A Justiça Federal no Espírito Santo condenou a Ordem dos Advogados do Brasil no Estado (OAB/ES) ao pagamento de indenização no valor de R$ 150 mil por danos morais ao advogado Gustavo Bassini Schwartz, que não teve as prerrogativas defendidas pela entidade durante o período em que esteve preso. Na decisão assinada pelo juiz Roberto Gil Leal Faria, da 5ª Vara Federal Cível de Vitória, a omissão da Ordem teria sido provocada por uma retaliação política ao advogado, que permaneceu 35 dias preso em uma cela comum, o que é vedado pelo Estatuto da Advocacia.
Na sentença publicada nesta segunda-feira (16), o magistrado concluiu que a direção da Ordem no Estado não agiu para cessar a violação nas prerrogativas de Gustavo Bassini. Na ação, o advogado alega que ficou preso em uma cela no Quartel da Polícia Militar, em Maruípe. Ele imputa a responsabilidade civil aos três níveis da Ordem dos Advogados do Brasil pelo fato de, segundo ele, nada ter sido feito para garantir suas prerrogativas profissionais.
“Reitero que não há nenhuma prova de que a OAB-ES tenha adotado qualquer postura objetiva no sentido de fazer cumprir a prerrogativa do Estatuto. A questão me parece muito grave. A entidade de classe do autor, que tem obrigação legal de defender-lhe as prerrogativas funcionais, não efetivou um simples habeas corpus, de duas paginas, alegando que, na ausência de ‘Sala de Estado Maior’, o autor deveria ser encaminhado para prisão domiciliar, como previsto em lei. Para que não haja duvidas. Não se exigiria sucesso nessa empreitada, mas algo tinha que ser tentado. A função da Ordem neste caso não é de resultado, mas de meio. Assim, errou por omissão a OAB-ES quando nada tentou fazer para corrigir a ilegalidade referente ao desrespeito com a prerrogativa do advogado”, assinalou.
Retaliação
Sobre a conduta da entidade durante o episódio, o juiz federal concluiu que a omissão na defesa de Gustavo Bassini se deu como uma forma de retaliação política, uma vez que o advogado é opositor da atual administração da Ordem no Estado. O magistrado relatou, inclusive, que foi o juiz de uma ação movida pelo advogado, que resultou na anulação das eleições da Subseção de Vila Velha da Ordem, onde pode constatar o clima de animosidade entre as partes.
“A questão assume gravidade maior quando se tenta entender o porquê da omissão da OAB-ES. Analisei o processo com muita calma. Li e reli a contestação da Ordem. Por mais que procurasse, não identifiquei um argumento sequer que justificasse o porquê da Ordem não ter defendido a prerrogativa legal do autor de prisão domiciliar. Assim, só pude chegar a uma conclusão: o motivo foi político”, considerou.
O juiz federal continuou a explicação: “É público e notório no meio jurídico deste Estado, que o autor e forte opositor da atual gestão da OAB capixaba. O mesmo, inclusive, pleiteou a anulação das eleições de Vila Velha, pleito que foi deferido em primeira instância e se encontra pendente de recurso. Fui o juiz natural de tal processo e pude perceber o forte rancor existente entre as partes. Seja como for, tal inimizade não poderia se transferir para o cenário institucional. Então, estou plenamente convencido de que a OAB-ES deixou de defender as prerrogativas do autor com dolo, por retaliação política”.
Por conta disso, o magistrado avaliou que a omissão da entidade foi dolosa (intencional) e fixou o pagamento de indenização de R$ 150 mil por danos morais causados ao advogado. O juiz federal explicou que a “indenização deverá apresentar um viés punitivo elevado, objetivando que tal omissão não se repita com outro advogado, oponente político ou não”. A entidade também foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios no valor de 10% da causa (R$ 15 mil), em ambos os casos com valores corrigidos monetariamente.
Responsabilidades
Na mesma ação, o advogado havia pleiteado o pagamento de indenização por dano material e lucro cessante, mas os pedidos foram rejeitados pelo juiz federal, que considerou não terem sido apresentadas provas suficientes para indicar o efetivo prejuízo que teve com o episódio. O juiz Roberto Gil Leal Faria também rejeitou o pedido de inclusão na causa da subseção da OAB em Vila Velha e do Conselho Federal da Ordem. Segundo ele, as instituições não teriam relação direta com a competência de executar medidas visando a corrigir desrespeitos pontuais às prerrogativas dos advogados.
Por conta da improcedência deste pedido, o juiz federal condenou o autor da ação ao pagamento dos honorários advocatícios ao Conselho Federal e da Subseção de Vila Velha, no valor de R$ 5 mil cada. Também por conta da negativa ao pedido de indenização por dano material e lucro cessante, Gustavo Bassini foi condenado ao pagamento de R$ 2 mil à OAB-ES. No entanto, o recolhimento desses valores está suspenso devido à concessão do benefício da gratuidade de justiça ao advogado, que alegou a sua hipossuficiência financeira em decorrência do episódio.
Paralelamente à decisão sobre a ação, o juiz manteve uma medida cautelar – prolatada na fase inicial do caso –, que determinou à direção da OAB-ES para que adote, de ofício ou a requerimento de qualquer pessoa, as medidas que entender cabíveis para garantir a prerrogativa inserida no Estatuto da Advocacia, caso o autor venha a ser novamente preso, seja por fato relacionado com o exercício da advocacia ou não. Neste caso, a Ordem não recorreu da medida. Já a sentença de mérito ainda cabe recurso.