Guanambi, Bahia - Cerca de 470 quilômetros separam dois mundos opostos da
lavoura algodoeira do Brasil. Ambos ficam na Bahia, estado que ocupa o segundo
lugar em produção para esse cultivo, perdendo apenas para o Mato
Grosso.
De um lado, o oeste baiano, berço do município líder do algodão,
São Desidério, mas que também conta com outras cidades importantes para a
cultura, como Luis Eduardo Magalhães, Formosa do Rio Preto e
Barreiras.
Mas uma boa parte dessa realidade ficará fora de quadro se a
diferença entre esses dois pólos for medida apenas em número de toneladas
produzidas. Afinal, não se pode comparar os resultados absolutos de uma produção
baseada em imensos latifúndios, fortíssima mecanização e alto consumo de
insumos, caso do oeste, com aquela baseada em pequenas propriedades, movida
apenas à força da agricultura familiar, como ocorre no Iuiú.
Outro fator
contribui para que o algodão do sudoeste baiano retome o status que já teve no
país. Há cinco safras a região participa de um programa de revitalização da
lavoura algodoeira, promovido pela Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola
(EBDA). E, no período produtivo de 2007/2008, contou com atuação pioneira da
empresa também nas etapas de beneficiamento e comercialização da
produção.
Nessa primeira experiência, 296 agricultores de 7 municípios da
região aderiram ao programa. A parceria entre a EBDA e os pequenos produtores
garantiu acesso direto às usinas de processamento e venda integral do algodão
cultivado por eles. O beneficiamento foi pago com 70% do caroço, enquanto os 30%
restantes - o caroço é comumente usado como ração animal - e toda a fibra
ficaram à disposição dos trabalhadores rurais. "Com esse programa, os
agricultores pularam três degraus na cadeia produtiva do algodão", afirma
Ernesto Marcos Lacerda, diretor da regional de Caetité da EBDA.
Quanto ao
beneficiamento, foram selados contratos diretos entre a usina, que antes estava
ociosa, e os produtores. Depois de processado, também por intermediação da EBDA,
todo o produto foi vendido para a indústria têxtil. Segundo Lacerda, mais de R$
800 mil foram gerados com essa comercialização, e todo esse montante foi parar
nas mãos dos trabalhadores.
Dessa forma, a expectativa da empresa é que,
na próxima safra, aumente o número de municípios e produtores
envolvidos.
Quanto à qualidade do algodão produzido pela agricultura
familiar do sudoeste baiano, o classificador Heraldo Carvalho atesta que ela não
deixa nada a desejar em relação àquele que vem da região oeste. "O algodão
produzido no sudoeste esse ano teve boa aceitação da indústria, que é muito
exigente", declara. Para ele, a diferença é que o produto do oeste já tem
reputação no mercado, enquanto o oriundo da região do entorno do vale do Iuiú
ficou marcado negativamente pelo declínio do início da década passada. "É uma
questão de tempo para que o algodão daqui [sudoeste] volte a ter nome no mercado
nacional", finaliza.
Em um sentido, a qualidade do produto do sudoeste
até supera o algodão da região de Barreiras. Como a colheita no vale e região é
feita manualmente, baseada no modelo familiar, sobram menos resíduos, em relação
à colheita mecanizada do oeste.
Na visão de Lacerda, essa competição
entre pólos produtores de algodão é saudável, e apenas ajuda a construir uma boa
imagem para o algodão baiano, no mercado nacional, e brasileiro, pelo mundo
afora.
A retomada da lavoura algodoeira do sudoeste baiano ainda está
começando, mas o exemplo da EBDA mostra que com maior assistência ao produtor as
barreiras aos poucos vão caindo. Uma das mais fortes é a crença de que algodão é
uma cultura muito difícil, que exige altos investimentos. E isso a parceria
entre EBDA e os produtores já contradisse. "No oeste, a produtividade é muito
alta, mas os custos também. Com a agricultura familiar, a produção é muito
menor, mas os custos infinitamente inferiores", explica Lacerda. Por isso, por
hectare, um pequeno produtor pode lucrar mais do que um grande.
"Para o
pequeno agricultor, cultivar algodão por conta própria, dependendo de
financiamento, ainda é inviável", declara Valcirez Rodrigues, do Sindicato dos
Trabalhadores Rurais de Guanambi. "Mas tendo essa oportunidade da parceria com a
EBDA, é possível produzir". Para ele, o fato de a empresa distribuir sementes e
inseticidas, fornecer assistência técnica e ceder tratores para preparar o solo
é o diferencial para que os produtores tenham embarcado no programa. "Assim é
viável", diz ele.