Ex-executivos da Petrobras vão à iniciativa privada

Empresas rivais da estatal contratam profissionais com conhecimento e experiência adquirida na maior companhia do País

Do desacreditado começo da exploração petrolífera no País às promissoras reservas do pré-sal, a Petrobras assumiu o papel de universidade para milhares de profissionais. Por décadas, os cursos necessários à formação de técnicos e executivos no setor de petróleo existiram apenas nas salas de aula da companhia. O processo de capacitação dentro da petroleira resultou na Universidade Petrobras, que treina por dia cerca de mil pessoas no Rio, São Paulo e Salvador.
Com a quebra do monopólio estatal e o crescimento acelerado da produção de petróleo nos últimos anos, empresas privadas ingressaram nas atividades do setor com apetite por profissionais experientes, naturalmente formados pela Petrobras.
O iG ouviu nove dos vários executivos que, aposentados ou não, migraram da Petrobras para a iniciativa privada. Alguns abriram o próprio negócio, outros foram chamados para dirigir empresas, brasileiras ou multinacionais. Ricos, respeitados e influentes no mercado, eles não se esqueceram da origem e atribuem o sucesso na carreira aos degraus que subiram na estatal.
 
Rodolfo Landim: o executivo que ajuda a formatar empresas para Eike Batista
Quando recebeu o convite do empresário Eike Batista para comandar a mineradora MMX, em abril de 2006, Rodolfo Landim já tinha sido chamado por Abilio Diniz para a rede de supermercados Pão de Açúcar. A disputa pelo passe do executivo aconteceu duas semanas após o engenheiro ter deixado a Petrobras, na qual trabalhou por mais de 20 anos. “Eu tinha um compromisso moral com o Abilio, mas ele me liberou desse compromisso”, afirma Landim ao iG.
Rodolfo Landim começou a trabalhar na empresa de mineração de Eike Batista em maio daquele ano com a missão de abrir o capital da companhia. Ajudou também a preparar a venda de ativos da MMX para a anglo-sulafricana Anglo American, anunciada no início de 2008. A operação foi um sucesso: rendeu ao grupo cerca de US$ 5,5 bilhões. Como detinha parte das ações da empresa, Landim teria ficado milionário com a operação. Enquanto o negócio com a multinacional se concretizava, ele assumia outro desafio: montar a OGX, empresa de petróleo de Batista. Mal concluiu a tarefa, o executivo foi chamado por Eike a presidir mais uma de suas empresas. Desde o fim do ano passado, Landim é presidente da OSX, empresa de estaleiros do grupo EBX.
“Passei pela escola de montar projetos na Petrobras; ela ensina isso para as pessoas”, diz. Landim foi gerente-geral de Exploração e Produção e presidiu a Gaspetro, subsidiária da Petrobras. A gratidão demonstrada pela Petrobras, Landim expressa também ao falar do chefe. “Gosto dos desafios, do estilo do Eike", diz. "Ele é um cara muito corajoso, tem tino, tem vontade”.  
 
Márcio Mello: terceira maior empresa no setor de petróleo

Conhecido no mercado como um dos geólogos que mais conhece pré-sal, Márcio Mello prestou serviços para as maiores empresas de petróleo atuantes no País. Em 2004, quatro anos depois de ter deixado a Petrobras, Mello comandava 1,8 mil funcionários distribuídos nas três empresas de análise de dados geológicos e geofísicos que fundou com outros investidores. “Me aposentei e aproveitei a abertura do setor com a criação de três empresas”, diz.
No fim do ano passado, Mello anunciou a criação da HRT Oil and Gás, sua empresa de exploração e produção de petróleo. Investidores bilionários teriam se associado a Mello na iniciativa, segundo fontes. O próximo passo, conforme ele antecipa ao iG, é abrir o capital da companhia, operação prevista para acontecer neste semestre. Segundo ele, a HRT nasceu como a terceira maior empresa brasileira do setor em ativos, com 21 blocos exploratórios - atrás apenas de Petrobras e OGX.
“Tive formação privilegiada na Petrobras, a chance de trabalhar numa das empresas que mais capacitam pessoas no mundo”, afirma. Foi com apoio da estatal que ele concluiu mestrado e doutorado em Geoquímica na Universidade de Bristol, na Inglaterra. Em 1995, foi designado pela Petrobras a criar o centro de Excelência em Geoquímica. Foi lá que começou a analisar o que ele chama de DNA do petróleo.
 
Rogério Manso: nova função em Nova York
Vice-presidente da Brenco até sexta-feira, dia 16, quando a empresa concluiu a fusão com a ETH Bionergia, do grupo Odebrecht, Rogério Manso já têm novas opções de trabalho. Uma delas está sendo tratada em Nova York, de onde o executivo conversou com o iG por telefone. Manso terá de escolher entre a carreira de executivo ou a de empreendedor de um projeto próprio. Na nova empresa criada a partir da fusão, a diretoria da Brenco será substituída mas os executivos continuam como investidores, inclusive Manso.
Ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Rogério Manso se aposentou da estatal em fevereiro de 2007 e aceitou convite para desenvolver o projeto que planejava criar R$ 2 bilhões em usinas, maquinário e plantio, em menos de três anos. A empreitada originou a Brenco, que, associada à empresa da Odebrecht, formou a maior companhia de etanol do mundo, com apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
“Na Petrobras eu já tinha completado meu ciclo”, afirma Manso, engenheiro civil de formação. Depois de comandar a diretoria que responde por praticamente todo fornecimento dos combustíveis no País, como diretor da estatal, ele voltou a ser gerente, em 2004, na área de comercialização de gás e energia da Petrobras. Antes de assumir cargos de chefia na área de abastecimento, morou por quase 15 anos em Nova York, onde fez vários cursos pagos pela estatal.
Depois de 28 anos na Petrobras, Manso foi convidado por Philippe Reichstul a integrar a equipe da Brenco. O fundador da empresa de etanol, por sua vez, foi presidente da Petrobras de março de 1999 a janeiro de 2002. No ano passado, Manso se tornou sócio da Brenco.
 
João Carlos de De Luca: representante das petroleiras
João Carlos De Luca herdou muitos predicados da Petrobras, mas também deixou um legado na estatal. Ele se responsabilizou pelo sucesso ou fracasso da empresa na exploração de petróleo em águas profundas, em 1990. Foi De Luca que convenceu a diretoria de Exploração e Produção da empresa a ousar na prospecção de óleo com a introdução de tecnologias para profundidades superiores a 500 metros.
“Argumentei que estava absolutamente seguro do sucesso da operação, pois havia tido a oportunidade de acompanhar de perto todos os avanços feitos nessa área, conhecia os detalhes técnicos envolvidos na operação, conhecia a capacitação dos técnicos envolvidos, e se nós não o fizéssemos, nenhuma outra empresa naquele momento poderia fazer”, disse ao iG. “Disse ainda que se algo desse errado, a responsabilidade seria minha, já que estava à frente da área de E&P, e poderia ser devidamente responsabilizado pelo eventual fracasso.”
A Petrobras aprovou o projeto, com a perfuração de um poço em Marlim, na Bacia de Campos. Anos depois, o campo se tornou um dos maiores produtores de petróleo do País, ao lado do campo vizinho, Albacora. “Foi uma das maiores alegrias que tive em toda a minha carreira profissional”, diz.
De Luca presidiu por dez anos a espanhola Repsol, depois de 25 anos na Petrobras. Saiu da estatal em 1998, quando o governo quebrou o monopólio na exploração de petróleo no País. Hoje, além de sócio da Lupatech Oilfield Services, preside o Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), que representa as petroleiras.
 
Paulo Mendonça: o geólogo de Eike Batista
Um dos expoentes do grupo empresarial de Eike Batista, o geólogo Paulo Mendonça trabalhou 34 anos na Petrobras. O último cargo que exerceu na estatal, de gerente-executivo de Exploração e Produção, despertou o interesse da EBX. Mendonça foi convidado a integrar a equipe da OGX, então comandada por Rodolfo Landim. Com a saída de Landim da OGX para outra área do grupo, Mendonça assumiu o comando da empresa de petróleo de Eike.
“A Petrobras teve importância fundamental na minha formação tanto técnica-gerencial quanto pessoal", diz. "Como foi uma empresa criada de maneira pensada, aproveitando o que de melhor havia em termos de organização das grandes empresas petrolíferas da época, ela se desenvolveu baseada no binômio corpo técnico capacitado e tecnologia.”
Formado em Geologia pela Universidade de São Paulo, Mendonça, nascido em Portugal, atuou como gerente de exploração na área internacional, na qual comandou operações para países das Américas e Oriente Médio. Também foi gerente-geral da bacia de Sergipe-Alagoas, até se tornar, em 2002, gerente-geral de Exploração e Produção. Em 2004, assumiu a gerência-executiva do mesmo setor.
 
Murillo Marroquim: com venda da Devon, atrás de novas oportunidades
Após 23 anos de trabalho na Petrobras, Murillo Marroquim passou pela IBM, foi consultor do grupo Ipiranga, até ser chamado para presidir a petroleira Ocean Energy. A empresa foi comprada pela Devon Energy. Marroquim passou então a comandar a subsidiária da empresa americana no Brasil, explorando petróleo na Bacia de Campos.
 Com a venda da Devon para a British Petroleum (BP) em março, Marroquim se prepara para iniciar um novo ciclo da sua vida profissional.
“A Petrobras foi essencial na minha formação profissional" , diz. "Além dos vários cursos realizados na área de geofísica, pude fazer pós-graduação em geofísica”, afirma.
 
Wagner Freire: espaço para pequenas e médias empresas

Diretor de Exploração e Produção da Petrobras nas décadas de 1980 e 1990, Wagner Freire adquiriu experiência suficiente para abrir sua própria empresa de petróleo em 1999, um ano depois da abertura do mercado no setor de petróleo. A Starfish, empresa criada por Freire, arrematou blocos de petróleo nos leilões de petróleo da Agência Nacional do Petróleo (ANP).
Freire deixou a Starfish em 2005 para assumir outra companhia, a Silver Marlim. Hoje atua como consultor independente e representa a Associação Brasileira de Produtores Independentes de Petróleo (Abepip), pela qual defende mais espaço para as empresas de pequeno e médio porte no setor.
Uma das bandeiras erguidas por Freire vai contra a postura da estatal, de manter blocos poucos produtivos em vez de devolvê-los para a União. O objetivo é deixar que as pequenas empresas possam explorar campos maduros, menos lucrativos para a Petrobras.
 
Luiz Carlos Costamilan: da BG para empresa própria
O engenheiro mecânico Luiz Carlos Costamilan avalia que a Petrobras construiu a base de sua carreira. Em 23 anos trabalhando na estatal, ele assumiu posições importantes na área de produção de petróleo no Espírito Santo, Sergipe e Alagoas. Também trabalhou em subsidiárias da Petrobras no exterior. “Durante a permanência na Petrobras, sempre surgiam desafios, um atrás do outro”, diz.
A experiência lhe rendeu convite para presidir a British Gas (BG), companhia de petróleo inglesa que se associou à Petrobras na exploração de importantes blocos do pré-sal de Santos. Costamilan deixou a presidência da multinacional e criou a sua própria empresa de consultoria, Energia do Rio.
 
Oswaldo Pedroza: da estatal para a agência regulatória
Formado em engenharia de Petróleo na Bahia, Oswaldo Pedroza fez carreira no Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello (Cenpes), laboratório no qual a Petrobras investe em tecnologia de ponta. Aposentou-se após 25 anos na estatal, para assumir a superintendência de desenvolvimento de Produção da Agência Nacional do Petróleo (ANP).
Pedroza deixou a agência reguladora e criou a Aurizônia Petróleo, empresa independente que prospecta pequenos blocos de petróleo em terra. Também defende a causa das companhias de menor porte do setor, que reivindicam mais áreas disponíveis para a produção.
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