(Paranóia)
Não há dúvidas de que Paranóia (Disturbia, EUA, 2007), dirigido por
D.J. Caruso, inspira-se no clássico Janela Indiscreta, do mostro
sagrado Alfred Hitchcock. Uma versão para adolescentes e
pós-adolescentes com base em roteiro de Christopher B. Landon e Carl
Ellsworth, que aproveitaram uma estória do próprio Landon. O roteiro
estava na gaveta desde os anos 90 esperando uma oportunidade para se
materializar em filme. Sem razão, não saiu antes porque houve a
refilmagem de Janela Indiscreta dirigido e estrelado por Christopher
Reeve, o famoso Super-Homem da atualidade que acabou tetraplégico por
conta de um irônico acidente. Era preciso esperar o prazo-limite para
não incorrer em plágio.
Sérgio Rizzo, um dos críticos da Folha de São Paulo, observou
apropriadamente que as refilmagens datam dos primórdios do cinema. Os
irmãos Lumière, inventores desta nova técnica, refilmaram suas pequenas
produções para aprimorá-las. Se a literatura, a música e as artes
plásticas buscam a originalidade, o cinema, uma forma de expressão
artística mergulhada até a medula na produção cultural de mercado, vem
trabalhando com o reaproveitamento e a reciclagem desde suas origens.
Se é difícil reescrever um livro ou repintar um quadro, não é difícil
reciclar um filme dispondo das tecnologias cinematográficas.
Impõe-se, então, uma discussão que requer a presença de Edgar Morin e
Abraham Moles. O cinema é uma arte, obviamente. Cineastas autorais,
como os falecidos Akira Kurosawa, Ingmar Bergman, Antonioni e Federico
Fellini, souberam usá-la para se expressar em sua linguagem pessoal.
Mas a literatura e outras artes baratas, em termos de produção, podem
viver da marca pessoal. Não assim o cinema, que é uma arte cara.
Pode haver mediocridade em filmes de arte e genialidade em filmes
comerciais. Não direi que Paranóia é um filme comercial genial. Bem ao
contrário, é um filme inferior a sua matriz Janela Indiscreta. Mas
façamos as seguintes considerações:
1- Janela Indiscreta é um excelente filme de um diretor que, na época,
prendeu a atenção do público leigo e da crítica. O primeiro público
esqueceu-se do filme. A critica especializada pode ter se manifestado
contra o filme por seu apelo popular até ele se tornar um clássico. O
tempo tem dessas coisas: o brega de hoje vira o clássico ou o cult de
amanhã. Daí, vem a minha recomendação: não acredite nos críticos,
possível leitor. Eles não têm perspectiva histórica e são muito
elitistas. Eles não consideram o seu gosto. Eles julgam os filmes
apenas a partir de seus critérios.
2- Nós, críticos, sentimo-nos donos da correta opinião e gostaríamos
que as novas gerações tivessem a mesma cultura que nós. Gostaríamos que
Janela Indiscreta tivesse sido assistida por todos vocês para não se
deixarem iludir por um filme de segunda categoria como Paranóia. No
entanto, se os jovens assistissem a este clássico de Hitchcock,
achariam o filme "devagar" demais. Para eles, entre Janela Indiscreta,
de Hitchcock, e Paranóia, certamente ficariam com o segundo.
3- Antes assistir a uma refilmagem que não assistir a nada. Antes
gostar de um clássico indiretamente, através de uma refilmagem, do que
não ver jamais o clássico que lhe deu origem.
Paranóia não é um filme de primeira qualidade. Kale (Shia LaBeouf), um
jovem inconformado com a morte trágica do pai, pela qual sente-se
culpado, torna-se intratável. Depois de agredir seu professor de
espanhol, é condenado a três meses de prisão domiciliar. Sem poder
afastar-se de um determinado ponto de sua casa por estar com um
detector no tornozelo, ele acaba se dedicando a observar os vizinhos.
Assim, fica fascinado com a nova vizinha Ashley (Sarah Roemer). Kale
acaba convencendo a moça e Aaron You, um colega oriental, de que o
vizinho Turner (David Morse) é um assassino em série. Com um aparato
eletrônico e digital, os três investigam o caso.
Se o filme é uma refilmagem de Janela Indiscreta, a segunda parte dele
segue caminho próprio. E assusta muita gente que está precisando de
adrenalina.
- Edgar Vianna de Andrade
- Arthur Soffiati