Quando criança ouvia exaustivamente a expressão “o bolo desandou” em referência a massa que não havia dado certo. Esse mesmo termo reflete a realidade que estamos vivendo hoje no país. Além das sucessivas manifestações desde o ano passado, as greves viraram moda, abrangendo categorias distintas que reivindicam melhorias salariais. Em tempo de copa do mundo, o grito que mais ecoa não é o do Brasil. A palavra de ordem é greve.
Em Pernambuco, com a paralisação da polícia os efeitos foram catastróficos, com alto índice de violência. Em São Paulo, Salvador, São Luiz e outras capitais o transporte público tirou, literalmente, o direito de ir e vir do cidadão.
No Rio, somente nos últimos tempos foram os garis, rodoviários, vigilantes, professores e policiais civis. Passamos semanas com a Cidade repleta de lixo. Por várias ocasiões, a população ficou sem condições de locomoção por falta de ônibus. Milhares de alunos estão sem aula e o acesso aos bancos, praticamente é nulo devido à paralisação dos vigilantes. Um verdadeiro caos, transformando a vida da população num teste de resistência.
Penso que ninguém seja contra manifestações ou greves. Não é isso. Afinal, elas são instrumentos democráticos e legítimos, porém, como qualquer outra coisa na vida, se utilizada em exagero, ultrapassa o bom senso e nesse momento perde-se o foco, principalmente quando há motivações políticas.
A partir do momento que para lutar pela minha causa eu prejudico milhares de outras pessoas, o ato democrático de direito fica comprometido. A voz que clama por justiça perde a razão quando as consequências dos atos praticados se apresentam de forma maléfica a uma boa parcela dos cidadãos, se configurando numa injustiça com aqueles que também já sofrem com a má qualidade dos serviços públicos oferecidos.
Diz a sabedoria popular que “o meu direito começa quando termina o seu”. Essa é a premissa a ser preservada, ainda que seja difícil para a grande massa revoltada com décadas de descaso do Poder Público.
Alguns formadores de opinião afirmam que é preciso separar o evento esportivo dos problemas de ordem social e política. No discurso é até viável, mas na prática de quem enfrenta muitas dificuldades no dia a dia é quase impossível. No entanto, é preciso que manifestantes e grevistas entendam que o povo está do mesmo lado. Prejudicá-lo é puni-lo duas vezes, fazendo com que a democracia perca a mão e desande, assim como a massa do bolo.
*Advogado criminalista