Entre os grupos sapiens do paleolítico superior, a demarcação territorial era nítida. Não havia leis escritas acerca de direitos sobre o território, mas eles eram observados tacitamente. A antropologia mostra que, entre os povos arcaicos, a delimitação de um território geralmente coincide com os limites de uma cultura, ou seja, pela língua falada, pela cultura imaterial e material. As transgressões também podem resultar em guerras.
Contudo, ao lado da defesa de um território, existem as relações inter-territoriais e inter-culturais. As culturas fazem intercâmbios imateriais e materiais. Há as conquistas, impondo ao vencido os valores do vencedor. Há recalcitrâncias, levando os vencidos e conquistados a reagir. Vários foram os movimentos de contra-aculturação, como os do Taqui Ongo e de Tupac Amaru, na América.
As demarcações territoriais costumam ser espontâneas e consuetudinárias. Na Europa Ocidental, a partir do século XV, elas passam a ser justificadas por teóricos e doutrinadores. O primeiro grande doutrinador da delimitação soberana, no ocidente, foi Jean Bodin, no século XVI. Em "Os seis livros da república", ele defende a soberania externa e interna. A externa é o direito que cada povo tem de demarcar o território de um Estado e torná-lo soberano em relação aos outros. Ou seja, a soberania não reconhece nenhum poder acima de si a não ser o de Deus. Quanto à soberania interna, prevalece o mesmo princípio: existe um soberano que não reconhece nenhum poder abaixo dele. Acima dele, apenas Deus. Bodin é, portanto, o grande teórico da soberania nacional e do direito divino do monarca. Os reis não devem obediência à população que vive no Estado por ele governado, pois seu poder emana de Deus. A soberania do Estado justifica as guerras de conquista e o domínio sobre os mares.
Claro que houve contestações ao princípio da soberania nacional. O jurista holandês Hugo de Grócio defendeu o direito de soberania dos pequenos Estados, mas a liberação dos mares. Fazia sentido: quando a Holanda começou sua expansão marítima, Portugal e Espanha já haviam dividido os mares pelo Tratado de Tordesilhas, que França e Inglaterra contestaram.
No plano interno, a soberania do monarca passou por um processo de deslizamento até chegar ao poder soberano do povo, com Rousseau. No entanto, a concepção de soberania nacional consolidou-se e fortaleceu-se no século XIX. Segundo ela, cada Estado tem o direito de instituir suas próprias leis, sem reconhecer leis maiores, e usar os bens do seu território como lhe aprouver. A soberania foi estendida ao mar territorial e ao espaço aéreo.
Depois das duas Guerras Mundiais, percebeu-se a necessidade impor limites à soberania nacional. A Liga das Nações, criada após a Primeira Guerra Mundial, pretendia ser um fórum de entendimento entre os Estados nacionais. Faliu. Com o fim da Segunda Guerra Mundial, foi criada a Organização das Nações Unidas, também como órgão supranacional. Ela vingou, mas é muito fraca ante os interesses nacionais.
Com a expansão do processo de globalização, a soberania nacional perdeu força, mas continua sendo invocada pela direita e pela esquerda, tanto para o bem quanto para o mal do planeta e da humanidade. Os órgãos supranacionais, como ONU, União Europeia e Organização dos Estados Americanos, mostram-se enfraquecidos diante da soberania nacional. No entanto, a economia mundializada burla os limites territoriais e saqueia os bens nacionais. As empresas transnacionais são peritas em desrespeitar a soberania nacional.
Se o individualismo liberal é apontado como o grande responsável pela crise ambiental planetária da atualidade, a competição entre Estados nacionais soberanos deu também uma grande contribuição para ela, pois se comportam como indivíduos coletivos. Eles se expandiram para além dos limites naturais e se tornaram insustentáveis. Porém, nenhum deles quer abrir mão de suas prerrogativas, a menos que todos o façam ao mesmo tempo.
Sua expectativa de vida ainda parece longa. Só vislumbro duas saídas para sua permanência. A primeira é exercer a soberania para cumprir o que é bom para o planeta e para a humanidade dentro de suas fronteiras. Exemplo: o Estado soberano brasileiro não permitirá a destruição da Amazônia e conclamará os Estados vizinhos a acompanhá-lo. A segunda é não reconhecer a soberania quando o Estado a estiver usando para o mal. Exemplo: a Síria viola os direitos do ser humano, portanto não deve ter sua soberania reconhecida.