Infelizmente o setor de saneamento básico passou nestes últimos anos por total descrédito e inércia por parte dos nossos governantes. A falta de uma Política Nacional e seus rebatimentos nos estados e municípios, o baixo nível de alocação de recursos orçamentários e os sucessivos contingenciamentos de recursos de financiamentos do FGTS e outros ao setor público, por um lado e o afrouxamento das regras de acesso ao setor privado por outro são apenas exemplos do abandono ao qual o setor foi submetido.
A
falta de saneamento básico é a principal causa da mortalidade na infância por
doenças parasitárias (dengue, malária, cólera, febre amarela, teníase,
cisticercose, esquistossomose, diarréia etc.), e doenças infecciosas (hepatite
A, amebíase, leptospirose etc.), males que proliferam em áreas sem coleta e
tratamento de esgoto.
Os números púbicos disponíveis são alarmantes. Para
se ter uma idéia, o índice de mortalidade na infância é de 22,5 crianças mortas
por mil nascidas vivas. No entanto, quando olhamos apenas para mortes de
crianças de até 5 anos vítimas da diarréia, a situação piora. A cada ano 2.528
crianças morrem no Brasil em decorrência desta doença – ou a preocupante cifra
de sete por dia.
Dentro do sistema de saúde pública, cerca de 700 mil
internações hospitalares anuais foram causadas por doenças relacionadas à falta
ou inadequação de saneamento, na última década. A falta de saneamento básico é
também um problema para a educação, pois eleva o número de faltas na sala de
aula. Estima-se que 65% das internações em hospitais de crianças com menos de 10
anos sejam provocadas por males oriundos da deficiência ou inexistência de
esgoto e água limpa e 34% das ausências de crianças de zero a seis anos em
creches e salas de aula devem-se a doenças relacionadas com a falta de
saneamento.
A coleta de esgoto é realizada em 48% dos domicílios, mas
desse total somente 20% dos municípios tratam os resíduos - os demais despejam o
esgoto diretamente em rios e córregos. E aproximadamente 40 milhões de
brasileiros (21,4% dos domicílios) ainda se utilizam das obsoletas fossas
sépticas. Apenas um em cada três brasileiros é beneficiado pela coleta e o
tratamento de esgoto simultaneamente.
Recentemente, o Instituto Trata
Brasil, entidade sem fins lucrativos cuja finalidade é promover a mobilização
nacional para se alcançar a universalização do saneamento básico no País,
divulgou que o Brasil investe apenas um terço do necessário para expandir a rede
de esgoto. Nos últimos quatro anos, o investimento foi de 0,22% do PIB quando
deveria ser de 0,63%.
Se considerarmos a universalização dos serviços de
coleta e tratamento de esgoto até o ano 2020, teríamos de contar anualmente com
um investimento médio de aproximadamente R$ 9 bilhões por ano. E isto equivale a
0,45% do PIB Nacional.
Mesmo com a liberação de recursos, existem ainda
os entraves burocráticos que precisam ser resolvidos. Além de o volume de
recursos ser ainda bastante reduzido, os municípios, em muitos casos, estão com
margens baixas de endividamento para conseguir financiamentos.
A
contabilidade brasileira considera o investimento em saneamento como gasto
público e, portanto, o uso do FGTS e do BNDES para investimento faz aumentar as
despesas correntes e em conseqüência compromete o superávit primário. As
autarquias, assim como boa parte das empresas estaduais, em menor escala, também
têm dificuldades de contrair financiamentos e pagar as contrapartidas e os
próprios financiamentos, com receitas tarifárias.
Por outro lado, os
benefícios do saneamento básico são inúmeros. Ainda de acordo com o Instituto
Trata Brasil, a cada R$ 1,00 investido em saneamento básico, o Governo
economizaria R$ 4,00 em gastos com saúde, uma vez que grande parte das doenças
está relacionada com a falta de uma solução adequada de esgoto
sanitário.
Os ganhos ambientais também são inúmeros. Com a eliminação da
poluição estética e visual, melhora-se a imagem institucional da cidade e
pode-se, por exemplo, ocorrer o desenvolvimento do turismo local, dinamizando a
economia e gerando mais empregos.
Saneamento básico é considerado uma das
melhores e mais eficazes soluções para a promoção da saúde no Brasil.
Financeiramente, o investimento é relativamente baixo e o retorno é garantido,
além de contribuir para o desenvolvimento e redução da pobreza no País. Viver em
um local com saneamento aumenta a auto-estima do indivíduo, o ajuda a cuidar
também do próprio corpo, mente, e ainda o estimula a cuidar melhor de sua
casa.
O Instituto Trata Brasil é uma iniciativa de empresas do setor
privado que visa mobilizar diversos segmentos da sociedade para garantir o
acesso ao saneamento no País. Atualmente, apenas 48% dos domicílios brasileiros
têm acesso à coleta de esgoto. Entre suas propostas, destaca-se a consultoria a
municípios para o desenvolvimento de projetos de saneamento, além do
acompanhamento da liberação e da aplicação de recursos para obras, entre outras
ações. O Trata Brasil conta com o apoio das empresas Amanco, Braskem, Colgate,
Caloi, Editora Globo, Medley, Solvay Indupa, Tigre, da Associação Brasileira de
Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), da Associação dos Dirigentes de Vendas
e Marketing do Brasil (ADVB), da Fundação Getúlio Vargas, do Instituto Coca-Cola
e da Pastoral da Criança.
*Daniel Magnoni é cardiologista e nutrólogo
e chefe da Seção de Nutrição Clínica do Instituto Dante Pazzanese de Cardiolgia
e do Serviço de Nutrologia e Nutrição Clínica do Hospital do Coração – Hcor.
(Envolverde/Rede Gife)