CNAS reforça anistia de filantrópicas

Ignorando a polêmica gerada no final de 2008 com a edição da Medida Provisória 446/08, a chamada MP das Filantrópicas, o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) renovou o certificado de 4.100 mil entidades para o triênio (2007-2009). A renovação foi publicada no último dia 26, no Diário Oficial da União (DOU), por meio de resolução.

Para entender o imbróglio, é preciso considerar o histórico. Ao publicar a MP o governo mudou as regras para a concessão do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (Cebas), documento que isenta de impostos 5.630 organizações registradas em todo o país – a um custo aproximado de R$ 4,4 bilhões por ano.

Na época, a medida foi considerada polêmica em dois pontos. No primeiro, a suposta "anistia" a entidades na renovação do certificado. Pela MP – e agora pela resolução do CNAS - todas as organizações que deram entrada na documentação, incluindo aquelas que estavam em suspeição para renová-la, tiveram deferimento automático de seus pedidos.

Outra discussão fundamental foi a responsabilidade de outorgar o documento, que deixa de ser do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), e passa a ser dos ministérios da Educação (MEC), Saúde (MS)e Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Eles darão a chancela de acordo com as especificidades de trabalho de cada entidade.

"O CNAS precisava se livrar dos processos, por essas duas razões, pois foram deferidos e ele não mais cuidará deles", explica o advogado, Eduardo Szazi, especialista em legislação do terceiro setor. Segundo ele, é preciso tomar cuidado com generalizações, já que a resolução "publicou" o deferimento de todos os processos em tramite e não apenas daqueles que estavam tendo problemas.

"A lista não compreende apenas as entidades problemáticas, mas todas aquelas que estavam com pedido em andamento, com estrita atenção à quota de gratuidade", argumenta.

O que é Cebas?

Para entender o tema é preciso saber porque o Cebas é importante. O certificado garante às entidades imunidades tributárias e, em contrapartida, elas devem oferecer à população a continuidade de serviços públicos de saúde, educação e assistência social que a estrutura governamental não consegue oferecer.

Essas entidades - geralmente hospitais, universidades e casas de assistência social - ficam livres da contribuição previdenciária patronal, equivalente a 20% da folha de pagamento, e das contribuições CSLL (sobre o lucro líquido), PIS e Cofins (9,25% sobre o faturamento).

"Mas isso não quer dizer que esse dinheiro vá direto para o bolso dessas entidades, como alguns querem fazer crer. Para conseguir o Cebas é preciso comprovar que existe um atendimento no mesmo valor isentado no imposto", afirma Szazi.

Briga Política

O anúncio da resolução levantou questionamentos no Congresso Nacional. Em novembro, o então presidente do Senado, Garibaldi Alves, já havia devolvido a MP ao Executivo, com o argumento de que a matéria não atendia os requisitos constitucionais de urgência e relevância.

Agora, foi a vez do presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Organizações Não-Governamentais (ONGs), senador Heráclito Fortes (DEM-PI), dar sua opinião sobre o tema. O senador classificou como "desrespeito ao Congresso" e "afronta ao Brasil" a decisão do governo de renovar a certificação dessas entidades.

"É uma demonstração cabal de que o governo não está preocupado com a moralidade pública. Reconhecer entidades com graves vícios administrativos é estimular a corrupção no Brasil. Este ato nada mais é que uma demonstração de que o governo defende a impunidade. É lamentável", condenou o senador, em entrevista à Agência Senado.

Já a senadora Lúcia Vânia (PSDB-GO), vice-presidente da CPI das ONGs, identificou dupla responsabilidade sobre o assunto. "Está claro que há um equívoco pelos dois lados. O Senado precisava ter dado uma resposta. Para a senadora, com essa decisão consolidou-se "a certeza de que os membros do governo não estão preocupados com os desvios de recursos praticados por algumas ONGs".

No entanto, segundo o advogado Eduardo Pannunzio não custa lembrar que a posse do Cebas não garante automaticamente o direito à "isenção" das contribuições sociais. "Conforme esclarece a própria MP, além da certificação a entidade deve cumprir diversas outras exigências. Dessa forma, caberá à Receita Federal efetuar esse controle e, se constatado o descumprimento de quaisquer desses requisitos, lavrar auto de infração", explica.

Além disso, garante Pannunzio, a própria certificação está sujeita a cancelamento pelos ministérios, caso se verifique que a entidade deixou de atender às exigências legais

Espera-se agora uma rápida aprovação da MP – que trancará a pauta da Câmara a partir do dia 4 - com a vitória do senador José Sarney (PMDB-AP) para a presidência do Senado. Como o político está mais afinado com as propostas do Governo Federal, ele possivelmente não criará empecilhos para sua aprovação, como fez Garibaldi Alves, no ano passado. "Isso torna improvável que a devolução da MP vingue", acredita Szazi.


(Envolverde/Rede Gife)
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