IPS: Em que consiste este sistema e qual sua importância?
Abel Centella: Os modelos climáticos são a melhor ferramenta de que dispõe a ciência atualmente para explicar o que acontecerá com o clima no futuro. Falando resumidamente, um modelo climático é um programa de computador que representa tridimensionalmente tudo o que acontece na atmosfera, nos oceanos, na superfície terrestre e nas camadas cobertas por gelo.
IPS: Diria que a partir da capacitação e do uso regional deste modelo se fortaleceu a integração e o intercâmbio acadêmicos entre Cuba e o restante do Caribe?
AC: Desde o início fizemos com que o Precis chegasse a toda a região, não apenas a Cuba. Assim, com as relações que já começavam a se fortalecer muito no Centro Comunitário Caribenho de Mudança Climática (CCCCC, em espanhol) e com a Universidade das Índias Ocidentais, chegou-se a um acordo entre todos de que esta ilha seria a sede do escritório de capacitação para a aplicação do modelo climático. Vieram especialistas de países da região e até sul-americanos, como do Peru, por exemplo. No entanto, o suporte foi o CCCCC, criado por acordos dos chefes de Estado da Comunidade do Caribe (Caricom) para atender as pesquisas sobre mudança climática em toda a região. É um centro que não tem orçamento governamental, que se apoia em projetos. Cuba não pertence ao CCCCC porque não é membro do Caricom. Porém, temos um forte vínculo, o que permitiu nos agrupar e compartilhar experiências, resultados e até frustrações quando algo saiu ruim para alguém. É assim que temos avançado até hoje.
IPS: Podemos entender este esforço como parte de um sistema de alerta?
AC: Nem tanto, porque alerta tem uma escala temporária mais imediata. O que estamos fazendo é produzir informação para facilitar desde já a adoção de ações que reduzam os impactos no futuro e adaptar-se à mudança climática. Isto é, que toda esta informação possa permitir aos que tomam decisões começar desde agora a pensar e a implementar opções que impeçam ou minimizem os impactos do clima futuro. A análise de toda esta informação e as conclusões que a ciência pode propiciar desde já sem dúvida ajudarão nessa direção.
IPS: Quais países do Caribe insular podem ser mais vulneráveis do que outros à mudança climática?
AC: Bem, a vulnerabilidade tem variáveis que não são físicas, mas sociais e econômicas, porque dependem do nível de desenvolvimento. Por exemplo, a do Haiti é terrível. Também contam as dimensões. É difícil que um único ciclone tropical tenha impacto em todo o território cubano, mas se passar por cima de qualquer das ilhas pequenas acaba com tudo. Às vezes este fenômeno é maior do que a própria ilha. Na questão física, observamos certas diferenças quanto ao futuro das precipitações. Há áreas do Caribe onde os modelos estão concluindo e coincidindo com muita força que as chuvas serão muito menores do que são hoje, ou seja, que haverá um grande impacto sobre os recursos hídricos, e há outras zonas em que não nos indicam isso com tanta intensidade. No caso do aumento da temperatura, não há basicamente diferença, ou seja, para todos subirá de maneira importante. Os resultados que vemos indicam que, para o final do Século 21, digamos em 2080, a temperatura poderá ser de até quatro graus mais elevada, e há estimativas de que até 2050 chegará a aproximadamente dois graus de aumento. Os modelos também indicam que em períodos mais próximos, como 2020 ou 2040, poderá haver aumentos de temperatura superiores a um ou dois graus nesta região.
IPS: Resumindo, para onde apontam os maiores desafios do Caribe insular em matéria de adaptação à mudança climática?
AC: Em minha opinião, a elevação do nível médio do mar é o maior desafio que se poderá enfrentar, seguido da seca.
IPS: Nesses casos, o que a comunidade científica recomenda?
AC: Primeiro, não esperar para começar a agir. Penso que Cuba é exemplo disso. Os que tomam as decisões criaram facilidades e fortalezas nos processos de pesquisa que podem fornecer informação, para indicar por onde vão as coisas e o que se pode fazer. O mais importante é que nos ouvem. Um exemplo recente disto é que o próprio presidente de Cuba, Raúl Castro, pediu que estudássemos os eventuais cenários, como, por exemplo, o que representaria para o país o nível do mar subir 50 centímetros ou um metro, o que aconteceria com os recursos naturais das zonas costeiras, as praias e com os assentamentos humanos. Também demonstrou preocupação com os recursos hídricos, o que aconteceria com os lugares da costa mais importantes do ponto de vista socioeconômico, porque, embora existam muitos assentamentos deste tipo, nem todos têm a mesma importância se estão habitados. Envolverde/IPS
(IPS) Foto: Jorge Luis Baños/IPS