Monopólio da comida: mais fome e desnutrição

Mais do que nunca, a rebelião no campo se justifica.

As terras aráveis estão cada vez mais concentradas em poder das transnacionais do setor alimentício, a despeito da hipocrisia e ineficácia que marcam o Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas e das Ongs que falam em "segurança alimentar" e correm atrás de fundos emergenciais ao mesmo tempo em que são financiadas pelos Estados burgueses, maiores amigos dos latifúndios. Enquanto isso, a chamada "crise alimentar" se agrava. A disponibilidade de comida no mundo é a menor em 20 anos, com um bilhão de pessoas sem ter o que comer, e três milhões em estado de desnutrição, segundo dados da própria ONU.

Os monopólios e seus fiéis gerentes instalados nas burocracias estatais atribuem a culpa ao inexorável: secas, enchentes e fenômenos que tais. Mas a tragédia da fome é mais uma infâmia de natureza capitalista, de responsabilidade mais especificamente das monoculturas, do latifúndio de velho e do de novo tipo, também chamado "agronegócio", que exaure a terra e ocupa as vastas extensões rurais que seguem fora do alcance das falsas reformas agrárias arquitetadas pelos oportunistas de plantão.

Os monopólios do setor de alimentação riem-se dos famintos, e seguem crescendo cada vez mais, por meio de fusões, aquisições e verticalizações. Participando desse processo está a transnacional de origem brasileira Friboi, que depois de dominar o mercado mundial de carne in natura, agora se voltará para o mercado de produtos industrializados. É o capital concentrado controlando cada vez mais toda a comida do mundo, do campo às prateleiras dos mercados. A ianque Cargill e a holandesa Bunge fizeram o mesmo depois de controlarem o mercado mundial de produtos agrícolas. Em outra transação monopolista, a maior transnacional ianque do setor de doces e biscoitos, Kraft Foods, ofereceu US$ 16,7 bilhões pela britânica Cadbury.

Enquanto abre os cofres para reforçar sua posição no monopólio global da comida, a ianque Kraft Foods vai contribuindo para a precarização das condições de vida dos trabalhadores nas semicolônias. Na Argentina, no final de agosto, a gerência da empresa colocou 160 pessoas no olho da rua — incluindo toda a comissão de fábrica e três delegados do sindicato da alimentação — na sequência de um movimento para reivindicação de melhores condições para os funcionários se protegerem do vírus H1N1 no ambiente de trabalho. Todas trabalhavam na antiga Terrabusi, empresa comprada pela Kraft em 2000, em mais um capítulo da sanha monopolista dessa trans, e tudo com a anuência do Estado semicolonial argentino.

A empresa tem na gaveta desde a década de 1990 um plano de reestruturação das suas filiais na América Latina, e agora viu na crise geral de superprodução relativa do capitalismo a oportunidade para colocá-lo em prática. Com o desemprego em alta e a licença para demitir concedida pelas gerências políticas alegadamente por causa da crise, os capatazes engravatados contavam com uma fragilização dos trabalhadores, esperavam-nos menos organizados e, portanto, menos resistentes. Os despedidos, no entanto, não se resignaram ou baixaram a cabeça e foram para casa. Nem tampouco os companheiros de chão de fábrica deram de ombros para seu infortúnio. Unidos e munidos de ânimo inquebrantável, bloquearam a principal estrada da Argentina, a rodovia Pan-Americana, e ocuparam a fábrica.

No dia 25 de setembro, com a cumplicidade do ministério argentino do Trabalho e do judiciário portenho, a Kraft conseguiu jogar as forças estatais de repressão contra os trabalhadores em luta. A título de cumprir uma ordem de reintegração de posse, até mesmo a polícia montada foi usada em brutal episódio de truculência contra o povo e em favor do capital.

O Estado semifeudal argentino mandou a polícia espancar e atirar nos grevistas depois que um vice-ministro do Trabalho do governo Cristina Kirchner fez um conchavo com a transnacional, trombeteando a promessa de que mais ninguém seria demitido como solução para o questão da ex-Terrabusi, sem menção alguma à reintegração dos 160 demitidos. Foi a desculpa para a justiça argentina considerar a ocupação da fábrica ilegal e ordenar o início da repressão. Agora, os poderes executivo e judiciário da Argentina vêm acertando aos poucos com a Kraft os termos da conciliação obrigatória que pretendem impor.

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