Fórum Social Mundial: Grito de coração pela Amazônia

Belém, 27/01/2009 – Um cartaz formado por mais de mil pessoas, que fotografadas do ar enviará ao mundo a mensagem "SOS Amazônia", constitui a primeira ação dos indígenas horas antes de ter início, hoje, em Belém do Pará, a nova edição do Fórum Social Mundial. Este gesto reflete "nossa preocupação com o aquecimento da Terra, cujos impactos seremos os primeiros a sofrer, apesar de nós, os povos amazônicos, protegermos e cuidarmos das florestas", disse à IPS Francisco Avelino Batista, indígena apurinã, da bacia do rio Purus, na Amazônia.

"Erguemos nossa voz para despertar o mundo, especialmente os países ricos que estimulam a destruição", acrescentou Edmundo Omoré, um xavante do Mato Grosso, na fronteira entre a Amazônia e o Cerrado, a savana que ocupa a região central do País. Ambos fazem parte da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), que junto com a Coordenadora das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica (Coica), com sede em Quito, lideram a "Mensagem do coração da Amazônia".

Quase 1.300 indígenas de aproximadamente 50 países - a grande maioria, claro, do Brasil - pretendem se destacar no debate sobre seus direitos como povos originários e sobre a preservação do meio ambiente, ao participar desta nona edição do FSM, que vai até domingo nesta capital de 1,4 milhão de habitantes, porta nordeste da entrada para a Amazônia. A participação indígena tem precedentes no Fórum Social Mundial, mas desta vez buscou uma presença muito maior. No final chegarão cerca de dois mil, pois dificuldades financeiras para pagar o transporte impediram a presença de participantes de outros países e de locais distantes do Brasil.

Além da sede do FSM, as crises que o mundo enfrenta "criam um momento especial" para um protagonismo dos povos originários, que além dos indígenas compreendem os quilombolas (membros de comunidades afro-brasileiras) e outras comunidades autóctones, segundo Roberto Espinoza, assessor técnico da Coordenação Andina de Organizações Indígenas (Caoi). Trata-se de "uma crise de civilização", definiu Espinoza, indicando que os graves problemas econômico, energético e alimentar, bem como as ameaças climáticas são partes de um mesmo assunto.

Nessa situação, os indígenas devem ter uma participação política de fato, não "como folclore ou fator cultural", disse à IPS este especialista que é um dos coordenadores da presença indígena no FSM. Nesse sentido, tem grande importância a Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas, aprovada pela Organização das Nações Unidas, que não pode ser encarada como um documento "lírico" e cujas regras devem ser obrigatórias como as do Convenio 169 da Organização Internacional do Trabalho, afirmou Espinoza. Sua expectativa para este Fórum Social Mundial é que dele surja um acordo de mobilização, semelhante ao alcançado em 2003 contra a invasão do Iraque pelos Estados Unidos.

Desta vez se pretende que seja em "defesa da Mãe Terra e contra a mercantilização da vida", somadas a causas especificas de cada povo, como a luta contra represas hidrelétricas no Brasil, que inundam grandes extensões de florestas amazônicas e expulsam povos ribeirinhos. É natural que a voz dos povos originários repercuta mais em questões ambientais, diante da "possibilidade de catástrofes climáticas próximas" e das disputas por recursos naturais, que não afetam apenas os indígenas, mas a própria sobrevivência da humanidade, reconheceu Espinoza.

Os temas indígenas e ambientais serão mais visíveis ainda nas atividades de amanhã, já que será um dia dedicado à Amazônia, como fora de revitalizar o Fórum Social Pan-amazônico, inativo desde 2005. Lançar uma campanha dos povos amazônicos, "que querem uma sociedade que entenda seu valor e o que a terra significa pare eles", é uma proposta a ser discutida no FSM, segundo Miquelina Machado, da etnia tucano, dirigente da Coiab.

Isso é necessário para "maior equilíbrio com a natureza", justo quando os planos de crescimento econômico do Brasil e de integração física sul-americana impulsionam projetos de "fortes impactos na Amazônia e na região da cordilheira dos Andes", disse Miquelina à IPS. "As hidrelétricas inundam terras e destroem biodiversidade", citou como exemplo, lamentando que as tentativas de barrar a construção de estradas que causam grande desmatamento foram frustradas nos tribunais "que têm mais poder". A presença anunciada dos presidentes de países amazônicos, como Luiz Inácio Lula da Silva, o boliviano Evo Morales e o venezuelano Hugo Chávez, além do paraguaio Fernando Lugo, deverá ampliar a repercussão deste FSM, tomara que em favor dos povos amazônicos, concluiu Miquelina.

A voz indígena deve ser ouvida porque "somos nós que nascemos e crescemos no meio da floresta", com um modo de vida oposto ao da "ambição do capitalismo, que não beneficia a todos", afirmou, o xavante Omoré. Além disso, "por sermos os primeiros a sofrer os impactos" da mudança climática. Os ricos podem amenizar o calor com aparelhos de ar-condicionado e comprar alimentos nos supermercados, mas "nós dependemos da pesca nos rios e dos animais da floresta, e por isso nos preocupa o futuro que é de todos", disse, por sua vez, o apurinã Batista. (IPS/Envolverde)


(Envolverde/IPS)
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