Chicago, 25/02/2009 – É possível que os dois oceanos polares sejam os lugares mais inóspitos do planeta, mas o “Censo de vida marinha antártica” realizado por meio de milhares de cientistas de 25 países registrou ali mais de 12 mil espécies animais. Pelo menos 235 delas vivem tanto no oceano Ártico quanto no Antártico, e em nenhum outro lugar mais, apesar de entre um e outro existir uma distância média de 11 mil quilômetros. “Há cem anos exploradores do Antártico como Scott e Rutherford viram nada além de gelo. Agora, em 2009, vemos vida por todo lado”, disse Victoria Wadley, da Divisão Antártica Australiana.
As espécies polares foram recenseadas em 18 expedições feitas durante o Ano Polar Internacional (2008-2008) que acaba de concluir. Até agora, os cientistas identificaram 7.500 animais no oceano Antártico e 5.500 no Ártico. O total de espécies marinhas do planeta é estimado entre 230 mil e 250 mil. Os pesquisadores colheram amostras em quase um milhão de locais. Entre eles solos marinhos vistos pela primeira vez em cem mil anos, pois as ancestrais plataformas geladas derreteram e se desintegraram nos últimos anos. O informe preliminar da pesquisa foi apresentado na reunião anual da Associação Norte-Americana para o Avanço da Ciência, realizado de 12 a 16 deste mês em Chicago.
Embora ainda não esteja completa a análise de todas as amostras, espera-seque as espécies recenseadas no oceano Antártico sejam mais do que as do Ártico, disse Bodil Bluhm, pesquisador da Universidade do Alasca. As duas regiões são muito frias, de gelo e neve, e em ambas as águas são mais quentes nas profundezas do que na superfície, mas também são muito diferentes. “A Antártida é um continente com um oceano em volta, enquanto o Ártico é um oceano rodeado por terra, como o mar Mediterrâneo”, disse Bluhm em uma entrevista. O Antártico é muito mais vasto e aberto ao resto dos oceanos do que o Ártico, o que, talvez, explique sua maior biodiversidade, afirmou.
A grande surpresa para os cientistas foram as 235 espécies – entre elas cinco de baleias, seis de aves marinhas e quase cem de crustáceos – que se encontram exclusivamente em regiões polares. Bluhm se concentrou no estudo de uma das espécies, uma diminuta “borboleta do mar”: um pterópodo que nada e tem o tamanho de uma lentilha. “Como chegaram aos dois polos?”, perguntou. Também se desconhece por quanto tempo essas espécies estiveram separadas e se as 235 se distanciaram geneticamente. “Isto apresenta muitas perguntas interessantes do tipo evolutivo”, explicou.
O primeiro estudo exaustivo da vida nos mares polares acontece 200 anos depois do primeiro impacto da pesca comercial e da caça de baleias, que continua e é especialmente forte no oceano Antártico, disse Julian Gutt, do Instituto Alfred Wegener de Pesquisas Polares e Marinhas, da Alemanha. “A região estava cheia de baleias, focas e pinguins”, disse Gutt à IPS. E embora estas duas últimas espécies tenham se recuperado nas últimas décadas, as grandes baleias, com a azul e os cachalotes, tiveram menos sorte. “Essa é uma mudança significa, mas não sabemos o que significa para a ecologia da região”, ressaltou.
Menos baleias pode significar mais krill, criatura semelhante ao camarão que constitui o principal alimento da maioria das baleias. Nas últimas décadas, a maior presença de krill pode ter contribuído para a recuperação das populações de focas e pinguins, disse Gutt. Porém, a exploração comercial do krill representa um grande impacto, e em muitos locais existe excesso em sua captura. “O manejo estrito é necessário para prevenir impactos sobre pinguins e focas”, disse Gutt. Nova evidência mostra que a mudança climática aumentou a temperatura na parte sudoeste do oceano Atlântico, o que reduziu em 40% sua população de krill.
Ainda não há evidência direta de que focas e pinguins estejam passando fome por esta razão”, acrescentou o pesquisador. O que se sabe é que os pinguins são afetados pela redução da cobertura de gelo do mar na península Antártica, que esquenta rapidamente, ressaltou. A perda dessa camada de gelo está reduzindo a concentração de krill e de espécies de peixes que se alimentam do crustáceo. Ambos servem de alimento aos pinguins imperador e Adelie.
No oceano Ártico, os impactos da mudança climática são mais acentuados, em parte porque metade dessa massa marinha tem menos de 50 metros de profundidade. A perda de gelo permanente aumenta a exposição do oceano ao sol, causando o florescimento de algas. A região também se tornou receptiva a outras espécies, disse Bluhm. “Variedades de caranguejo antes eram encontrados apenas a 500 quilômetros ao sul do Pacífico norte começam a se aproximar” do oceano Ártico, acrescentou. (IPS/Envolverde)
(Envolverde/IPS)