Processo nº: 2006.010.000489-2

TCU INVESTIGA CIDADES NO RJ:
VEREADORES FAZEM O QUE QUEREM COMO O DINHEIRO DO POVO 

Processo nº: 2006.010.000489-2
Movimento: 27
Tipo do movimento:
Conclusão ao Juiz


Decisão :
O representante do Ministério Público interpôs Ação Civil Pública cumulando pedidos declaratórios de nulidade de atos jurídicos (lato sensu) viciados com condenação de seus autores e beneficiários pela Improbidade Administrativa. Requer concessão liminar do pedido ´para que sejam cessados os recebimentos indevidos (verba de custeio, gratificação natalina, 14º e 15º salários) por parte dos vereadores´, com fundamento nos artigos 127 e 129, III e IX da Constituição Federal; art. 25 da LONMP; art. 34, VI, a, da Lei Orgânica do Ministério Público Estadual (LC nº 106/03); artigos 1º, II, e 5º da Lei 7.347/85; e, art. 17 da Lei 8.429/92, contra atos que reputa viciados, ilegais, imorais, inconstitucionais e ímprobos praticados pela Câmara Municipal de Bom Jesus do Itabapona/RJ e pelos Vereadores e/ou Ex-vereadores: Ralph Pimenta Gomes, Paulo Roberto Pimentel, Samuel Júnior Soares de Aguiar, Bill Carlos Manhães, João Marcos de Souza, José Luiz Rezende do Carmo, Clério Tadeu da Silva, Celso de Rezende Teixeira, Luciano de Souza Nunes, Valdevi da Silva Ramos, Carlos Ney Costa Pires, João Batista Chaves Magalhães, Paulo Sérgio Texeira de Oliveira, Regina Célia Ribeiro Couto, José Roberto Mota, Sebastião Ferreira Vieira, com base nos seguintes fundamentos assim resumidos: I) A Emenda Constitucional n. 19/1998, ao incluir o §4º ao art. 39 da Constituição Federal, estabeleceu o princípio de que os membros de poder, detentores de mandato eletivo, Ministros de Estado e Secretários estaduais e municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verbas de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI. II) Apesar dessa proibição, os vereadores municipais, além da remuneração estipulada, recebem valores adicionais (´acréscimo à remuneração´), em cujos títulos incluem-se ´verbas de custeio´ (combustível, telefone celular, postagem de correspondência, diárias por eventuais viagens em desempenho de mandato) com nítida natureza remuneratória, pois os gastos são de cunho pessoal, em especial as despesas de combustível - levando em consideração o tamanho do Município - e de telefone. III) Tal ´benéfico´ - verba de custeio - é ilegal, pois não tem fomento jurídico diante o § 4º do art. 39 da Constituição Federal, não justificando o recebimento por todos os vereadores da importância de R$1.700,00 (um mil e setecentos reais). Ademais, há excesso do limite individual de pagamento (subsídios) aos vereadores estabelecido no art. 29, VI da Constituição Federal. IV) O ´benefício´ é imoral e exorbitante, pois em pouco tempo a verba de custeio foi criada, duplicada e quadruplicada através das Resoluções 648/2001, 657/2001 e 710/2005, respectivamente. Ademais, o pagamento mensal daquela importância para cada vereador é feito independente de requerimento administrativo e vem sendo efetuado sem preocupação constante de se verificar se as despesas realmente foram assumidas em prol da sociedade. V) Além daquele valor, os vereadores ainda estão sendo beneficiados indevidamente com as seguintes verbas, que o autor relaciona: 5.1) gratificação natalina; 5.2) 14º salário; 5.3) 15º salário. VI) Afirma o autor ser também imoral essa prática administrativa de acrescerem adicionais aos subsídios dos vereadores, pois somente a soma do subsídio dos vereadores com a verba de custeio já eleva os seus salários acima do teto definido pelo art. 37, XI, da CF/88. VII) Acresce que a proporção dos aumentos dos adicionais agride a regência do princípio da proporcionalidade ou razoabilidade, implícitos na Constituição Federal. Invocado ainda o princípio da economicidade (art. 70 da CF) e da legalidade. VIII) Aponta prática de ato de improbidade cometida pelos vereadores e ex-vereadores que participaram na elaboração e votação de ato ímprobo (Resoluções) e que deles tenham se beneficiado direta ou indiretamente, pois haviam o dever jurídico de recusar qualquer tipo de benefício inconstitucional e não fizeram, devendo assim responder por seus atos, nos termos do artigo 3º da Lei 8.429/92. IX) Salienta a necessidade de reposição de valores ao erário, ainda que não se considerar caracterizado o ato de improbidade administrativa. X) O periculum in mora decorreria, segundo o autor, do prejuízo ao patrimônio público, salientando que com o passar do tempo torna-se cada vez mais difícil a recuperação, em favor do erário, das verbas públicas ilicitamente despendidas. O autor formula, em conseqüência, os pedidos constantes às fls. 50/55: a) Em caráter liminar requereu a limitação da remuneração dos vereadores ao subsídio mensal, fixado em parcela única, abstendo-se de realizar pagamentos de qualquer vantagem pecuniária (verba de custeio e gratificação natalina), bem como, no pagamento dos subsídios excedentes ao número de meses do calendário anual. Ou, subsidiariamente, que todo e qualquer pagamento excedente seja depositados em conta bancária a ser aberta por determinação do Juízo; b) confirmação do provimento antecipatório; c) para ver declarado nulas as Resoluções 648/01, 657/01 e 710/05 e, conseqüentemente, a condenação à devolução, pelos co-réus, de todos os valores recebidos ilegalmente, devidamente corrigidos; d) para ver declarado nulos todos os pagamentos realizados em benéfico dos vereadores a título de gratificação natalina, desde junho de 1998 (EC nº 19), e, conseqüentemente, a condenação à devolução, pelos co-réus, de todos esses valores aos cofres públicos; e) para ver declarado nulas todas parcelas de subsídios pagas aos vereadores que exorbitaram o número de meses do calendário anual, devendo também ser condenado os co-réus à devolução desses valores aos cofres públicos; f) condenação dos agentes políticos por improbidade administrativa nos termos do art. 9º c/c art. 12, inc. I; art. 10 c/c art. 12 inc. II; art. 11 c/c art. 12, III da Lei 8.829/92; g) em caráter subsidiário ao pedido de não reconhecimento do ato de improbidade administrativo, requereu-se a condenação dos agentes políticos ao ressarcimento dos danos materiais ao erário público; h) em caráter subsidiário ao não reconhecimento do pedido de nulidade do pagamento relativo à ´verba de custeio´, requereu-se o reconhecimento da desproporcionalidade, de modo que vigore apenas o quantitativo definido na resolução nº 648/01, e ainda, que a Câmara Municipal se abstenha a majorar os valores definidos naquela resolução. Instruiu a inicial com os documentos de fls. 56/247. Citados, os réus contestaram conforme consta às fls. 262/279, juntando documentos de fls. 280/415; e, às fls. 417/426, juntando documentos de fls. 427/440. Manifestação do representante do MP às fls. 443/444 pugnando pela apresentação da defesa preliminar em razão da cumulação da ação civil pública com pedidos típicos de ação de improbidade administrativa. Anulado o feito a partir da decisão de fls. 249-v, conforme decisão de fls. 445. Ou seja, anulou as citações, pois não foram os réus notificados previamente para apresentarem a defesa preliminar. Notificado o Município para se manifestar na forma do art. 17 § 3º da Lei 8.429/92, quedou-se inerte, não se posicionando como litisconsorte, deixando de intervir no processo, conforme certificado às fls. 467. Intimados os co-réus para apresentarem a defesa preliminar, os mesmos ratificaram os argumentos lançados na peça de fls. 456/457, em especial o que consta no item 26 (fls. 275/276). Assim, a justificação preliminar, consistiu: I) Nos termos do item 26 (fls. 275/276) - sustentam os réus que nenhum dos dispositivos da lei de improbidade se amolda à conduta dos réus, pois: a) não auferiram vantagem patrimonial indevida, posto que a percebida era devida por força de lei e atos do Tribunal de Constas do Estado; b) nada incorporaram ao seu patrimônio, pois os subsídios constituem retribuição e a indenização reembolso de despesas; c) não houve perda patrimonial, desvio apropriação, malbaratamento ou dilapidação de bens; d) a despesa com os subsídios estava e está autorizada por lei, resolução e atos do Tribunal de Contas; e) não houve violação aos princípios a que está subordinada a Administração, pois o recebimento se fez com base em atos perfeitos, certos que a Câmara tinha e tem atribuição para praticá-los. II) Na argüição de ilegitimidade ativa, pois o MP não tem legitimidade para o controle da constitucionalidade da Resolução 648/2001 e de suas modificações, sustentando que a nulidade desses atos resulta em implícita declaração de inconstitucionalidade. Salienta que a Resolução, como norma jurídica, tem função legislativa (interna corporis) tendo sido obedecido às regras da Constituição Federal, Estadual e da Lei Orgânica Municipal. III) ilegitimidade passiva, em relação ao réu José Roberto Mota, pois não atuou como vereador no município de Bom Jesus do Itabapoana entre o período de 01/01/2001 a 31/12/2004, não participando da Resolução nº 648 de 15/01/2001, nem recebeu as indenizações que o autor aponta como ilegais. IV) Prescrição, pois a pretensão anulatória refere-se à Resolução 648 de 15/01/01, ou seja, há mais de 05 (cinco) anos, devendo prevalecer a regra do art. 189 do CC, aplicação analógica do art. 21 da Lei nº 4.717/65. De igual maneira a decisão do Tribunal de Contas do Estado relativo aos subsídios que é de 1997. V) Decadência, pois os efeitos patrimoniais de correntes da Resolução 648/01, bem como o pagamento de 15 (quinze) subsídios, autorizado pelo Tribunal de Contas em 1997, ensejou a caducidade. VI) Sustenta ainda, a constitucionalidade da resolução, bem como sua legalidade, legitimidade e moralidade no recebimento das verbas, ressaltando a inexistência de ato de improbidade administrativa. Salienta que a verba autorizada pela Resolução 648/01 não é remuneratória, mas indenizatória, relativo às despesas inerentes ao exercício do mandato, inclusive aprovada pelo Tribunal de Contas do Estado e com concordância do representante do Ministério Público. VII) Não foi feita qualquer restrição das verbas no orçamento da Câmara. Ademais, sustenta que independe de lei especial para regularização da verba indenizatória, pois a Lei Orgânica de Bom Jesus do Itabapoana confere poderes à Câmara para que por meio de resolução, fixe os subsídios dos vereadores e decida sobre assuntos de economia interna. VIII) Foi observado o devido processo legislativo na elaboração da Resolução nº 648/2001, em observância ao princípio da legalidade, transparência e publicidade. IX) Quanto às 15 (quinze) parcelas de subsídio deu-se em decorrência da decisão do Tribunal de Contas, cuja nulidade não foi requerida nesta ação. X) Salienta que o projeto orçamentário do legislativo municipal e as suas contas foram aprovadas pelo Tribunal de Contas, salientando que somente em 2006 desvinculou a fixação dos subsídios dos vereadores à dos deputados estaduais, cumprindo a decisão daquele órgão, e, conseqüentemente, houve supressão das parcelas dos excedentes a doze. XI) Sustenta que a periodicidade no pagamento das verbas não lhe retira a natureza indenizatória, ressaltando que as despesas são constantes e satisfeitas mensalmente mediante a devida comprovação, não havendo fundamento para a alegação de que a verba indenizatória integra o subsídio. XII) Nenhum dos dispositivos da lei de improbidade administrativa se amolda a conduta dos réus eis que: a) não auferiram vantagem patrimonial indevida; b) nada incorporaram ao seu patrimônio; c) não houve perda patrimonial, desvio, apropriação, dilapidação de bens públicos; d) as despesas, bem como os subsídios estavam e estão autorizadas por lei, resolução e atos do Tribunal de Contas; e) não houve violação aos princípios a que está subordinada a administração. XIII) Incabível a restituição das importâncias pagas, pois não houve pagamento indevido, em virtude de vínculo legal e da orientação do Tribunal de Contas do Estado, mesmo em caso da resolução, em questão, viesse a ser declarada nula e ilegal, eis que os autores agiram de boa-fé, com a consciência de estarem agindo segundo a lei, aos princípios ético-jurídico. XIV) Reputa ser incabível a antecipação de tutela, pois a limitação de todo e qualquer pagamento de vantagem pecuniária aos réus, ou a imposição à Câmara Municipal em limitar a remuneração de seus membros violaria o princípio da independência e harmonia entre os Poderes. Dessa forma pugna pelo indeferimento da antecipação da tutela e pela extinção do processo por carência da ação, e que os pedidos sejam julgados improcedentes acolhendo os pedidos preliminares de mérito (prescrição e decadência). È o relatório. Passo a decidir. II) FUNDAMENTAÇÃO a)Do recebimento da peça inicial Já tendo as partes conhecimento do feito e do pedido da liminar torna-se possível a análise do pleito antecipatório. Porém, antes, deve-se atestar que estão preenchidos os requisitos da petição inicial (art. 282 CPC). Passa-se à analisar das condições específicas para admissibilidade da ação de improbidade administrativa, quais sejam: I - Descrição pormenorizada da prática do ilícito - a inicial sustenta que o §4º do artigo 39 da CF estabeleceu a forma de remuneração dos detentores de mandato eletivo (subsídios), estabelecendo vedações. Vedações essas que segundo o autor não forma observadas pelos vereadores, vindo os mesmo a receber valores adicionais (verbas de custeio), com nítida natureza remuneratória por ser os gastos de natureza pessoal. Além de ilegal há excesso do limite individual do pagamento dos subsídios. O benefício é imoral e exorbitante. O pagamento das verbas de custeio é feito sem qualquer requerimento administrativo e sem verificar se as despesas foram contraídas. Aponta ainda como pagamentos ilegais a gratificação natalina, 14º e 15º salários, por acrescer valores ao subsídios, ultrapassando o teto do artigo 37, XI da CF. II - Enquadramento em tipo legal do ato - conforme se verifica às fls. 51/52 o autor enquadra do ato ímprobo às penalidades dos artigos 9º, 10 e 11 da lei em questão, salientando que devido a subsunção da conduta dos requeridos a mais de um tipo da Lei de improbidade, deve incidir o conjunto de sanções mais graves, disposto em ordem decrescente, por força do ne bis in idem, ficando as penas mais leves absorvidas pelas mais graves. III - Demonstração de elementos que revelem o caráter doloso da prática do agente - segundo o autor tal caráter consiste na conduta dos vereadores/ex-vereadores em participar na elaboração e votação das resoluções nº 648/01, 656/01 e 710/05, incompatíveis com o texto constitucional, bem como benefícios de 13º, 14º e 15º salário, se beneficiado direta ou indiretamente, pois havia o dever jurídico de recusar qualquer tipo de benefício inconstitucional e não fizeram. As verbas e benefícios são imorais e exorbitantes, pois em pouco tempo a verba de custeio foi criada, duplicada e quadruplicada. O pagamento mensal das verbas para cada vereador é feito independente de requerimento administrativo e vem sendo efetuado sem preocupação de se verificar se as despesas foram realmente assumidas em prol da sociedade. Portanto, dolo, no caso em tela, consiste no favorecimento particular em detrimento do interesse público. Dessa forma, constatando presente os requisitos especiais, há de se receber a presente ação de improbidade, porém antes devem ser ultrapassadas algumas preliminares argüidas na defesa prévia, por uma questão de ordem lógica de enfrentamento, sendo certo que não haverá qualquer prejuízo ao princípio da ampla defesa. b) Da análise necessária das preliminares. I - Indevida cumulação das ações (ação civil pública e ação de impropriedade administrativa) e ilegitimidade ativa. A ação civil pública constitui um dos remédios mais importantes do Direito Brasileiro, por exercer no ordenamento jurídico instrumento típico de proteção jurisdicional dos interesses coletivo (sentido amplo). Por seu turno, o art. 127, da Constituição Federal, incumbe ao Ministério Público a defesa de interesses individuais indisponíveis (não trata da homogeneidade). Mais adiante, a Carta Magna, no art. 129, III, garante àquele órgão promover a Ação Civil Pública (ACP) para a proteção de outros interesses difusos e coletivos (sem referência aos interesses individuais homogêneos). O art. 17 da Lei 8.429/92, por sua vez, legitima o Ministério Público a mover demanda a respeito da improbidade administrativa. Dessa forma, Ministério Público tem legitimidade para propor demanda, inclusive, cumulando pedidos relativos à outra ação de cunho coletivo. Esse é o entendimento jurisprudencial e doutrinário, senão vejamos: TRF1-118026) AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRELIMINARES REJEITADAS. 1. Possibilidade de cumulação de ação de improbidade administrativa com ação civil pública e de pedidos, ainda que de cunho condenatório. 2. Tanto o art. 17 da Lei 8.429/92 como o art. 129, III, da CF legitimam o Ministério Público a ajuizar ação civil pública em defesa do erário. Carência de ação e impossibilidade jurídica do pedido que se afasta. 3. Estando a inicial nos moldes do disposto no art. 282 do CPC, narrando os fatos de forma a possibilitar a defesa dos réus, ainda que a responsabilização de cada um se afigure no decorrer da instrução processual, é de se afastar a alegada inépcia da inicial. 4. A decisão do Tribunal de Contas da União somente faz coisa julgada na esfera administrativa. 5. Agravo de instrumento desprovido. (Agravo de Instrumento nº 2001.01.00.035931-1/MG, 3ª Turma do TRF da 1ª Região, Rel. Des. Fed. Cândido Ribeiro. j. 24.10.2005, unânime, DJ 16.12.2005). 2001.002.03184 - AGRAVO DE INSTRUMENTO DES. MARIA AUGUSTA VAZ; Julgamento: 14/01/2003 PRIMEIRA CAMARA CIVEL ACAO CIVIL PUBLICA - IMPROBIDADE - LEGITIMIDADE DO M.P. - POSSIBILIDADE JURIDICA DO PEDIDO. Ação Civil Pública. Improbidade administrativa. Tem o Ministério Público legitimação para propor ação civil pública, que é a ação pertinente, na defesa do patrimônio público, com fulcro na disposição constitucional do art. 129, III, da C.F. Incidência da legislação infraconstitucional, Lei 8429/92. Presente está a possibilidade jurídica do pedido, pois a formulação tem respaldo, quer na norma constitucional, quer na infraconstitucional. Presentes estão todas as condições de procedibilidade da ação, estando correta a decisão que, ao conceder a liminar, afastou as preliminares de carência da ação. Decisão que se confirma. ´No tocante à questão da defesa da probidade administrativa, não se trata, igualmente de interesse transindividual (de grupos, classes ou categorias de pessoas), mas sim de interesse público primário (bem geral da coletividade). Está o Ministério Público legitimado à defesa do patrimônio público e da moralidade administrativa, especialmente por meio da propositura da ação civil pública.´ (CR, art. 129,III; Lei 8.429/92, art. 17). (Hugo Nigro Mazzilli, A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, 16ª ed., 2003, pg. 168). Vale ressaltar, a respeito da improbidade, que foi dada oportunidade à defesa preliminar, atendo aos requisitos da lei 8.429/92, o que demonstra ser a peça inicial apta a gerar conseqüências, na medida em que não trouxe dificuldade na formulação da defesa preliminar dos réus. Ademais o rito da ação civil pública também é ordinário, tal como previsto na lei de improbidade administrativa, estando correta a interposição da ação civil publica, sem qualquer prejuízo aos réus. II - Ilegitimidade passiva do vereador José Roberto Mota, eis que sustenta a defesa não ter participado da aprovação da Resolução, nem tampouco recebido qualquer indenização. Para fazer prova negativa de seu comportamento trouxe aos autos a certidão de fls. 357 da casa legislativa Municipal, aonde consta a informação de que esse vereador não atuou como membro da casa no período de 01/01/2003 a 31/12/2004. Tal certidão, por si só, não basta para afastar a alegação de que tenha o mesmo, de algum modo, se beneficiado em caso de recebimento das verbas questionadas, especialmente, se porventura veio a ser eleito em período posterior. Dessa forma, deixo de apreciar essa preliminar neste momento. De igual maneira, em relação as preliminares relativas à prescrição e decadência, as quais serão todas melhor analisadas em momento oportuno, respeitando a ampla defesa. c) Do pedido liminar Ultrapassada a análise daquelas condições, em sede de cognição sumária vislumbro a presença dos requisitos necessários à concessão da medida liminar, quais sejam: o fumus boni iuris e o periculum in mora. Inicialmente, necessário esclarecer que foi devidamente cumprida a norma do artigo 2º da Lei 8.437/92, uma vez que o representante legal da Câmara Municipal de Bom Jesus do Itabapoana já foi devidamente ouvido de há muito, conforme consta peça de fls. 417/426, desde 04/09/2006. A regra básica do sistema de remuneração do serviço público está prevista no art. 37, XI da Constituição Federal que dispõe: ´XI - a remuneração e os subsídios dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídios dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos.´ Esta redação tem por objetivo evitar interpretações que permita a ultrapassagem do teto. O texto revela que o teto não pode ser ultrapassado sob nenhum pretexto, com isso veda situações constrangedoras, como salários altíssimos em decorrência de incorporações criadas por lei, ou outros benefícios gerados pela imaginação criadora do legislador e pela interpretação construtiva dos juízes. Vale ressalvar, que essa regra teve o cuidado de repetir a regra do constituinte originário, no artigo 29, determinando que os ´subsídios, vencimentos, remuneração, proventos da aposentadoria e pensões e quaisquer outras espécies remuneratórias adequar-se-ão, a partir da promulgação desta emenda, aos limites decorrentes da Constituição Federal, não se admitindo a percepção de excesso a qualquer título´. Assim, abriu a possibilidade de percepção de uma forma de remuneração, que denominou subsídio, previsto no § 4º do artigo 39, obrigatório para o ´membro de poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais´. O subsídio é ´fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória´, tudo subordinado ao teto. O art. 39, §4º da Constituição Federal, acrescentado pela Emenda Constitucional n. 18/98 está assim redigido: § 4º O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI. (EC nº 19/98) O que essa regra alcança, portanto, é a transparência no sistema remuneratório dos membros de poder e detentores de mandato eletivo, dentre outras categorias ocupantes de cargos estatais. Vigora, portanto, princípio da verdade remuneratória. Criou-se, então, uma severa restrição ao exigir que a remuneração e o subsídio somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica - cuja iniciativa consta no art. 48, XV da CF. Impedindo, assim, o velho hábito de ampliar a remuneração sem lei, por atos internos dos Poderes, ou por mera interpretação. Comentando aquele dispositivo constitucional JOSÉ AFONSO DA SILVA (Comentário contextual à Constituição, p. 355) ensina: ´O conceito de parcela única há de ser buscado no contexto temporal e histórico e no confronto do §4º do art. 39 com outras disposições constitucionais, especialmente o §3º do mesmo artigo. Sendo uma espécie remuneratória de trabalho permanente, significa que é pago periodicamente. Logo, a unicidade do subsídio correlaciona-se com essa periodicidade. A parcela é única em cada período, que, por regra, é o mês. Trata-se, pois de parcela única mensal. Historicamente,´subsídio´ era uma forma de retribuição em duas parcelas: uma fixa e outra variável. Se a Constituição não exigisse parcela única, expressamente, essa regra prevaleceria. A primeira razão da exigência de parcela única consiste em afastar essa duplicidade de parcelas que a tradição configurava nos subsídios. A proibição expressa de acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória reforça o repúdio ao conceito tradicional e elimina o vezo de fragmentar a remuneração com múltiplos penduricalhos, que desfiguram o sistema retributório do agente público, gerando desigualdades e injustiças´. Uma das questões, do caso em tela, diz respeito aos gastos com o funcionamento e manutenção do Gabinete de Vereador, chamado de ´verba de custeio´, criada, segundo o Ministério Público, em regime de urgência, através da Resolução nº 657/2001 com alterações posteriores que duplicaram e quadruplicara aumentando o valor da verba, pela Câmara Municipal de Bom Jesus do Itabapoana. O MP aponta ilegalidades e irregularidades, sustentando que não há contra-prestação dessa verba, dentre outros fundamentos. Sustenta que a verba de custeio vem sendo gasta em proveito dos próprios vereadores. A exemplo, observa este Juízo, a xerox do documento de fls. (194/196) anexa à petição inicial, em que um vereador, da casa legislativa Municipal, afirma supostas irregularidades relacionadas ao consumo de gasolina. Nesse sentido vislumbra-se a fumaça do bom direito. Ademais, essa verba de custeio, sem comprovação de despesas, até o presente momento, ao sentir deste Juízo assemelha-se à verba de representação ou qualquer outra verba remuneratória. Ao se cogitar o pagamento de verba de custeio sem a devida comprovação das despesas, explícito seria seu caráter remuneratório, veementemente vedado pelo artigo 39, § 4º: ´... vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória...´. Parece-me, no entanto, que nenhum óbice, se observa, quando o agente político no exercício de suas funções, tenha as despesas efetuadas em virtude do exercício de seu mandato, pagas pelo erário. Portanto, não haveria óbice que impeça o agente político, no exercício de suas funções, ter suas despesas pagas pelo erário, desde que efetuadas em virtude do exercício de seu mandato, sendo, no entanto, necessário que se observe pré-requisitos legais, tais como o empenho prévio mediante concessão de adiantamento e, posteriormente, a comprovação, por meio de documentos fiscais, da despesa realizada. Faz-se-ia necessária a observância de pré-requisitos legais, como por exemplo: a existência de dotação orçamentária; a autorização competente; o empenho prévio mediante concessão de adiantamento; observada a legislação municipal; e, finalmente, a comprovação, por meio de documentos fiscais, da despesa realizada. Dessa forma, somente numa análise de mérito mais profunda se concluirá a respeito da natureza jurídica do pagamento da verba de custeio, em questão. Mesmo porque o argumento da defesa prévia, ao sustentarem o caráter indenizatório da verba, atestam trata tal verba de ´...retribuição pelo efetivo exercício do mandato, contraprestação do trabalho executado pelo representante do povo, interna e externamente...´. Afirmam ainda que ´... as despesas ressarcíeis são constantes e satisfeitas mensalmente mediante a devida comprovação, nos razoabilísismos limites previamente estabelecidos nas normas que a disciplinam´ (destaquei). Contudo, a defesa preliminar não trouxe qualquer documento desta contra-prestação que pudesse ensejar o não recebimento da peça instrutória. O periculum in mora, no caso, considera-se presente, em face do contínuo prejuízo que o pagamento de tal verba pode representar aos cofres públicos. Por esse motivo entendo que essas verbas de custeio devem ser suspensas, de pronto, até ulterior deliberação. Outra ilegalidade apontada pelo MP é o que diz respeito ao fato dos vereadores daquela casa legislativa perceberem, anualmente, 15 (quinze) parcelas de subsídios, o que imputa ser ilegal e exorbitante, questionando a base jurídica de tais pagamentos. Acompanha à defesa preliminar os documentos da Secretaria-Geral de Planejamento do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (fls. 296/309), que estabelece o critério para o limite do cálculo da remuneração dos Vereadores (percentual incidente sobre o somatório das quinze parcelas recebidas pelos Deputados Estaduais). Não consta naquele documento qualquer permissão ou autorização para pagamento superior a 12 (doze) parcelas anuais, mas a fixação do percentual recebido pelos Deputados. Em sua defesa preliminar, a parte ré afirma (fls. 274/275) que nos exercícios anteriores a 2006 os vereadores percebiam 30% sobre as quinze parcelas pagas aos deputados estaduais, porém, em 19 de janeiro de 2006, em virtude do recebimento da decisão do Tribunal de Contas, que desvinculou a fixação dos subsídios dos vereadores à dos deputados estaduais, a Câmara Municipal de Bom Jesus do Itabapoana, imediatamente, fixou os subsídios em moeda corrente, eliminando as parcelas excedentes, limitando o subsídio a 12 (doze) parcelas. Para comprovar essa afirmação refere-se aos documentos ´2-A´ juntados na peça defensiva, ou seja, correspondente aos documentos de fls. 310/317. A um primeiro momento, parece-nos questão incontroversa. Entretanto, numa análise perfunctória desses documentos - a teor do conteúdo do documento de fls. 324, datado de 23/02/2006, consta a seguinte informação: ´Informo ainda que os Vereadores percebem anualmente 15 (quinze) parcelas...´. Nota-se que o argumento da defesa e o conteúdo do documento são contraditórios. Ultrapassa ou não 12 parcelas mensais? De qualquer forma, com base nos fundamentos já abordados, também se faz necessário, suspender eventuais pagamentos que ultrapassam 12 (doze) parcelas anuais. III) DISPOSITIVO Ante todo o exposto, RECEBO a peça inicial e, de imediato, afasto as preliminares de ilegitimidade ativa do Ministério Público e inadequação da via eleita. Em juízo provisório, DEFIRO a liminar pleiteada, nos termos da fundamentação acima exposta, para determinar a suspensão imediata do pagamento a título de ´verba de custeio´ e eventual pagamento dos subsídios excedentes ao número de meses do calendário anual, até posterior deliberação deste Juízo. A título de prevenção, tais valores deverão ser depositados pelo representante da Câmara Municipal de Bom Jesus do Itabapoana em conta judicial a ser aberta, até decisão final da demanda. Decido ainda: I) Citem-se e intimem-se os réus para imediato cumprimento da decisão, com as advertências legais; II) Intime-se, ainda, o representante do Ministério Público (Promotoria da Justiça de Tutela Coletiva - Núcleo Itaperuna) para ciência da decisão. III) Oficia-se à Câmara Municipal para que traga aos autos documentos e para que preste as informações apontadas pelo Ministério Público às fls. 54/55; IV) Encaminhe cópia da presente decisão à Prefeitura Municipal.
________________________________________
Para fazer consulta online: www.tj.rj.gov.br / Nº do processo: 2006.010.000489-2 - Juizado / 1ª Instância.

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