A idéia de unir instrumento de gestão empresarial
a ideais de ONGs começou a nascer em 2001, quando Van Dongen visitou comunidades
pesqueiras do sul do Chile. Ali conheceu a realidade da pesca predatória e teve
uma visão: o ecoturismo poderia aliviar a pressão sobre os ecossistemas e
aumentar a renda daquela população. Decidiu, então, trazer jovens profissionais
da Holanda à região, que apoiaram os pescadores na criação de 30
microempresas.
Hoje, a Enviu mantém convênios com mais de 40
universidades em diversos países - nas quais busca sangue novo para projetos
inovadores. O mais famoso deles é o Sustainable Dance Club, discoteca de Roterdã
cuja pista de dança converte em eletricidade a movimentação dos clubbers. Outro
projeto bem sucedido é o Rotterdam Innovation Lab, centro de referência em
empreendedorismo sustentável, montado em parcerias com o Rabobank e o porto de
Roterdã, que oferece apoio técnico e logístico a empreendedores que começam a
desenvolver projetos comerciais com viés socioambiental. Mas a iniciativa mais
ambiciosa da Enviu é uma competição entre universitários, que pretende cortar 40
% das emissões de um milhão de riquixás motorizados na Índia.
Formado em
Administração de Pequenos Negócios e com mestrado em Gestão de Relações
Negócios-Sociedade pela Rotterdam School of Management, Van Dongen gerenciou os
negócios da sua família, na área de serviços financeiros, até decidir criar a
Enviu. Ele costuma dizer que está a procura de “idéias uau”, soluções inovadoras
para problemas socioambientais que incorporem princípios do mundo dos negócios,
que sejam replicáveis e que representem um desafio para jovens
empreendedores.
A participação de Van Dogen será um dos destaques do 3º
Congresso Internacional sobre Desenvolvimento Sustentável (Sustentável 2009),
que vai abordar a sustentabilidade na prática: tendências globais, inovações,
educação e oportunidade de negócios. O evento, organizado pelo Conselho
Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), com o apoio
da ONU por meio da UNESCO e do PNUMA, acontecerá em São Paulo nos dias 4 a 6 de
agosto, no TUCA, o Teatro da Pontifícia Universidade Católica (PUC).
Na
entrevista abaixo, à repórter Regina Scharf, do CEBDS, ele conta como
transformar idéias em negócios.
A Enviu tem um perfil
curioso, meio ONG, meio empresa, por quê?
Não acreditamos
que os negócios tradicionais vão melhorar o mundo - e tampouco as ONGs vão.
Acreditamos que é possível combinar o melhor desses dois mundos. Chamamos isso
de empreendedorismo engajado. Ele busca maximizar o impacto positivo das suas
ações sobre as questões sociais e ambientais, ao mesmo tempo em que busca o
retorno do investimento.
Qual a sua recomendação para um
jovem empreendedor ter sucesso investindo em
sustentabilidade?
Em tempos de crise financeira, como os
atuais, a sustentabilidade oferece uma enorme oportunidade. Para mim, a crise é
um sinal de que o nosso sistema econômico foi concebido de forma equivocada. Ele
parte do princípio de que existe uma oferta inesgotável de energia, de recursos
naturais e de mão de obra barata. Ora, isso não é verdade. Acho que a crise
financeira é um sintoma de uma utilidade incorreta do sistema econômico - assim
como a crise energética, de alimentos, da água e do clima que
enfrentamos.
A nova economia deveria internalizar os custos ambientais e
sociais como se fossem custos de depreciação. Em outras palavras, se cortamos
uma árvore, temos de plantar uma árvore. Se produzirmos um produto, temos de
pensar como reutilizá-lo quando for descartado. No centro desta nova economia,
empreendedores inovadores estão criando as empresas que vão liderar um futuro
sustentável. A licença de operação está no valor que elas criam para as pessoas
e o planeta. Você vê essas empresas aparecerem por toda parte: dos empréstimos
de indivíduo para individuo (como a MYC4,dinamarquesa) a barcos de corrida
cobertos com painéis solares (como a Czeers, holandesa), a novas soluções de
tratamento de água, como canudos com filtros embutidos (da Livestraw, também
holandesa), e laptops de US$ 100. Agora, quanto a aumentar as chances de
sucesso, uma coisa eu aprendi: é importante errar muito e errar logo no início
de um processo. Se você fizer isso, aprenderá muito e perderá muito
menos.
Que nichos de negócios são mais promissores para
jovens empreendedores?
Apostamos em produtos e serviços que
não sejam intensivos em capital. Também acreditamos que soluções que envolvam a
descentralização da geração energética ou a venda de eletricidade para a rede
terão um enorme impacto num futuro próximo.
De modo mais geral, para nós
é importante buscar oportunidades que possam inovar num setor específico ou
produtos que gerem derivados, pois eles podem transformar indústrias que já
existem. Esse tipo de produto oferece a outros empreendedores a oportunidade de
desenvolver produtos e serviços compatíveis com aquela tecnologia. É o que o
Google faz, por exemplo, com o Google Earth; todos podem usá-lo e elaborar
produtos que derivam dele.
Como é possível atrair os jovens
para projetos inovadores?
Hoje, os jovens pensam de forma
positiva, têm foco em soluções e querem se divertir. Nos inspiramos e unimos
forças com os líderes do futuro de modo a apresentar a sustentabilidade de um
jeito novo, desafiador e contemporâneo. O essencial é adotar um modelo de
criação conjunta, compreender a urgência da cultura jovem e mostrar por que
essas questões lhes dizem respeito. Pelo menos, é assim que funciona na Europa.
Talvez seja diferente no Brasil.
Minha experiência mostra que, se você
desafiar os jovens e ajuda-los a unir forças, grandes coisas podem acontecer.
Veja como isso acontece: conseguimos converter o Sustainable Dance club num
business case bastante claro e numa start-up de sucesso internacional graças à
participação de 200 membros da nossa rede em cooperação com universidades,
empresas e outros parceiros. Esse projeto está ajudando discotecas em todo o
planeta a se tornarem mais sustentáveis e foi escolhido como uma das melhores
idéias de eco-negócios de 2006-2007, recebendo um prêmio dado em conjunto pela
Toyota, Springwise, Fast Forward (Harvard) e a Readers
Digest.
A Enviu tem trabalhado em diversos países - Holanda,
Índia, Chile. Os jovens empreendedores desses paises são muito
diferentes?
Na verdade não. Naturalmente, há imensas
diferenças culturais, mas eu acho que as pessoas estão mudando a sua forma de
pensar num nível global. O modo de vida sustentável está em alta e é possível
adotá-lo com os conhecimentos que temos hoje e com tudo o que já inventamos.
Agora, torná-lo realidade é um verdadeiro desafio. Os jovens empreendedores que
eu encontrei em vários países compartilham essa visão. Eles agem de forma
apaixonada, vêem o imenso mercado potencial e compreendem que não podem fazer
tudo sozinhos. Você pode notar que muitos deles são brilhantes na mobilização de
redes e na criação compartilhada com muitos
parceiros.
EXEMPLO
As ambições da Enviu não são
modestas. A organização holandesa está buscando uma forma de tornar híbridos
parte dos 100 milhões de riquixás que circulam na Ásia. Isso porque esses
triciclos motorizados, conhecidos como tuk tuks na Índia, são extremamente
poluentes. Há estimativas de que um tuk tuk emita tantos gases-estufa, quanto
uma frota de 50 automóveis.
Por isso, a Enviu lançou um desafio
universitário: quem conseguir desenvolver o sistema mais barato, limpo e prático
de conversão para tuk tuks receberá apoio para implantá-lo. Mais de 100
estudantes holandeses e indianos, distribuídos em sete times, estão participando
da gincana, que deverá ser concluída este ano. Eles têm de desenvolver a
tecnologia necessária, bem como um business plan que a viabilize. A equipe
vencedora terá seu projeto abraçado pela Enviu, que ajudará com apoio técnico,
busca de financiamento, estabelecimento de parcerias e criação das microempresas
que se encarregarão de tocar a iniciativa. “Nosso sonho é aprimorar o desempenho
de um milhão de tuk tuks” diz Stef van Dongen.
“Queremos torná-los muito
mais limpos e eficientes, e assim incrementar a renda dos seus proprietários”. A
sua expectativa é de que os tuk tuks adaptados tenham uma redução de pelo menos
40% nas emissões de gás carbônico. Ele projeta, também, que a economia de
combustível decorrente aumente em até 35% os ganhos de seus motoristas, muitos
deles taxistas com baixíssima renda. Por fim, o projeto pretende melhorar a
qualidade do ar das muitas metrópoles asiáticas onde os tuk tuks são
indissociáveis da paisagem. “É muito estimulante saber que tanta gente está
trabalhando por um mesmo objetivo”, diz Van Dongen.
(Envolverde/CEBDS)