Os trabalhadores merecem respeito

Embora sejam inegáveis os avanços nas relações trabalhistas e na consciência da sociedade quanto à igualdade de direitos e deveres entre todos os cidadãos, independentemente de gênero, raça, ideologia e religião, persistem manifestações lamentáveis de discriminação. É o que se observa, por exemplo, nos casos de defasagem salarial de mulheres e negros. Há, ainda, aqueles que discriminam toda a classe trabalhadora, numa atitude de preconceito por atacado, imputando-lhe a incapacidade de administrar e de ser proba na gestão de recursos financeiros. Por mais constrangedor que seja aos brasileiros, comportamento de tal pequenez manifestou-se amplamente em nosso País, no recente episódio da sanção presidencial à lei que regulamentou as centrais sindicais. O veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao artigo 6º, impedindo que os recursos advindos da contribuição sindical fossem fiscalizados pelo Tribunal de Contas da União (TCU), causou verdadeira alergia fascista a alguns arautos do elitismo. Suas declarações foram de fazer inveja aos antigos integralistas...

O mais curioso é que muitas das reações ao veto presidencial partiram de parlamentares ditos liberais ou social-democratas, que usam sem qualquer explicação suas polpudas verbas de gabinete e representação. Por outro lado, esses políticos, até pelo cargo que ocupam, não têm o direito de ignorar a Constituição Federal, que é clara no tocante à matéria: o artigo vetado é o 6º, e ele viola o inciso I do art. 8º da Carta Magna, que veda ao poder público a interferência e a intervenção na organização sindical, em face do princípio da autonomia sindical, o qual sustenta a garantia de autogestão às organizações associativas e sindicais.

Felizmente, o País tem mentes lúcidas, avançadas e pluralistas, que analisam com isenção situações como essa. É o caso do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, que qualificou de acertada a decisão de Lula, observando o seguinte: "Nunca os sindicatos tiveram de se submeter ao Ministério do Trabalho ou ao TCU, pois quem deve fiscalizá-los são os próprios trabalhadores. Da mesma forma, ocorre com a OAB. Os que defendem a sua submissão buscam, na verdade, atingir a sua autonomia e colocar uma mordaça na entidade representativa da sociedade civil".

De fato, não se pode admitir a interferência em organizações livres, no contexto das democracias. Os sindicatos e as centrais sindicais representam com legitimidade milhões de trabalhadores, que são responsáveis pela gestão de suas entidades. Não se pode, por preconceito, discriminação ou anacrônico proselitismo de uma falsa elite, roubar-lhes essa prerrogativa, absolutamente inalienável.

O movimento sindical demonstra sinais de maturidade, como evidencia o desenvolvimento de algumas entidades. No Brasil a união da CGT (Confederação Geral dos Trabalhadores), CAT (Central Autônoma de Trabalhadores) e SDS (Social Democracia Sindical) deram origem a UGT (União Geral dos Trabalhadores). Nas Américas a CSA (Confederação Sindical das Américas) foi criada pela fusão da CLAT (Central Latino-Americana de Trabalhadores) e ORIT (Organização Regional Interamericana de Trabalhadores) e mundialmente pode-se citar a CSI (Confederação Sindical Internacional), resultado da unificação da CIOSL (Confederação Internacional Organizações Sindicais Livres) e CMT (Confederação Mundial do Trabalho), como exemplo de evolução das centrais sindicais, representando mais de 400 milhões de trabalhadores.

Nossa Constituição está completando 20 anos em 2008. A despeito de suas imperfeições e da necessidade de emendas capazes de reformá-la de modo a remover obstáculos ao crescimento econômico, há algo inegável: no plano dos direitos individuais e coletivos e do respeito às prerrogativas da cidadania, a Carta Magna é uma das mais avançadas do mundo. Neste aspecto, é inexpugnável guardiã das consciências e da legalidade, ante o anacronismo, arrogância e preconceito de alguns pavões da República. 

*Antonio Carlos dos Reis "Salim" é presidente do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo (Stieesp) e da Federaluz e vice-presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT).


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