Dilma Rousseff cumprimenta beneficiários de um programa social. Foto: Roberto Stuckert Filho/PR - Presidência do Brasil
Rio de Janeiro, Brasil, 1/9/2011 – A presidente Dilma Rousseff começa a ganhar adesões para uma guerra ética que encabeça de fato, mas prefere não declarar. Para a sucessora de Luiz Inácio Lula da Silva – ambos do esquerdista Partido dos Trabalhadores (PT) –, a única “limpeza” que interessa é a da “miséria” neste país de 192 milhões de habitantes, que é a maior potência econômica da América Latina. Porém, em seus oito meses de governo, perderam seus cargos o chefe de gabinete, o ministro da Agricultura e o dos Transportes, o secretário-geral do Turismo e dezenas de altos funcionários suspeitos de supostos atos venais, afetando tanto o PT como partidos aliados. E desta forma Dilma ganhou uma fama que talvez preferisse não ter: de lutadora contra a corrupção, e um apoio que não pediu, embora não caia mal: o das ruas.
“Isto não é de fato a Roma Antiga”, reagiu a presidente quando a imprensa perguntou sobre as sucessivas cabeças que rodavam em seu gabinete. “Essa pauta das demissões, na qual criam um ranking, não é adequada para um governo. É uma pauta que não vou assumir”, declarou. As razões para não anunciar a batalha contra a corrupção não são atribuídas à sua modéstia, mas ao delicado equilíbrio de forças aliadas ao PT no Congresso. Na Câmara dos Deputados, o PT tem o maior bloco, 86 integrantes em 513. E conta com 14 dos 81 senadores, ficando atrás do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), que tem 20. Em nenhuma das casas o PT tem maioria simples por si só, e por esta razão está aliado a 15 partidos ideologicamente muito distintos.
Desde que começou a “limpeza” ministerial, por denúncias que vão desde enriquecimento ilícito até desvio de recursos e irregularidades administrativas, o Partido Republicano (PR) já se retirou dessa coalizão aliada. E nas fileiras do PMDB – o maior da aliança – o mal estar cresceu a ponto de ameaçar a presidente com o bloqueio de medidas que necessita para ajustar o orçamento, em tempos em que é urgente reduzir o gasto público. Para o analista político Maurício Santoro, da Fundação Getúlio Vargas, não está claro onde Dilma pretende chegar no combate à corrupção, ou se “está apenas reagindo às denúncias”. Contudo, não há dúvidas de que a presidente, querendo ou não, “está muito além do que qualquer outro presidente que a antecedeu”, afirmou Santoro à IPS.
O mesmo pensam 22 senadores que no mês passado criaram a Frente Suprapartidária de Combate à Corrupção e à Impunidade, cujo objetivo é garantir que Dilma tenha apoio no Congresso em momentos em que sua base aliada parece balançar. Trata-se de uma “chantagem”, segundo o senador Pedro Simón, do PMDB, de atuação independente e um dos criadores da Frente, que já começou a coordenar estratégias com organizações como Ordem dos Advogados do Brasil e Conferência Nacional dos Bispos. O senador exortou os partidos a “meditarem” sobre a situação e a presidente a escolher seus ministros entre pessoas com “capacidade e biografia honesta”.
Para a Frente, Dilma está no caminho certo e deve continuar destituindo envolvidos em escândalos, mesmo se doer no PT, como ocorreu no caso do ex-chefe de gabinete, Antonio Palocci, suspeito quanto ao elevado aumento de seu patrimônio. “Deixamos claro que a presidente Dilma tem nosso apoio se for preciso ir às ruas mobilizar o povo brasileiro para apoiar medidas de combate à corrupção”, disse outro integrante da Frente, senador Randolfe Rodrigues, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).
As ruas também começaram a se mobilizar. Na rede social Facebook crescem movimentos como “Todos juntos contra a corrupção”, que em pouco tempo conseguiu mais de 19 mil pessoas que prometem participar de um grande protesto público marcado para o dia 20 no Rio de Janeiro. “Não tenho carro com equipamento de som, nem apoio nenhum partido político, tenho apenas uma grande vontade de dizer BASTA a essa vergonha”, afirma a página do Facebook. “Sou brasileiro e carioca e estou farto desta história.” O movimento convoca os manifestantes a vestirem roupas nas cores verde e amarela.
Para o ex-deputado Fernando Gabeira, do opositor Partido Verde (PV), o que o governo fez até agora foi apenas demitir ministros acusados na imprensa. “O governo até agora reagiu a uma campanha contra a corrupção, mas não liderou uma campanha contra a corrupção”, criticou Gabeira à IPS. “Entretanto, dentro do governo há forças muito poderosas que não querem que este movimento contra a corrupção se desenvolva”, disse o ex-deputado se referindo a partidos e políticos aliados que “se formam na perspectiva não só do poder, mas também de enriquecer”.
E Gabeira não tem muitas esperanças. “A presidente até agora parece dividida entre sua base aliada – comprometida com a corrupção – e as necessidades do país, sobretudo agora que temos pela frente uma crise econômica internacional”, disse o dirigente do PV. Por este ponto de vista, a ideia que prevalece dentro do PT é que o importante é crescer e distribuir a riqueza, com se está fazendo, e nesse contexto a corrupção é apenas “um efeito colateral”. Gabeira comparou o Brasil com a Índia, onde se fortalecem os movimentos éticos. O Brasil também precisa encarar essa luta, acrescentou. “Compreendemos que a corrupção é um obstáculo para que Brasil e Índia ocupem seu espaço econômico no mundo”, afirmou.
Um estudo da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) afirma que o Brasil perde entre 1,38% e 2,3% de seu produto interno bruto anual por causa da corrupção. O estudo, de março de 2010, calcula que com essa riqueza, entre US$ 26 bilhões e mais de US$ 43 bilhões ao câmbio atual, seria possível incorporar mais 16,4 milhões de alunos às escolas públicas, distribuir eletricidade a 24,6 milhões de pessoas ou levar saneamento a 23,3 milhões de domicílios. Envolverde/IPS
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