entende que “o contrato de seguro por danos morais compreende os danos morais, salvo cláusula expressa de exclusão” (Súmula 402 do STJ).
Conforme disposto no art. 790 do Código, “no seguro sobre a vida de outros, o proponente é obrigado a declarar, sob pena de falsidade, o seu interesse pela preservação da vida do segurado”. No entanto, essa declaração é presumida, salvo prova em contrário, quando o segurado é cônjuge, ascendente ou descendente do proponente. É o que estabelece o parágrafo único da regra em comento: “até prova em contrário, presume-se o interesse, quando o segurado é cônjuge, ascendente ou descendente do proponente”.
Se por outro lado, não houver a indicação expressa do beneficiário do seguro, aplica-se a regra do art. 792, que assim estabelece: “na falta de indicação da pessoa do beneficiário, ou se por qualquer motivo não prevalecer a que for feita, o capital segurado será pago por metade ao cônjuge não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem da vocação hereditária”. Complementando a regra do caput, seu parágrafo único estipula que, “na falta das pessoas indicadas neste artigo, serão beneficiário os que provarem que a morte do segurado os privou dos meios necessários à subsistência”.
Sobre a possibilidade de se colocar o companheiro como beneficiário, prescreve o art. 793 do Código que “é válida a instituição do companheiro como beneficiário, se ao tempo do contrato o segurado era separado judicialmente, ou já se encontrava separado de fato”. Veja-se que é possível a designação do companheiro como beneficiário do seguro de vida, porque essa relação é decorrente de união estável, entidade familiar reconhecida pela Constituição Federal. Entretanto, tal não é estendido ao concubino.
Regra importante está prevista no art. 794 do Código: “no seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito”. Assim, a seguradora deve pagar o valor devido diretamente ao beneficiário, e sobre essa operação não deve incidir o imposto de transmissão causa mortis.
O art. 797 permite expressamente que, no seguro de vida para o caso de morte, se estipule “um prazo de carência, durante o qual o segurador não responde pela ocorrência do sinistro”. Todavia, embora o segurador não responda pelo sinistro, ele “é obrigado a devolver ao beneficiário o montante da reserva técnica já formada”.
Outra regra que causa polêmicas e discussões é a do art. 798 do Código, que assim dispõe: “o beneficiário não tem direito ao capital estipulado quando o segurado se suicida nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato, ou da sua recondução depois de suspenso, observado o disposto no parágrafo único do artigo antecedente”. A regra é justa, porque nesses casos a morte é voluntária e muito próxima à contratação do seguro. Ressalte-se, todavia, que o Superior Tribunal de Justiça consolidou, na sua Súmula 61, o entendimento de que “o seguro de vida cobre o suicídio não premeditado”. E mais: o próprio Código Civil se preocupou em estabelecer que, com exceção da hipótese prevista no caput do art. 798, “é nula a cláusula contratual que exclui o pagamento do capital por suicídio do segurado”.
Ressalte-se também que o simples fato de a morte ter sido causada em virtude do uso de transporte arriscado ou da prática de esportes perigosos, por exemplo, não exime o segurador de sua obrigação. É o que estabelece claramente o art. 799 do Código: “o segurador não pode eximir-se ao pagamento do seguro provier da utilização de meio de transporte mais arriscado, da prestação de serviço militar, da prática de esporte, ou de atos de humanidade em auxílio de outrem”.
O art. 800, por sua vez, contrariamente ao que prevê o art. 786 no que tange ao seguro de dano, estabelece que “nos seguros de pessoas, o segurador não pode sub-rogar-se nos direitos e ações do segurado, ou do beneficiário, contra o causador do sinistro”.
Por fim, destaque-se que, de acordo com o art. 802 do Código, “não se compreende nas disposições desta Seção a garantia do reembolso de despesas hospitalares ou de tratamento médico, nem o custeio das despesas de luto e de funeral do segurado”.
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Fabricius Assumpção é advogado, formado em 2004 pela Universidade Cândido Mendes (Campus Campos dos Goytacazes), especialista, MBA em Administração Pública pela Universidade Estácio de Sá e Pós-Graduação em Auditoria Empresarial pelo Instituto A Vez do Mestre. Ex-Assistente da Procuradoria Executiva de Fazenda do Município de Macaé. Ex-Subdiretor Geral Administrativo Financeiro da Câmara Municipal de Macaé, tendo, entre outras atribuições, a coordenação de expedientes referentes ao projeto “Câmara Itinerante”. Ex-Auxiliar Parlamentar na Câmara Municipal de Macaé, tendo colaborado na elaboração de diversas proposições legislativas, tais como o Projeto de Lei n.º 041/2010, que criou o Programa de Assistência Jurídica Gratuita Itinerante (que consiste na visita programada e regular à determinada localidade no âmbito do Município de Macaé realizando prestação jurisdicional, orientações aos cidadãos na área de defesa do consumidor, família, infância e juventude, registro civil e juizado especial cível) e o Requerimento n.º 082/2010, o qual solicita, através dos órgãos competentes (atualmente o INEA/RJ), o monitoramento da qualidade (com as placas indicativas) das águas dos principais rios, reservatórios, lagoas costeiras e praias do município, conforme as Resoluções Conama n.ºs 274/2004, 334/2004 e 357/2005, bem como a Portaria n.º 518 do Ministério da Saúde. Ex- Assessor Jurídico da Fundação Macaé de Cultura e Ex- Assessor Técnico da Direção Geral do Hospital Regional de Barra de São João. Ex-Presidente da OAB Jovem, na 15ª Subseção (Macaé/RJ).