Intervenção federal no DF é urgente

A situação política do Distrito Federal (DF) beira o insustentável. O ex-governador e atual presidiário José Roberto Arruda foi afastado do cargo e de seu partido, o DEM, por chefiar um esquema de corrupção que envolvia empresas com contratos públicos e deputados da Câmara Distrital.

Como já escrevi por aqui, quando estourou o caso, todo esse esquema, segundo consta nas investigações da Polícia Federal, já maquinava no governo anterior, de Joaquim Roriz (PSC). Muitos dos envolvidos no caso Arruda já pertenciam ao esquema no governo Roriz. Ou seja, no Distrito Federal, basta ligar uma câmera que, ao vivo e sem atores profissionais, é possível gravar uma bela pornochanchada.

Arruda não é flor que se cheire. Foi eleito senador pelo PSDB, em 1994, aproveitando a onda pró-Real, que elegeu Fernando Henrique Cardoso (PSDB) presidente da República. Ao longo de seu mandato, trocou o PSDB pelo PFL, que pertencia à base do governo, tendo o vice (Marco Maciel) e boa parte do Senado nas mãos. Foi como senador pelo PFL que Arruda participou do lamentável episódio do "painel do Senado", quando violou a votação secreta que selou a cassação de Luiz Estevão. Num primeiro momento, negou o crime. Depois, confessou e renunciou ao cargo para não ser cassado, em 2001.

Pois um ano depois o mesmo sujeito foi eleito deputado federal pelo PFL. Como se não bastasse, ao final de seu mandato, lançou-se candidato ao governo do DF -- e ganhou. Passou a ser, desde 2007, o único governador brasileiro filiado ao PFL, que mudara de nome para Democratas (DEM). A partir de 2007, imprimiu uma política realmente suprassumo de quem defende superávit no serviço público: demitiu servidores, cortou gastos, ampliou repasses à iniciativa privada. Assim, passou a ser louvado como um "grande gestor público".

O mesmo responsável pela quebra de sigilo do painel do Senado, que mentiu frente aos senadores, que renunciou para não ser cassado, passou a dar exemplo. Não deu outra. O esquema de repasses à iniciativa privada foi claramente sustentado pela delinquência gerencial e ética. Arruda usava dinheiro de empresas privadas com contratos públicos -- muitos conquistados sem licitação, o que é crime -- para pagar propina à deputados na Câmara Distrital.

Na semana passada, 11 de fevereiro, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou a prisão preventiva de Arruda e outos quatro envolvidos numa tentativa de suborno de um jornalista para que este atuasse no encobertamento do caso. O STJ também afastou Arruda do cargo de governador do DF.

Assim, as portas ficaram abertas para Paulo Octávio (DEM), vice-governador.

Paulo Octávio era o sujeito que o PFL (atual DEM) ia lançar candidato ao governo do DF nas eleições de 2006. Empresário, muito rico, boa pinta e bem relacionado, era o cara ideal para um partido como o PFL. De última hora, selou-se um acordo, costurado por Arruda, que definia Arruda como cabeça de chapa e Octávio como vice, em 2006, composição que seria invertida em 2010. Ou seja, não fosse essa bomba, se o acordo fosse cumprido -- estamos tratando de pessoas com passado de mentiras, então sempre é preciso fazer essa ressalva -- o DEM lançaria Paulo Octávio governador e Arruda como vice. Estava tudo certo, uma vez que Arruda fez o governo bonitinho da elite que acha que governo bom é aquele que não gasta, não paga salários e transfere obrigações para a iniciativa privada. Emplacar Octávio, empresário bem sucedido, nesta campanha seria fácil.

O caso Arruda, no entanto, não explodiu com o esquema. Paulo Octávio, afinal, é o atual governador do DF.

Mas lembram-se de como funcionava o esquema de Arruda, herdado de Roriz? Eram empresas que ganhavam contratos do governo e, por meio dessa relação, se estabelecia uma relação de propinas que, não apenas garantiam os contratos, mas também bancavam as contas de deputados e membros do governo. Pois Paulo Octávio foi beneficiado duplamente do esquema. Eleito vice-governador em 2006, não deixou a gestão de suas empresas de comunicação e publicidade, sediadas no DF.

Assim, entre 2007 e 2009, as empresas de Paulo Octávio selaram o equivalente a R$ 10,4 milhões em contratos com o governo. Vejam que falcatrua bisonha: empresas do vice-governador fecharam contratos com o governo!

Insisto com minha tese antiga. Num país desses, não precisamos de Millör Fernandes, Jaguar, Henfil, Angeli, Jean ou qualquer grande humorista ou chargista. A piada é a vida real.

A Lei Orgânica do DF não prevê crime no fato de membros do governo continuarem tocando empresas durante o exercício. OK, mude-se a Lei, que está errada. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, protocolou no Supremo Tribunal Federal (STF) um pedido de intervenção no Distrito Federal. Se o pedido for acatado, o DF poderá se tornar a primeira unidade da federação brasileira a ser alvo de intervenção federal em tempos democráticos.

Seria um avanço.

Não apenas o atual governador Paulo Octávio está comprometido no esquema que levou José Roberto Arruda à cadeia, como o candidato da "oposição" nas eleições deste ano é Joaquim Roriz! A situação no DF é de descontrole político e ético, algo inaceitável num país que anseia alcançar a modernidade política. Aliás, se a turminha conservadora dos rincões nacionais for coerente com seu discurso de "é preciso manter a ordem", fará força para o governo federal intervenha no DF porque não há qualquer possibilidade de existir ordem numa situação em que o governador eleito em 2006 está preso; seu vice está envolvido no esquema; nada menos que oito dos 24 deputados da Câmara Legislativa estão envolvidos, bem como membros do governo; e o candidato que lidera as pesquisas é o cara que criou toda essa parafernália corruptiva.

Algo precisa ser feito no DF. Até porque, trata-se de um município lamentavelmente bisonho dentro de nosso desenho político: funcionários ligados ao governo ganhando salários de R$ 20 mil ou R$ 30 mil reais (mais, quando alcançamos a rapaziada do Congresso) convivendo com gente que ganha o Bolsa Família. Qualquer um que conheça Brasília além dos bairros bonitinhos da elite público-privada sabe do que estou falando.

É preciso ser enfático: intervenção federal já.
 

 
http://joaovillaverde.blogspot.com/2010/02/intervencao-federal-no-df-e-urgente.html
 
*João Villaverde é formado em jornalismo pela PUC-SP, iniciou vida de blogueiro em dezembro de 2006 com blog no iG, onde escreveu até junho de 2008, quando passou para o servidor atual. Escreveu para o jornal Contraponto entre fevereiro de 2006 e dezembro de 2009. Tem 22 anos e é repórter da editoria Brasil do jornal Valor Econômico, em São Paulo. Importante lembrar que as opiniões aqui expostas nada tem a ver com o jornal e são de responsabilidade única e exclusiva do autor.
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