As mãos que embalam os filhos, cozinham do bom e do melhor e pagam impostos em dia ainda são incapazes de assinar o próprio nome, escrever bilhetes ou preencher um documento. Os olhos atentos ao noticiário da televisão, às placas de rua e a tantos símbolos da metrópole não conseguem ler um livro, os classificados do jornal ou uma carta de amor. E essa realidade não está restrita aos confins do país, pelo contrário, está mais próxima do que os cidadãos letrados imaginam. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2007 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que um em cada 10 brasileiros é analfabeto - o equivalente a 14,1 milhões da população com 15 anos de idade ou mais - e cerca de dois terços dessas pessoas estão nas cidades, e não nas zonas rurais.
A história de dona Maria de 54 anos ilustra essa dramática realidade e mostra o porquê de tantos brasileiros ainda continuarem sem acesso às palavras escritas. Moradora do bairro Nova Holanda, ela não esconde os dedos fortes e calejados que seguram firme a colher de pau e o tacho de cobre no fogão. Mas, sobre a folha de papel em branco, faltam a essas mãos intimidade com o lápis. "Eu começo a suar e me dá uma tremedeira só de pensar que alguém vai me pedir para escrever uma ficha ou assinar o meu nome. Morro de vergonha. Se eu conhecesse as letras, tenho certeza de que a minha vida seria diferente”.
Para tirar da escuridão do analfabetismo os 14,1 milhões de brasileiros com mais de 15 anos de idade que, assim como dona Maria, não sabem conjugar os verbos ler e escrever, a Unesco alerta para a necessidade de vontade política e pulso firme na implementação de projetos. Esses dois ingredientes são apontados pela entidade como essenciais para que o país consiga cumprir uma das Metas do Milênio, traçadas no ano 2000, durante a Conferência Mundial de Educação, em Dacar. Num pacto para melhorar a qualidade do ensino, o Brasil assinou, com outros 128 países, o compromisso de reduzir pela metade a taxa de analfabetismo no país até 2015, chegando a 6,7%.
Segundo o especialista em educação de jovens e adultos da Unesco, Timothy Ireland, o grande desafio do Brasil é oferecer oportunidades reais para que as pessoas saibam ler e escrever. Por isso a outra barreira a ser vencida é o fim do analfabetismo funcional, que é quando a pessoa sabe decodificar letras e números, mas não é capaz de interpretar um texto ou fazer operações básicas de matemática. “Hoje o Brasil tem 32% da população analfabeta funcional”, diz Timothy.
Recentemente, os presidentes Hugo Chávez, da Venezuela, e Evo Morales, da Bolívia, declararam que os dois países estão livres do analfabetismo. Para isso, utilizaram a metodologia do programa cubano de alfabetização criado pelo governo de Fidel Castro. O método usa programas de rádio e de televisão para alfabetizar jovens e adultos. O relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para Educação, Vernor Muñoz, cita as ações destes países como "exemplos de opções concretas".
Em Macaé o desafio não é diferente. Aproveitando a ida da comitiva municipal a Cuba, a secretaria de Educação Marilena Garcia (PT) junto da ORJURE, Organização da Juventude Responsável desenvolve a implantação em Macaé do método de alfabetização cubano que erradicou o analfabetismo em Cuba. Segundo Igor Sardinha, gestor da ORJURE, o objetivo é fazer de Macaé um dos primeiros municípios do Brasil livres do analfabetismo. “O trabalho é ousado, mas não podemos silenciar diante de um fator social tão excludente. O método cubano é reconhecido em todo mundo pela sua efetividade na vida dos beneficiados”, relatou Igor Sardinha.