Dos impactos da agropecuária sobre o meio ambiente

Entre 7 milhões e 10 mil anos passados, a humanidade viveu de coleta, pesca e caça, numa economia de subsistência. A agricultura e a pecuária só foram inventadas em época relativamente recente, há cerca de 10 mil anos antes do presente. Ambas as atividades exigiram o sacrifício de florestas e lagos, embora sua prática continuasse voltada para uma economia de subsistência.

Só a partir do século 16, na Europa, a agricultura e a pecuária passaram a destinar-se ao mercado. Foi uma mudança drástica, pois o objetivo passou a ser não mais atender a uma necessidade básica do ser humano, mas a acumulação de capital. As técnicas e tecnologias foram aprimoradas e a agropecuária passou a exigir enormes extensões de terras, grande parte delas embaixo de lagoas e florestas.

No Brasil, os colonos portugueses vislumbraram uma oportunidade de ganhar dinheiro fácil derrubando vastas matas para obter lenha, madeira e terras destinadas à agricultura e à pecuária. Em se tratando de um imenso território, desenvolveu-se a síndrome da inesgotabilidade, concepção segundo a qual tudo o que havia na natureza era recurso inexaurível. Houve quem criticasse esta visão, como José Bonifácio de Andrada e Silva, Baltasar da Silva Lisboa, Joaquim Nabuco, André Rebouças, Euclides da Cunha, Alberto Torres e outros, que nem de longe podem ser considerados socialistas. No entanto, ninguém ouviu suas advertências e continuou-se a praticar uma agropecuária predatória, em que as ricas florestas eram suprimidas com grandes queimadas.

No norte-noroeste fluminense, vigorou esta concepção desde o momento em que Pero de Góis, primeiro donatário da Capitania de São Tomé nela pôs os pés e tentou o cultivo de cana, embora tenha fracassado em sua empresa. O mesmo aconteceu a seu filho, Gil Góis, anos mais tarde. Com os Sete Capitães, na primeira metade do século 17, o gado começou a devastar os campos nativos da baixada sem nenhum custo na implantação de pastos. A partir do século 18, a cana foi expulsando o gado para as partes mais altas da região, processo que alargou as fronteiras econômicas e criou novas províncias agropecuárias.

Com a modernização da agroindústria açucareira, em fins do século 19, as caldeiras das usinas aumentaram sua voracidade. A área plantada aumentou sobre terras úmidas. Foi então que o governo federal criou o Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS), que drenou incontáveis lagoas da baixada e do tabuleiro. Se, antes, havia excesso de água, agora ela se torna cada vez mais escassa. E a situação se agravou com as tecnologias oriundas da Revolução Verde, nos anos de 1950. Os fertilizantes químicos e os agrotóxicos passaram a ser empregados em larga escala nos canaviais, em outras lavouras e na pecuária. Trabalhadores rurais, produtos agrícolas e pecuários, águas superficiais e subterrâneas e consumidores foram contaminados, inclusive com a morte de alguns deles.

Outra prática adotada e causadora de impactos ambientais é a queimada de canavial. Ela está associada ao advento do trabalhador volante ou bóia-fria. Como este tipo de trabalhador não tem mais estabilidade no emprego e recebe baixos salários para cortar a cana, ele exige a queima do canavial para facilitar o corte. Uma vez queimada, a cana perde sacarose, afugenta os inimigos naturais das pragas que atacam a cana, elimina pequenos mamíferos, carrega impurezas que, ao serem retiradas com a lavagem, poluem rios e canais, provocando a mortandade de peixes, para, por fim, ao ser queimado o bagaço, gerar gases que aumentam o efeito estufa e poluem as casas com fuligem.

Mais recentemente, o Programa Frutificar repetiu os padrões da cana, com barragens para represar água, drenagem de lagoas e poços para irrigação; derrubada dos últimos remanescentes de florestas e uso de fertilizantes químicos e agrotóxicos. O retorno da cana, para a produção de etanol (outro nome para álcool combustível) e a provável entrada do eucalipto vão fortalecer este padrão.

Não há nenhuma dúvida de que não podemos dispensar a agricultura e a pecuária e voltarmos a viver numa economia de coleta, pesca e caça. Mas também não é admissível que, em nome de um falso desenvolvimento, todas as porções de terra, até a última polegada, sejam transformadas em lavouras e pastagens, não poupando a menor nesga de mata e a mais diminuta lagoa. É preciso estabelecer limites entre a ecologia e a economia, até mesmo porque uma não vive sem a outra.

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