PROPOSTA SUBSTITUTIVA PARA O ESTALEIRO DA OSX NA PRAIA DO AÇU

Senhoras e senhores

Considero o complexo industrial-portuário no sul da Restinga de Paraíba do Sul (conhecido como Açu) anacrônico e fora de lugar pelas seguintes razões:

1- O núcleo duro dos empreendimentos é constituído pelo uso de elementos não-renováveis, como o ferro, o carvão mineral e o gás natural, todos eles finitos. Mesmo com todo o cuidado que envolve a extração, o transporte e o emprego desses elementos, não podemos esquecer que o complexo contribui intensivamente para o esgotamento de tais recursos.

2- Embora representantes da EBX sustentem que o carvão mineral é seguro e que está sendo retomado como combustível nos países ricos, na verdade, ele está sob críticas severas de cientistas e da sociedade civil organizada na União Europeia. No Estado do Rio de Janeiro, há a intenção do governo em proibir a instalação de novas termelétricas a carvão mineral e a óleo. No entanto, uma termelétrica do complexo será movida a carvão mineral.

3- A zona costeira que se estende da margem direita do Rio Itapemirim (ES) à margem esquerda do Rio Macaé (RJ), que denomino de Ecorregião de São Tomé, tem idade muito recente em termos geológicos. Nela, encontram-se duas unidades do Grupo Barreiras (tabuleiros), com cerca de 60 milhões de anos; uma planície aluvial com menos de 5 mil anos e três unidades de restinga, contando a mais antiga com cerca de 120 mil anos e a mais recente com menos de 5 mil anos. Nessa costa, não existe uma ilha sequer, nem mesmo a pouco conhecida Ilha das Andorinhas, no litoral capixaba, que vem a ser um pequeno remanescente de tabuleiro resultante do avanço do mar sobre o Grupo Barreiras. Todas as intervenções humanas nessa costa usando rocha cristalina vêm causando problemas ambientais, como em Macaé, Barra do Furado, Guaxindiba, Marataíses e na margem direita do Rio Itapemirim.

4- As empresas do Grupo EBX escolheram exatamente a área mais nova da Ecorregião de São Tomé para instalar o complexo industrial-portuário: a Restinga de Paraíba do Sul, entre as Lagoas de Iquipari, Açu, Veiga e Salgada. Um porto está sendo construído dentro do mar com pedras retiradas do Maciço do Itaoca. Trata-se de mais uma intervenção irresponsável.

5- A vocação econômica de uma restinga nova, baixa, com linha litorânea retilínea não é a industrialização pesada, mas a proteção das lagoas e da vegetação e fauna nativas. Quando muito, a fruticultura com espécies frutíferas da própria vegetação nativa, a apicultura e a pesca.

6- No entanto, a EBX vem contando com todo o apoio do governo do Estado do Rio de Janeiro e da prefeitura de São João da Barra na instalação de uma ilha-porto, de dois canais submarinos, de uma pesada área retroportuária, de duas termelétricas (uma a carvão mineral e outra a gás natural), de um estaleiro e de uma siderúrgica, de empreendimentos metal-mecânicos e de outros que porventura apareçam.

7- O governo do Estado do Rio de Janeiro já desapropriou áreas para constituir um distrito industrial cujas terras serão destinadas a novos empreendimentos integrantes do complexo, um canal dito de drenagem e um ramal ferroviário.

8- Será difícil o funcionamento de todas as unidades produtivas numa restinga, que é a área mais nova da Ecorregião de São Tomé, com muitas lagoas, fragmentos de vegetação nativa, espécies da fauna ameaçadas de extinção, pequenos proprietários rurais e, sobretudo, sem água doce em quantidade para atender à demanda de tantas unidades produtivas. É certo que o Rio Paraíba do Sul sofrerá novas captações para suprir as necessidades de água.

9- Parece que todo esforço para impedir a instalação do complexo será inútil, mesmo com a ação do Ministério Público. Já que se trata de fato consumado, o que resta aos críticos dos empreendimentos é propor alternativas para minorar os impactos socioambientais.

10- O primeiro deles já está em marcha. Começou com a criação de um grupo ligado à EBX para promover a gestão integrada do território. Até o momento, cada braço da EBX trata do seu empreendimento isoladamente quanto a impactos e programas para atenuá-los. Cabe examinar não os impactos de cada unidade, mas os impactos do complexo industrial-portuário como um todo, definindo programas de mitigação, proteção, restauração e revitalização socioambientais.

11- De todos os empreendimentos previstos até agora, considero o estaleiro da OSX como o mais impactante de todos. A maior parte dos impactos ambientais insere-se na categoria de alta e muita alta. Mencionamos apenas três, na categoria de irreversível:

a) O canal de saída do estaleiro, ainda em terra, secionando a parte da Lagoa do Veiga que restou íntegra em duas.

b) A remoção da vegetação nativa para a instalação do empreendimento.

c) A abertura de um canal submarino para que os navios alcancem o canal principal do complexo ou dele provenham.

12- A alternativa que apresento para reduzir sensivelmente os impactos do estaleiro são as seguintes:

a) O canal de saída e entrada do estaleiro, no continente, deve ser transferido da parte norte para a parte sul, chegando ao mar pelo trecho entre a parte íntegra da Lagoa do Veiga e sua parte antropizada. Os custos de instalação vão aumentar, pois será necessário desapropriar e indenizar, de forma justa, alguns prédios existentes no local, bem como aumentar a área a ser dragada no mar para que o canal do estaleiro alcance o canal do porto. Considerando-se, porém, que o Grupo EBX anuncia-se como o mais rico do Brasil e um dos mais ricos do mundo, no setor privado; considerando também o compromisso até agora assumido pelos empreendimentos anteriores de respeitar a Lagoa do Veiga, como aceitar agora a divisão desta lagoa em sua parte íntegra? Leve-se em conta que o próprio Estudo de Impacto Ambiental (EIA) reconhece que ela é insuficientemente estudada, apresentando, junto com a Lagoa Salgada, características típicas para abrigar espécies de peixes anuais, suspeita que vimos levantando há bastante tempo.

b) A parte íntegra da Lagoa do Veiga deve ser transformada numa Unidade de Conservação de Proteção Integral pelo governo do Estado do Rio de Janeiro com subsídios oriundos de compensações ambientais, excluída a figura da Reserva Particular do Patrimônio Natural.

c) Se o governo do Estado do Rio de Janeiro deseja mesmo a revitalização da Lagoa do Veiga, a proposta é que se esforce ao máximo em religá-la à Lagoa do Açu, da qual fazia parte no passado.

d) Se o canal que o Instituto Estadual do Ambiente (INEA) pretende abrir entre os canais de São Bento e Quitingute até o canal do estaleiro em área continental tiver a finalidade de prover de água doce o empreendimento e o complexo, deve ele ter seu regime hídrico respeitado: cheia na estação chuvosa e nível e volume escassos na estação do estio. Se houver qualquer sistema para estabilizar sua lâmina durante todo o ano, como comportas, por exemplo, o governo estadual e o complexo industrial-portuário estarão criando um inédito conflito social a reunir pescadores, ruralistas e ambientalistas.

e) Caso o canal se destine tão somente à drenagem, deve ser ele substituído pela reconexão do Canal do Quitingute com as Lagoas de Gruçaí, Iquipari e Açu, como no passado. Seria uma forma de revitalizar as três lagoas.

13- A criação de uma UC de proteção integral na Lagoa do Veiga não exclui a criação de mais duas UCs: uma protegendo as Lagoas de Gruçaí e de Iquipari bem como a mancha mais representativa de vegetação de restinga entre ambas, incluindo todas as zonações, desde a linha de costa até o interior; e outra ao sul do condomínio industrial, envolvendo grande parte do Banhado da Boa Vista, as Lagoas do Açu e Salgada e a vegetação nativa. A Lagoa do Taí deve ser protegida de alguma forma.

14- Estas propostas, como todos devem saber, não têm qualquer intenção de sensibilizar o Ministério Público Federal, que vem instaurando Inquéritos Civis Públicos, inclusive um recente relativo ao estaleiro da OSX, mas podem facilitar o entendimento entre o Grupo e os técnicos que assessoram o MPF.

Arthur Soffiati

Campos dos Goitacases, 14 de dezembro de 2010.

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